Como entender o orçamento nacional para a cultura

No início deste ano me propus a fazer um artigo sobre o orçamento nacional destinado à cultura. Meu objetivo era fazer um panorama da previsão orçamentária deste ano, em comparação com os anos anteriores, e ainda buscar informações de projetos que estão tramitando no Congresso referentes a este tema. Tive dificuldades não apenas para reunir essas informações, mas principalmente para entender as peculiaridades da previsão e execução orçamentária.

Para ter uma melhor compreensão dos valores destinados à cultura no país, entrevistei o deputado Paulo Rubem Santiago (PT-PE), membro atuante da Comissão de Educação e Cultura da Câmara, que é especializado nas questões orçamentárias. Paulo Rubem foi o relator setorial do orçamento de cultura para 2007. Com sua ajuda resolvi escrever um texto que explicasse melhor como funcionam os investimentos de cultura feitos pela União, além de divulgar seus números.

Orçamento 2007

No âmbito orçamentário, a notícia é que o MinC tenha recursos da ordem de R$ 670 milhões para 2007. Esse orçamento equivale ao valor destinado para custeio e despesa de programas executados MinC e pelos órgãos ligados a ele, sem levar em consideração o montante ainda a ser investido pelas empresas a partir da Lei de Incentivo à Cultura. “Hoje nós temos dois orçamentos da cultura: o orçamento direto, oriundo do orçamento fiscal administrado pelo Ministério da Cultura, e o orçamento do patrocínio, que vem do Sistema Federal de Incentivo à Cultura”, explica o deputado Paulo Rubem Santiago.

É importante esclarecer, entretanto, que nem todo orçamento previsto é revertido em investimento, pois uma parte é destinada para manter o funcionamento dos órgãos governamentais. “O orçamento do Ministério da Cultura não é totalmente aplicado para fomento, incentivo ou financiamento. Tem uma grande parcela que é para pagamento de pessoal, para custeio do ministério e das administrações coligadas e ao mesmo tempo algo que deva ser aplicado na carreira técnico-profissional dos funcionários do Ministério da Cultura”, explica Paulo Rubem. Dentre os R$ 670 milhões previstos para este ano, cerca de 15% serão utilizados para este tipo de despesa.

O valor vindo do Sistema de Incentivo a Cultura é que representa o investimento massivo para o fomento cultural. A assessoria do MinC informou que a previsão de investimento dos recursos provenientes da renúncia fiscal do Sistema de Incentivo à Cultura só é definido a partir de outubro, quando as empresas têm uma estimativa de suas receitas e decidem o valor a ser investido no setor cultural. Em geral, os recursos vindos das renúncias fiscais do Sistema de Incentivo dobram o orçamento geral para cultura.

Progressão Orçamentária

Os dados fornecidos pelo MinC apontam que em 2006 o orçamento liberado pela pasta foi de R$ 661 milhões e os recursos provenientes das Leis de Incentivo (incluindo audiovisual) foram de R$ 804 milhões. Em 2005 foram liberados R$ 559 milhões pelo MinC e R$ 864 milhões via Incentivos. Em 2004 foram R$ 417 milhões e R$ 688 milhões respectivamente. E em 2003 os valores foram R$ 324 milhões pelo Minc e R$ 646 milhões via Incentivos.

Os dados apontam para um crescimento gradual do orçamento de cultura no último governo, mas ainda não é o ideal. A Organização das Nações Unidas recomenda que o mínimo de 1% do total do orçamento de um país seja destinado à cultura.

Em 2007 o valor inicial previsto no Orçamento da União para a Cultura era de R$ 405 milhões, que representava 0,6% do total. Uma articulação entre o MinC, o relator setorial e os deputados conseguiu aumentar esse valor para R$ 915 milhões, número final aprovado pelo Congresso para o orçamento da cultura.

Esse aumento de recursos foi possível a partir de uma estratégia em que os parlamentares apresentam emendas individuais (projetos) para a área de cultura, além do valor já previsto pelo Projeto de Lei Orçamentário enviado pelo Poder Executivo. A estratégia foi usada pelo Ministério do Turismo no primeiro mandato de Lula e conseguiu aumentar o orçamento do Turismo de R$ 140 milhões em 2003 para R$ 1 bilhão em 2006.

Contingenciamento

Apesar do esforço, que resultou na aprovação de R$ 950 milhões para o MinC, o orçamento previsto para 2007 ficou em R$ 670 milhões. Isso porque houve um contingenciamento de 20% de todos os recursos do orçamento de 2007. O corte, que foi anunciado em março deste ano, é uma medida preventiva do governo feita anualmente. Mas ao longo do ano os recursos retidos pelo contingenciamento podem ser liberados caso não precisem ser utilizados em medidas emergenciais.

“O trabalho que pode ser feito pelos artistas e produtores, junto às comissões e juntos aos deputados, é para que o Congresso pressione o governo a liberar progressivamente o que foi retido de recursos com o decreto do contingenciamento. Já se provou que é eficaz a programação orçamentária do Ministério da Cultura. Em 2005 o Ministério teve 99% de execução orçamentária, significando o ministério de maior execução orçamentária, nos recursos que foram liberados”, explicou Paulo Rubem. Em 2005 o MinC teve um corte muito grande, sobrando apenas 24 % de toda previsão do orçamento aprovado, mas durante o ano houve uma ampliação.

Projetos

Paulo Rubem ressalta ainda a importância de mobilização em torno do Projeto de Emenda à Constituição nº 150/03 que prevê a vinculação de 2 % do orçamento da União; 1,5% dos estados e 1 % dos municípios para a área de cultura. Um requerimento da comissão e Educação e Cultura foi enviado à mesa diretora da Câmara no início desta legislatura pedindo a instalação de uma Comissão Especial para avaliação da proposta. O pedido, entretanto, aguarda a aprovação do presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP).

“A intenção é instalar a Comissão Especial nos primeiro meses do ano, e teremos, então, um prazo para negociações a serem feitas com os governadores, os secretários de cultura e o Palácio do Planalto para que possamos aprovar a vinculação. O fundamental é termos a certeza de que o país reconhece a necessidade de financiar políticas públicas na cultura e com recursos mínimos previstos nos orçamentos da União, dos estados e dos municípios”, relata Paulo Rubem. A aprovação do projeto de vinculação de recursos para cultura provavelmente encontrará várias dificuldades por parte dos governantes que não querem ter seus orçamentos engessados por leis que obrigam na aplicação de recursos em determinado setor.

Apesar do esforço de alguns parlamentares na busca pelo aumento no investimento para cultura, outros setores estão conseguindo aprovar propostas que compartilham dos recursos conquistados pela cultura via Leis de Incentivo.

Ano passado o Congresso aprovou a Lei do Esporte que permitia a dedução no Imposto de Renda da aplicação de até 4% do lucro líquido das empresas, na cultura ou no esporte. Dessa forma, os incentivos da Lei Rouanet, que anteriormente eram destinados para o setor cultural, seriam disputados também por projetos destinados ao esporte. A Lei seria injusta com a área da cultura, tendo em vista que o patrocínio ao esporte traz um retorno midiático maior para as empresas e provavelmente representaria em um esvaziamento do incentivo cultural do país.

Uma mobilização de artistas conseguiu sensibilizar o governo a editar a Medida Provisória 342/06, que estabeleceu um teto máximo de 1% para o patrocínio aos projetos esportivos, garantindo uma parcela para a cultura. A medida foi aprovada em fevereiro deste ano pelo Congresso.