Metáforas do corpomídia em cena | Metaphors of body-media on stage

Uma das grandes revoluções do teatro do século XX foi desencadeada pelo viés pedagógico do diretor e encenador russo Constantin Sergueevich Stanislavski (1863-1938). Trata-se do reconhecimento de que o ofício do ator não visa somente o entretenimento, mas é uma forma de conhecimento. Em meio ao processo, eminentemente empírico do trabalho de ator, Stanislavski estabeleceu marcos teóricos que o faz ser reconhecido como o fundador da moderna pedagogia teatral ocidental (SERRANO, 2004). O sistema global, concebido por Stanislavski durante toda a sua trajetória artística, permanece como referência inconteste para os estudos teatrais e, especialmente, para a formação do ator, no Brasil e no mundo. Sua metodologia, constantemente auto-avaliada, continua como um sistema aberto e vivo, capaz de gerar questões fundamentais para a investigação do trabalho do ator, na atualidade. 

Stanislavski teria formulado os principais problemas ontológicos e metodológicos da atividade do ator, tendo o diretor polonês Jerzy Grotowski (1933-1999) buscado, a seu modo, suas próprias respostas para tais problemas. Ninguém mais, desde Stanislavski, como lembra o diretor inglês Peter Brook (GROTOWSKI, 1992, p. 9), investigou o fenômeno da representação teatral no Ocidente, a natureza e a ciência de seus processos “mental-fisico-emocionais” tão profunda e amplamente quanto Grotowski. Stanislavski apontou para a necessidade do “trabalho do ator sobre si mesmo”, o que Grotowski reiterou como uma experiência que só poderia advir de um conhecimento prático (DE MARINIS, 2004). Stanislavski e Grotowski propuseram novos entendimentos acerca de como o ator conhece e elabora seus processos cognitivos, com questões referentes às relações entre corpo e alma, ou corpo e mente, enunciadas por eles como aspectos físicos e psíquicos.

A busca de integração das dimensões “interior e exterior” ou “física e espiritual” do ator foi constante na trajetória artística de Stanislavski e configurou procedimentos de ignição dos aspectos mentais e corporais, numa unidade psicofísica que justificaram a sua ação. A noção de ação física teve um papel central na nova configuração pedagógica, ressaltada como chave para que a criação e a emoção surgissem, já que não poderiam ser despertadas inteiramente pela vontade ou consciência do ator. Ao invés de evocar um estado mental ou emocional inicial, Stanislavski entendeu que o ator deveria acionar a materialidade do seu corpo. É quando concebe o método das ações físicas. Neste sentido, a estratégia de conhecimento foi alterada, pois é a partir das ações do corpo que o ator articularia os demais elementos da representação e se aproximaria da “natureza criadora”.

A presente tese traz uma colaboração no sentido de relacionar o sistema das ações físicas do ator, concebido por Stanislavski, com os estudos do corpo na contemporaneidade e, conseqüentemente, de seus novos entendimentos na construção do conhecimento. Proponho uma investigação do conceito de ação física no trabalho do ator, à luz de teorias das ciências cognitivas e da teoria do corpomídia, formulada por Katz e Greiner (2005), levantando algumas hipóteses para uma revisão das metáforas que delineiam o conceito de ação na contemporaneidade. Parto da hipótese de que, através do método das ações físicas, Stanislavski propôs uma determinada relação entre cognição e ação, a que denomino como uma cognição na ação, e que conformaria uma teoria do corpo.

As questões referentes à pesquisa das ações do ator, por ele formuladas, permitem estabelecer diálogos com teorias contemporâneas do conhecimento. Stanislavski estabeleceu, no início do século XX, procedimentos que apontavam para novos entendimentos acerca dos processos de conhecimento e aprendizagem nas relações entre corpo e mente, e que foram desenvolvidos por Grotowski na segunda metade do mesmo século. Este direcionamento implicava num conhecimento operativo e numa experiência de transformação, eminentemente prática, das conexões entre os estados físicos e os não físicos, enunciados pelos encenadores como estados espirituais. Na escuta da materialidade do corpo, outras conexões se estabeleceram. Uma das questões ontológicas mais insistentes e debatidas na filosofia,– a natureza dos processos mentais e suas relações com mundo físico – é nomeada como o “problema corpo-mente” (CHURCHLAND, 2004).

Para ressaltar que o corpo, ao qual me refiro, não está separado da mente, os termos corpo e mente serão acoplados, gerando a terminologia corpomente, numa licença lingüística que se justifica, na ausência de uma terminologia que abranja o entendimento encarnado da mente e a perspectiva de um corpo que pensa. 

Ao diferenciar a ação física do gesto e do movimento, Stanislavski e Grotowski circunscreveram um campo de inferências próprio a cada um. Mais do que discutir as diferenças entre estes termos, que não é o alvo específico deste trabalho, importa entender como pensamentos, idéias e conceituações se materializam no corpo e na mente, a tal ponto de formatarem tais categorizações e produzirem conhecimento. Neste estudo, o método das ações físicas será abordado por meio das metáforas que o norteiam, com enfoque na revisão do dualismo corpo-mente no desempenho do ator.
A visão da metáfora enquanto processo cognitivo e acional desenvolvida por Lakoff e Jonhson (1999, 2002) é a estratégia escolhida para a análise destas práticas e discursos sobre o corpo-mente. As metáforas não só propõem visões alegóricas de mundo e revelam padrões de pensamento, mas dizem respeito à própria atividade cognitiva, proporcionando ignição aos atos do corpo. O trânsito de metáforas como o interior e o exterior, o dentro e o fora, o centro e a periferia e as partes e o todo fundamentam o conceito de ação física e os níveis de expressividade e comunicabilidade do corpo. É por meio destas metáforas que Stanislavski e Grotowski explicitaram o seu entendimento acerca das relações entre o corpo e a alma (ou mente) e o ambiente.

Não obstante, há problemas ontológicos relacionados às categorizações metafóricas utilizadas para descrever a noção de corpo, mente e ação. Os complexos processos que envolvem a ação humana têm estado à mercê, por muito tempo, de metáforas provenientes de uma visão mecanicista e dualista do corpo e da mente e de uma leitura de causa e efeito entre corpo e ambiente. O entendimento do corpo como um instrumento da alma ou da mente configura o paradigma mecanicista, relacionado à idéia do corpo como máquina e, posteriormente, o vitalista, com suas analogias acerca do organismo e da organicidade e energia vital do corpo. O termo oitocentista vitalismo designou as teorias que consideram os fenômenos vitais como irredutíveis aos fenômenos físico-químicos, ou seja, não podem ser explicados por causas mecânicas (ABBAGNANO, 2000, p.1005).  O vitalismo foi defendido por filósofos e cientistas entre meados do século XVIII e meados do século XIX, mas podem ser chamados de vitalistas os conceitos clássicos que entendem o organismo como regido por forças vitais, identificando a essência da vida com a alma.

As metáforas subjacentes à noção de corpo, de mente e de ação derivam de contextos históricos, culturais e sociais e a relação entre o saber artístico e outros saberes. O enfoque deste estudo tratará especificamente da ressonância destas metáforas mecanicistas e vitalistas na construção da ação física do ator idealizado por Stanislavski e, posteriormente, por Grotowski. Entre o corpo observado e manipulado enquanto instrumento e o corpo vivido enquanto organismo há modos distintos de se perceber as relações entre o corpo, a mente, o cérebro e o ambiente.

Se as soluções cênicas que o ator encontra dependem dos circuitos que desencadeiam os processos de conhecimento e aprendizagem, quais seriam, então, as metáforas mais apropriadas para descrever a ação do corpo em vida e o trabalho do ator sobre suas ações na contemporaneidade? Ao invés das metáforas do corpo-máquina e corpo-organismo, moldadas a partir do entendimento mecanicista e vitalista, o corpo do ator passa a ser abordado como um sistema dinâmico e auto-organizativo. A metáfora que se torna mais apropriada, neste caso, é a dinamicista. Neste sentido, o problema da ação é aqui abordado a partir de uma perspectiva sistêmica e processual, por meio de novos entendimentos das relações entre o corpo e a mente provenientes de teorias cognitivas.

Stanislavski e Grotowski sistematizaram um pensamento sobre o corpo, não se resumindo, inclusive, ao corpo do ator, sob um contexto metafórico vitalista. A crítica à atuação mecânica e ao artifício conduziu suas pesquisas em direção a organicidade da ação cênica. As reflexões de Stanislavski relativas à natureza dos processos físicos e psíquicos, contudo, já apontavam para uma perspectiva dinâmica e auto-organizativa, com conexões significativas com as mais recentes abordagens cognitivas. Na pedagogia das ações físicas o conhecimento se dá no corpo em ação, e a ação, neste sentido, não seria a resultante de intenções psicológicas ou intelectuais motivadoras somente, e sob o controle do agente, tampouco se organiza de forma linear e causal em sua interação com o meio.

A atuação do ator já pressupunha, para Stanislavski, um ponto de vista da experiência humana, do corpo do ator em ação no mundo. Como demonstra o método das ações físicas, o entendimento destes processos, por parte do mestre russo, estava conectado ao contexto epistemológico de sua época. Um olhar mais acurado para as teorias teatrais, que tratam do trabalho do ator, demonstra que a insistência em determinado entendimento do corpo e da ação cênica tem ocorrido, em algum nível, em consonância com as idéias sobre a relação corpo e mente, na filosofia e na ciência. Estas consonâncias se constituem enquanto respostas para questões ontológicas semelhantes e compartilhadas evolutivamente por estes campos de conhecimento – arte, filosofia e ciência. Nem sempre estas conexões estão claramente enunciadas pelos teóricos, encenadores ou atores, mas a sua ocorrência é perceptível através das metáforas presentes nos discursos teóricos e nas práticas cênicas.

No tipo de atividade do ator, os processos cognitivos e os processos artísticos se entrecruzam de sobremaneira que não há como separá-los. Ao recriar a conduta humana para colocá-la em situação cênica, o ator utiliza, necessariamente, seu próprio organismo, estando a mercê da natureza de ser e dos estados deste. A escassa revisão e atualização dos processos cognitivos que envolvem a encenação do ator, tais como as relações entre corpo, mente, emoção, razão, consciência, vontade, intencionalidade e controle, vem contribuindo para o entendimento pouco preciso a respeito destes procedimentos, provocando uma espécie de lacuna epistemológica.

É possível uma conexão das questões próprias ao desempenho do ator com aquelas discutidas no âmbito das ciências e da filosofia, como já aparece, por exemplo, nas teorias sobre a expressividade do corpo e suas relações com a alma atreladas à evolução da fisiologia, no século XVII, à biologia, no século XVIII e XIX e, mais tarde, à psicologia, no século XX. Na medida em que tinham no estudo das paixões e, posteriormente, das emoções e sentimentos, um foco de interesse comum, eram estes campos teóricos que respondiam às questões sobre o corpo e o gesto do ator, e a efetividade das teorias teatrais estava garantida pela sua coerência com o entendimento de como o corpo e a alma se conectavam.

Portanto, no primeiro capítulo, apresento o conceito de ação física desenvolvido por Stanislavski e Grotowski e as hipóteses estabelecidas por eles para o problema corpo-mente do ator em suas conexões com o pensamento filosófico e as teorias científicas. Do amplo espectro das teorias do conhecimento, serão ressaltadas aquelas que se estruturam por meio das metáforas do corpo-máquina e do corpo-organismo sobre os quais as teorias do ator de Stanislavski e Grotowski se edificaram.

A visão mecanicista e a visão vitalista, em conformidade, primeiramente, com as teorias sobre a fisiologia das paixões, adquirem uma leitura proveniente dos estudos sobre a emoção e o sentimento a partir do século XVIII. A noção cartesiana de um automatismo mecânico é transformada, paulatinamente, com a noção de sensibilidade e reflexibilidade, evidenciando-se, cada vez mais, o processo orgânico e as teorias psicofísicas. Iluminadas pelo materialismo vitalista, estas conexões se encontram de forma precursora no pensamento do filósofo e teórico teatral francês Denis Diderot (1713-1784), cujas idéias sintetizaram o mecanicismo e vitalismo na descrição do corpo do ator, e na teoria dos condicionamentos reflexos do fisiologista e dramaturgo inglês George Henry Lewes (1817-1878). A análise destas conexões segue a abordagem do teórico teatral Joseph Roach (1985).

A psicofisiologia de Stanislavski dialoga com os problemas enunciados por Diderot e sistematizados por Lewes: os aspectos objetivos e subjetivos da ação do ator. Nestes aspectos, estão descritas as relações entre corpo e espírito (alma, mente) e corpo e ambiente. Ainda fortemente presentes nas teorias do ator, na atualidade, estas correntes teóricas, em sua busca pela atualização das metáforas da ação do corpo em conformidade com os pressupostos científicos e filosóficos de sua época, anteciparam avant la lettre abordagens hoje melhor elucidadas pelas ciências cognitivas.
No segundo capítulo, discuto os princípios do conceito de ação física por meio das metáforas que dão ignição à construção do corpomente do ator. Tais metáforas são chamadas por Lakoff e Johnson (1999, 2002) como ontológicas e orientacionais, e determinam entendimentos concernentes aos aspectos psicofísicos envolvidos na conduta do ator apontados por Stanislavski e Grotowski, como o trânsito entre o dentro e o fora, o interior e exterior, as partes e o todo e o centro e periferia. Neste estudo interessa investigar como o conceito de ação física e suas metáforas ontológicas e orientacionais sobrevivem confrontados com as atuais hipóteses acerca do problema corpo-mente.

A relação corpo (entendido como não separado da mente) e conhecimento, e a perspectiva do corpo que pensa sua ação em ação será discutida no terceiro capítulo. É neste contexto que a metáfora dinamicista se torna a mais indicada para dialogar com os modos de organização da práxis vislumbrada por Stanislavski e posta em evolução por Grotowski. O tipo de práxis a que o ator está sujeito especifica uma estratégia de conhecimento onde o pensamento se dá no processo acional, ou seja, como salientou Grotowski (1992), num pensar em ação ou num pensar em movimento. O processo vivido pelo ator ultrapassa o nível literário ou imagético, na descrição de personagens e do contexto envolvido – havendo ou não texto teatral referente – e envolve a complexidade da ação humana e a imprevisibilidade das relações espaços-temporais momentâneas (SERRANO, 1996). A idéia de um pensar em movimento difere do entendimento cartesiano, onde a mente pensa e o corpo executa. Pensar e mover não são acontecimentos separados, mas aspectos de um mesmo processo cognitivo dinâmico, possibilitando ao ator situações cênicas constantemente reconstruídas.  Similar ao que ocorre no método das ações físicas, nos estudos das ciências cognitivas na atualidade o corpo aparece como desencadeador dos processos cognitivos, o que não significa apenas uma troca de supremacias, pois o corpo enunciado nestas teorias não se separa da mente quando age no mundo.

Para a discussão das questões que envolvem a práxis especifica do ator, bem como do aspecto voluntário e teleológico da ação, recorro à noção aristotélica de razão prática. O termo grego se apresenta no pensamento acional de Aristóteles (384 a.C-322 a.C) e subtende um saber de ordem prática e processual, que é inerente ao fazer artístico. Tanto no teatro como na filosofia, o discurso sobre a ação tende a uma origem voluntária e consciente e a objetivos teleológicos. O conceito de ação física se edificou a partir de um entendimento que o movimento do corpo deve se justificar, intencional e conscientemente, em relação a um dado contexto, mas as próprias reflexões de Stanislavski provenientes de suas investigações junto a atores já demonstravam que a prerrogativa de que o ato voluntário ou intencional é, necessariamente, dotado de consciência não se sustentava.

A revisão do conceito de ação envolve igualmente a forma com que intenção e consciência vêm sendo discutidas na conformação da ação cênica, e serão abordadas ainda no terceiro capítulo. As reflexões de Stanislavski à cerca do trabalho do ator sobre suas ações envolve questionamentos em torno da vontade, das emoções e da possibilidade ou não de controle do ator sobre os processos cognitivos que propiciam a ação, discutidas em torno da relação consciente e inconsciente. Já Grotowski, reacende a questão da intencionalidade.

As hipóteses do lingüista cognitivo George Lakoff e do filósofo Mark Johnson (1999, 2002), do filósofo Daniel Wegner (2002), do lingüista John Searle (2002) e do neurofisiologista Alain Berthoz (2003), apontam para as investigações sobre ações intencionais e suas conexões com a consciência e dialogam com as questões formuladas neste estudo a cerca da natureza processual e dinâmica das ações, antevistas por Stanislavski e Grotowski. Da mesma forma, as pesquisas do neurologista António Damásio (1996, 2000, 2004) a cerca da consciência, do self, da emoção e do sentimento apresentam pistas para a melhor compreensão destes processos envolvidos na ação.

O enfoque sobre as paixões e, posteriormente, sobre as emoções e sentimentos, será desenvolvido no quarto capítulo. A constatação da instabilidade dos estados emocionais foi uma das questões mais apontadas por Stanislavski como justificativa para a sua revisão metodológica. As ações físicas seriam a chave para a articulação destes estados, e envolveriam aspectos referentes à fisiologia, biologia e memória das emoções.

O conceito de ação não é objeto de reflexão somente das teorias teatrais, mas campo de investigação nascido da filosofia da ação e matéria de interesse das ciências que tratam de entender como o homem conhece e as operações envolvidas nos processos cognitivos. A obra Dynamics in Action, Intentional Behavior as a Complex System (2002), de Alicia Juarrero, traz uma importante contribuição para o entendimento da ação. Com o objetivo de compreender como o ser humano percebe, pensa, fala, age e compreende, as ciências cognitivas vem se afirmando uma nova ciência dos processos psicobiológicos, envolvendo os comportamentos humanos e suas formas simbólicas, tais como a linguagem e a cultura. Ciências essas que podem ser compreendidas como uma nova ciência do “espírito”, pois une a experimentação científica às interrogações da filosofia, a partir da tentativa de compreensão das relações entre cérebro, corpo e mente. As abordagens dos “filósofos-cientistas” cognitivos aqui apresentados, ao abrigarem diversos campos de conhecimento, fortalecem uma articulação teórico-prática, fundamental para a abordagem do problema da ação do ator, na atualidade. As disciplinas mais diretamente ligadas às ciências cognitivas são as neurociências, a inteligência artificial, a psicologia cognitiva, a lingüística cognitiva e a filosofia. A interação destes campos de saberes vem provocando uma ruptura onto-epistemológica, incidindo numa profunda mudança na compreensão que o ser humano tem de si mesmo, de sua natureza e comportamento.

O quadro epistemológico que Stanislavski e Grotowski nos delegaram, permite perceber o estado natural de “indisciplina” que os estudos sobre o corpo-mente requisitam. As conexões das questões próprias ao trabalho do ator àquelas discutidas no âmbito das ciências cognitivas são inerentes ao campo epistemológico gerado pelas investigações de Stanislavski e Grotowski acerca da ação, considerando que processos artísticos são, inextricavelmente, processos cognitivos. A noção de disciplina não seria, como salientam Greiner e Katz (2005), capaz de abarcar um campo de conhecimento tão complexo, e para tratar do corpomente, não basta juntar conhecimentos disciplinares, o que comumente chamamos de trans ou interdisciplinaridade. A condição do organismo vivo pede pela substituição da noção de disciplina pela de indisciplina, na tentativa de nos aproximarmos do caráter dinâmico e processual da ação. Ao ressaltar as ações orgânicas enquanto processos de comunicação, a teoria do corpomídia atua no sentido de estabelecer diálogos entre áreas da comunicação e da cultura e suas alianças indissociáveis com a natureza. Mais do que uma “grade” teórica a referenciar a temática proposta neste estudo, a teoria do corpomídia contribui para uma abordagem não dualista do problema corpo e mente, livrando-o de velhas armadilhas.

Katz e Greiner (2005) destacam as ressonâncias entre a teoria do corpomídia e a proposta de Muniz Sodré em Antropológica do espelho (2002) no que se refere à noção de indisciplina. Quando as redes transdisciplinares são requisitadas como estratégias de pesquisa, acabam virando indisciplinares, ou seja, um campo de desestabilização e subversão dos objetos de pesquisa que se assemelham a “atratores ou buracos negros”, mas que, neste caso, são capazes de nos aproximar do dinamismo necessário aos estudos do corpomente.

This thesis analyzes metaphors that guide the concept of physical action in the work of an actor through the perspective of the cognitive sciences and the theory of body-media elaborated by professors Helena Katz and Christine Greiner in the graduate program of  Communications and Semiotics at the Catholic University of São Paulo.

The notion of action is essential to studies about the communication of the actor and is present in the genesis of theories of representation and in the modern concept of action.

The pedagogy proposed by Constantin Stanislavski (1863-1938) by means of a method of physical actions, and later developed by Jerzy Grotowski (1933-1999), altered the processes of research and education for the actor. This study is based on the hypothesis that the approach to physical actions, proposed by both authors, revises the body-mind  dualism in the work of the actor and points to issues now present in the cognitive sciences. By relating the system of physical actions of the actor with he studies of the body in the contemporary world, this study considers action as a procedural and dynamic system, from the perspective of a body-mind theory.

The studies of philosophers and scientists  António Damásio, Daniel Wegner, George Lakoff, Mark Johnson and Alain Berthoz are the foundations for the hypotheses presented about the metaphors that spark the action of the body and strengthen the theoretical-practical articulation needed to approach the problem of scenic action.

Key words: Communication. Theater. Representation. Physical action. Cognitive sciences.