A dança ambulante de Qudus Onikeku | The itinerant dance of Qudus Onikeku

Praças circulares, gramados em desnível, ruelas estreitas e becos sem saída. Lançados ao acaso e à tensão vivificadora das ruas, dois dançarinos e um grupo de artistas performáticos dão início aos primeiros movimentos de uma cena coreográfica solta, improvisada, atraente e livre de academicismos. Em poucos minutos, pedestres, garis, carroceiros, mendigos e trabalhadores – potenciais espectadores – cessam o seu próprio movimento e aglomeram-se curiosos em torno do mais novo espaço criado para a dança. A cena urbana faz parte do documentário Precisamos de  Cola-Cola para dançar?Do We Need Cola-Cola to Dance?), realizado em julho de 2007 em países africanos pelo YK Projects, um coletivo de artistas da nova geração nigeriana, residindo ou estudando na França. (

À frente dele está o nigeriano Qudus Onikeku, ganhador do prêmio de Bailarino do Ano pela Future Awards 2009 (Nigéria), que aos 17 anos partiu para a França, onde se graduou na Escola Superior Nacional de Artes Circenses, tendo se formado como bailarino e acrobata com bolsa integral do governo francês. Simultaneamente à sua graduação, ele foi artista residente da Gongbeat Artes, em Lagos, onde nasceu. Seis anos mais tarde, no processo de retorno à sua própria cultura africana, deparou-se com dificuldades e questões envolvendo o papel da arte e da dança no contexto atual. O que é um artista? Quem é e onde está o seu público? Qual é a nossa postura diante da discussão global? Por que estudamos no exterior se o nosso público está na África? Como utilizar o conhecimento acumulado na volta à nossa terra natal? Quando vamos deixar de depender do ocidente para garantir a sobrevivência dos nossos talentos?

Dono de uma linguagem corporal formada por elementos da capoeira, do circo e da dança de rua de Lagos, Qudus levou a dança contemporânea livre de estereótipos para espaços não-convencionais, locais onde a crescente rede de arte dificilmente chega, contribuindo para a formação de iniciativas locais. Acompanhados de um videoartista, de um fotógrafo e de um técnico de som, o coletivo, que contou com o apoio da Fundação Príncipe Claus, da Holanda, realizou intervenções em espaços públicos da Nigéria, Egito, África do Sul, Moçambique, Kenya e Camarões. As performances foram feitas de forma improvisada e não oficial, com pouca ou sem nenhuma divulgação, numa espécie de retomada aos antigos teatros ambulantes.

Qudus Onikeku / Foto: Deborah Rocha e Rodrigo Moraes

Qudus Onikeku / Foto: Deborah Rocha e Rodrigo Moraes

O documentário, que já foi projetado em Lagos, Massachusetts, Kinshasa, Chicago e participou do festival online 24hours24Artist, no Texas,  foi exibido pela primeira vez no Brasil no Espaço Matilha, em São Paulo, no dia 8 de junho. Após a exibição, Qudus participou de um bate-papo com o público, que incluiu integrantes do CNAC (Centre Nacional des Arts du Cirque), representantes da cultura hip hop e músicos como Simone Sou, com quem Qudus fez uma intervenção no centro da cidade no dia 13 de junho. A parceria com a “percuterista”, que já trabalhou com Itamar Assumpção, Chico César, Zeca Balero, Zélia Duncan e mais recentemente com Os Mutantes, resultou em duas performances. Uma em frente à Galeria do Rock, próximo ao Largo Paissandu, e outra no Viaduto do Chá, entre as 12h e 16h de sábado, horário de intenso movimento na região. Os dois artistas se conheceram durante o lançamento no documentário em São Paulo e fizeram um breve reconhecimento mútuo em um segundo encontro antes da apresentação. O público parou para ver a performance e alguns chegaram a interagir com Qudus no centro da roda que se formou.

Após a experiência paulistana, o nigeriano segue para Belo Horizonte, Bogotá, Buenos Aires. Em julho estará em Nova York, onde fará performances com artistas locais e exibirá o documentário. Seu projeto é de continuar viajando com esse tipo de trabalho e explorar o engajamento dos artistas africanos na discussão e desenvolvimento do mercado de arte na África, de uma forma não submissa aos moldes europeus ou norte-americanos, mas engajado com o entendimento dos próprios valores. Seu trabalho deu origem ao Ewa Bamijo, encontro bianual de dança e artes performáticas que acontece esse ano em Lagos, na Nigéria, de 27 a 31 de outubro.

“Este projeto é primeiramente uma solução imaginada para uma questão altamente pessoal, que incomodava minha alma enquanto um jovem criador africano e quebra as barreiras entre o artista e seu público e vice-versa”, diz Qudus. “Acredito que existe uma conexão poderosa entre artistas e ativistas de direitos humanos. Os dois se levantam contra o status quo para dizer o que deve ser dito em nome da humanidade”, afirma. Vale a pena acompanhar o trajeto deste jovem artista e a continuidade de suas ações no crescente espaço dedicado à performance urbana em países como África e Brasil.

Abaixo, assista a um vídeo produzido exclusivamente para o idança. Ele traz uma entrevista com Qudus e trechos das performances feitas por ele e Simone Sou nos espaços públicos de São Paulo.

[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=eleXoQOx5BY[/youtube]

* A reportagem acompanhou os artistas à convite da produção do Espaço Matilha. Créditos do vídeo: câmera e edição de Deborah Rocha e Rodrigo Moraes.

Round squares, uneven grass yards, narrow streets and dead-end alleys. Launched randomly at the vivifying tension of streets, two dancers and a group of performing artists give start to the first movements of a loose choreographic scene, improvised, attractive and free of academicism. In a few minutes, pedestrians, garbage men, wagoners, beggars and workers – potential spectators – stop their own movements and, out of curiosity, gather around the newest space created for dance. The urban scene is part of the documentary Do We Need Cola-Cola to Dance, produced in July 2007, in African countries, by the YK Projects, a collective of artists of the new Nigerian generation, living or working in France.

Ahead of the collective is Qudus Onikeku, winner of the Future Awards 2009 (Nigeria) Dancer of the Year award. At age 17, he left for France, where he graduated at the Ecole Nationale des Arts du Cirque as dancer and acrobat, with a full scholarship from the French government. Parallel to his graduation, he was a resident artist at Gongbeat Artes, in Lagos, where he was born. Six years later, during the process of returning to his own African culture, he was faced with difficulties and issues revolving around the role of art and dance in the current context. What is an artist? Who and where is his audience? What is our stand on the global debate? Why do we study abroad if our audience is in Africa? How do we use the knowledge we acquire in the return to our homeland? When will we stop depending on the West to assure the survival of our talents?

With a body language composed by elements of capoeira, circus and Lagos street dance, Qudus took a contemporary dance free of stereotypes to unconventional spaces, places the growing art network hardly reaches, which contributes to the development of local initiatives. The collective, which has the support of Prince Claus Fund, in the Netherlands, carried out interventions in public spaces in Nigeria, Egypt, South Africa, Mozambique, Kenya and Cameroon, along with a video artist, a photographer and a sound technician. The performances were improvised and non-official, with little or no advertisement, in a kind of revival of old itinerant theaters.

Qudus Onikeku / Foto: Deborah Rocha e Rodrigo Moraes

Qudus Onikeku / Foto: Deborah Rocha e Rodrigo Moraes

The documentary has been screened in Lagos, Massachusetts, Kinshasa, Chigago and participated in the 24hours24Artist online festival, in Texas. It was screened for the first time in Brazil at Espaço Matilha, in São Paulo, on June 8. After the screening, Qudus took part in a debate with the audience, which included members of CNAC (Centre Nacional des Arts du Cirque), of the hip hop community and musicians like Simone Sou, with whom Qudus performed an intervention in the center of São Paulo, on June 13. The partnership with the percussionist, who has already worked with Brazilian musicians Itamar Assumpção, Chico César, Zeca Balero, Zélia Duncan and most recently, Os Mutantes, resulted in two performances. One was in front of Galeria do Rock, near Largo Paissandu, and the other one was at Viaduto do Chá, between 12 and 16 o´clock, a time of intense pedestrian movement in the area. Both artists met for the first time during the launching of the documentary in São Paulo and got briefly acquainted in a second encounter before the performance. The public stopped to watch the performance and some people even interacted with Qudus.

After the experience in São Paulo, the Nigerian artist will follow to Belo Horizonte, Bogotá, Buenos Aires. In July, he will be in New York City, where he will screen the documentary and perform with local artists. His project is to keep travelling with this kind of work and explore the involvement of African artists in the debate and development of the art market in African, in a way that is not submissive to European or North-American patterns, but rather committed to the understanding of their own values. Qudus work originated Ewa Bamijo, a dance and performing arts meeting that takes place every two years and is happening this year in Lagos, Nigeria, from October 27 to 31.

“This project is, first of all, an imagined solution for a highly personal issue, that disturbed my soul as a Young African creator and breaks the barriers between the artist and his audience and vice versa”, says Qudus. “I believe there is a powerful connection between artists and human rights activists. Both can rise against status quo to say what must be said in the name of humanity”, he asserts. It´s worth following the work of this young artist and the continuity of his actions in the increasing space dedicated to urban performance in places like Africa and Brazil.

Watch below a video produced exclusevely for idança. It brings an interview with Qudus and some images of his performance with Simone Sou in public spaces in São Paulo.

[youtube]http://www.youtube.com/watch?v=eleXoQOx5BY[/youtube]

The reporter was invited by the organization of Espaço Matilha to follow the artists.