Coordenação com a possibilidade de movimento

Em mais uma colaboração com uma publicação internacional, a Maska, da Eslovênia, o idança publica um artigo da crítica de artes cênicas e editora da Maska, Katja Praznik. A partir do trabalho de quatro jovens artistas eslovenas, Katja analisa a situação da dança contemporânea no país.


A vida é um fluxo indiferenciado, onde todas essas e outras incontáveis histórias de vida, convida ao constante processo de transformação material e reflexiva da realidade. É a transformação de uma indiferenciada – e, por si só, sem sentindo – hiperestrutura em conjuntos de estruturas funcionais e significativas.

(Eda Cufer) [1]




I – Porque alguém se incumbiria da ingrata tarefa de escrever sobre novos e emergentes fenômenos no campo da arte quando hoje, esse tipo de atividade é altamente arriscada e limitadora? Porque a necessidade de organizar a massa de fenômenos e determinar seus significados e implicações quando os mesmos estão ainda no começo, na fase de florescimento, amadurecendo e – ao mesmo tempo – procurando, quando não sabemos exatamente que caminho as coisas estão tomando e como elas vão se desenvolver? Como disse Denis de Rougemont: “Nossas vidas não estão calcadas no além temporal, mas em decisões que estabelecem nossa fidelidade e que devem sempre ser tomadas no presente. Quaisquer que sejam elas, acertadas ou não, o destino do mundo importa muito menos para nós do que a compreensão de nossas tarefas imediatas.”[2] Tendo em vista esse pensamento, eu assumirei a tarefa de uma apaixonada seguidora da dança contemporânea e escreverei sobre quatro atuais dançarinas contemporâneas: Urska Vohar, Tina Valentan, Nina Fadjiga e Jasmina Krizaj. No ano passado, elas apresentaram visivelmente seu potencial criativo e reafirmaram o fato de que a dança contemporânea é um dos mais intrigantes campos, onde o corpo humano “com sua capacidade de antecipação ficcional de necessidades e significados, transforma, objetiva e subjetivamente seu espaço externo e interno”. [3] Na luta por atenção e comunicação, as quatro bailarinas encontraram ressonância no desestruturado imaginário do espectador. [4] A paixão pela observação e pela escrita se conectou bem a com a paixão por inventar formas corporais de dança contemporânea. Além disso, nas percepções, reflexões e na busca por maneiras de trabalhar dentro campo da dança contemporânea no contexto esloveno, as artistas demonstram uma mudança que pode ser lida como uma compreensão conceitual do corpo que dança que difere das gerações anteriores. O que aponta para o potencial de suas primeiras apresentações é um corpo que dança baseado em fundamentos diferentes; essas apresentações estão ligadas tanto à história da dança contemporânea quanto às mudanças trazidas pelo conhecimento sobre a dança, o corpo em geral, assim como as especificidades do contexto local da dança.

Do ponto de vista histórico, as artistas alcançaram uma concepção do corpo que dança que passou de um modelo de totalidade estética autônoma para o modelo do corpo incompleto, incoerente e socialmente específico – o que é uma conseqüência do alargamento do conceito de dança e coreografia [5]. Com isso, a dança se distanciou do entendimento tradicional da autonomia do corpo que dança, constituído por meio de um fluxo de temas ou por uma rede de significados exclusivamente estéticos, em direção a um entendimento do corpo socialmente inscrito, contextualizado e encenado através de elementos políticos, econômicos, éticos e da experiência pessoal. A inscrição de diversos discursos sociais torna-se parte visível e inerente do corpo.

Apesar disso, o entendimento do corpo, assim como ele é trabalhado pelas artistas, mostra-se, também, cada vez mais distante de – ou pelo menos há um desejo de romper com – certas especificidades da cena eslovena contemporânea. Essa cena se constituiu pela estratégia de existência persistente, na qual o corpo no palco é estabelecido, por meio do movimento, como a essência fundamental da dança ou (em outras palavras) na qual o corpo está na posição de agente. Apesar de o corpo que dança ser uma fonte de conhecimento, ele se manifesta como um persistente desafio encarnado ao corpo puro em movimento, assim como o incompleto corpo socialmente específico – junto com as implicações que tem para a concepção de uma coreografia – pode estar parcialmente presente no trabalho e na poética de criadores anteriores da dança contemporânea da Eslovênia, essa incompletude foi (devido a questões específicas do estabelecimento do campo da dança na Eslovênia) percebida como uma capa sobre o corpo, sob a qual o corpo em movimento é revelado; assim, a incompletude e a incoerência meramente cobrem o persistente e desafiador corpo em movimento. Essa é uma conseqüência específica do problema da supressão da história [6] e da institucionalização da dança contemporânea na Eslovênia – já que o desenvolvimento e o funcionamento igualitário desta forma de arte foram impossíveis desde seu surgimento no contexto local. À luz dessa conclusão, a estratégia persistente de encenar um corpo ativo, que trabalha é – de todos os modos – a parte afirmativa, que pode ser entendida como o desafio do corpo em função de sua própria existência. No final dos anos 90, tal estratégia de encenação estava totalmente exaurida no espaço esloveno, já que os esforços sistemáticos para estabilizar a situação e institucionalizar a dança contemporânea falharam repetidamente em alcançar uma solução abrangente. No trabalho das quatro artistas mencionadas anteriormente, em seu entendimento do corpo dançante e seu entendimento adquirido da dança contemporânea como um campo tão relevante quanto os outros, podemos perceber um novo caminho, uma nova estratégia de apresentar e entender o corpo e de realizar uma prática de dança. Deixe-me assinalar que, apesar do crédito concedido à educação profissional das artistas, não podemos ignorar o fato de que alguns elementos de sua impressionante aparência e consciência também foram preparados e indicados por gerações anteriores e sua persistente e auto-organizada luta pela mera existência da dança contemporânea na Eslovênia.

A primeira característica comum identificável das quatro dançarinas é que elas completaram seus estudos profissionais em dança em Amsterdam, na School for New Dance Development (SNDO – Escola para novos desenvolvimentos de dança), que é o departamento de dança da Amterdam School of Art (Escola de Arte de Amsterdam). A SNDO é uma instituição educacional aclamada internacionalmente, foi estabelecida em 1975 e forma dançarinos profissionais e coreógrafos. A educação é focada principalmente nas formas como o corpo é percebido e como o corpo se comunica com a arte e a sociedade. O processo é voltado para a pesquisa, criação e composição de material de movimento, assim como na investigação das maneiras como o a dança é usada em trabalho de arte e na invenção de uma abordagem pessoal da dança e da coreografia. Para (quase) todas as quatro dançarinas, um meio de informação e de exemplo prático foi o trabalho do coreógrafo Matej Kejzar (também formado na SNDO), com quem elas colaboraram em performances e treinaram na Plesna izba Maribor (Salão de dança de Maribor) ou no estúdio de dança Intakt, em Liubliana. Plesna izba Maribor foi muito importante, especialmente paras as três dançarinas de Maribor (Vohar, Valetan, Krizaj), cuja curiosidade foi despertada, também, pelas coreógrafas Vlasta Veselko e Snjezana Premus. Por outro lado, como uma jovem hiperativa, Nina Fajdiga começou a dançar na escola de dança de Mojca Horvat; adolescente, ela ficou muito impressionada com o trabalho da companhia de dança Betontanc pelo uso diferente da dança e, mais tarde, foi selecionada para o estúdio Intakt. Lá, seu trabalho com Matek Kejzar contribuiu para sua decisão de estudar dança. “Estudar fora abriu uma nova perspectiva” enfatiza Tina Valentan, “e nós (dançarinos eslovenos) também nos tornamos mais conectados, o que dependeu, é claro, da cultura – nem tanto na língua, mas em nossa experiência em comum.” [7]

III – Na verdade, a primeira vez que as quatro dançarinas apareceram como autoras na Eslovênia foi nas apresentações de formatura: Urska Vohar com Dust Republic [8], Tina Valentan com Measure with micrometer, mark with chalk, cut with axé, when the moon is increasing and Nina Fajdiga e Jasmina Krizaj com o dueto HabitsAreWorthBeingFanaticalAbout. [9] No final de 2007, Jasmina Krizaj criou seu primeiro trabalho na Eslovênia, chamado V senci prestiza (Na sombra do prestígio) no Plesna izba Maribor, enquanto Urska Vohar e Tina Valentan estão planejando suas estréias para o final do ano. [10] Todos os trabalhos trouxeram características de frescor não-convencional para a o espaço da dança contemporânea na Eslovênia e as autoras se apresentaram como dançarinas confiantes, com presença física excepcional, talento, determinação e um sentido de reflexão de suas próprias experiências de corpo, o que está, sem dúvida, relacionado com a qualidade de sua formação. Como disse Tina: “por meio de questões, a escola desencadeia a compreensão de si, qual é o seu maior interesse, o que te fascina. Ela ensina a selecionar o que te interessa do mundo, do que está em volta, não só dentro de você mesma. Ela te encoraja a transformar as coisas intuitivas em racionais, conceituais – para que você seja capaz de falar sobre elas e expressa-las em seu trabalho. É natural, entretanto, sentir o trabalho intuitivamente e sentir que as coisas parecem diferentes quando você realmente fala sobre elas, mas a escola ensina a superar essa dificuldade, promovendo debates e avaliações através do diálogo. Ela também te coloca com contato com outras formas de arte. Eu, pessoalmente, vim para a SNDO focada, de forma muito estreita, na dança (movimento no espaço), eu estava direcionada para forma e estética (eu estava mais interessada na aparência da dança do que no lugar de onde ela surge), mas a escola me incentivou a considerar constantemente o que está por trás da forma – de onde ela vem e porque – e a fazer conexões com outras formas de arte. Dessa forma, você supera os limites de uma forma de arte (a dança, por exemplo), criando formas híbridas, nas quais não é possível determinar se é ou não é dança.”

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IV – Apesar de as artistas se apresentaram principalmente em seus próprios trabalhos, elas também querem dançar em projetos de outros artistas, já que estão qualificadas para ambos (dançar e criar). A escolha entre essas duas formas de trabalho não é uma decisão final para nenhuma delas. “Eu sinto que ainda tenho tempo, por isso posso brincar e escolher; estou interessada em muitas coisas e não quero pertencer a apenas uma profissão”, diz Jasmina Krizaj, que acrescenta: “Estou começando pós-graduação em Utrecht. Estou deixando várias opções em aberto; sei que quero trabalhar no campo da arte, mas não quero me fechar a outras coisas e estagnar, o que aconteceu com muitos artistas que – em algum momento – descobriram algo que funciona e é bom e repetem a mesma coisa por dez anos ou mais. Eu não quero ser uma operária da arte.” Tina Valentan e Nina Fadjiga também se dizem divididas entre os dois papéis e, por hora querem ambos. “Eu quero dançar porque acredito que assim eu posso manter minha liberdade aos olhos dos outros, mas eu também quero ser coreógrafa, porque dessa forma, eu desenvolvo aquilo que me interessa e aponto para o conflito que perpassa minha relação com a sociedade e minha posição nela”, diz Tina.

V. Tina, Jasmina e Nina estão formando um coletivo e querem fundar uma associação baseada na Holanda, onde elas poderiam estabelecer uma cooperação com o ambiente doméstico. A iniciativa de formar um coletivo é “principalmente motivada pela idéia de um projeto que deve acontecer entre 2009 e 2012, porque queremos aproveitar que Maribor é a Capital Européia de Cultura,” disse Tina. Nina e Jasmina acrescentam que elas devem examinar o tema da nostalgia através da situação existencial em que se encontram – divididas entre o lar, a história pessoal, o trabalho fora de seu país e seu sentimento de pertencer em algum lugar. “Apesar de ser terrível que estejamos pensando desse modo, que a União Européia apóia novos membros e que a Eslovênia só apóia projetos se houver participação de estrangeiros,” Jasmina é auto-crítica em relação a lógica pragmática. O objetivo de criar uma associação é também apoiar possibilidades de criação de seus próprios trabalhos e colaborações que interessam cada uma, individualmente.

Entre as quatro dançarinas, Urska Vohar foi a primeira a voltar, mas as outras, principalmente Tina Valentan, também estão se familiarizando com as complicadas condições de trabalho na Eslovênia. “Minha decisão de voltar para a Eslovênia foi de natureza prática,” diz Urska. “Na Holanda, eu não tinha projetos em andamento, apesar de querer ficar para aproveitar a conexão com a cena de lá, que eu conhecia mais que a de Liubliana. Quando eu vim para a Eslovênia, tive muita sorte, já que Maja Delak me ofereceu trabalho na Art Grammar School (SVSGL), o que tornou as coisas imediatamente mais fáceis.” Apesar de contente, de uma forma geral, ela está – até certo ponto – irritada com as condições impossíveis de criação de dança contemporânea. Ela observa também uma desproporção no apoio financeiro dos projetos. “Eu gostaria que novos artistas fossem apoiados e que a seleção fosse feita de acordo com a qualidade dos trabalhos a serem apresentados, que a qualidade fosse contemplada. Eu também gostaria que houvesse mais comunicação e transparência no diálogo, já que, no final das contas – independente do que nos interessa e nos motiva – estamos todos num mesmo mundo em que já existem divisões o suficiente e eu acho que não há necessidade de se criar mais subdivisões.”

Tina Valentan está em processo de criação de um novo trabalho, que será sua primeira experiência desde a formatura. “Eu fui imediatamente confrontada com parcos recursos e fiquei completamente chocada quando me apresentaram o orçamento. Isso é ridículo, o governo exige que eu trabalhe na Eslovênia por pelo menos quatro anos (que é o tempo que recebi a bolsa do Ministério da Cultura do Governo da Eslovênia), mas não me ajuda nisso. O dinheiro para a produção é nada, eu não posso viver dele. Eu acho isso absolutamente desrespeitoso. É por isso que eu não sou atraída para a Eslovênia; na Holanda, as condições são muito melhores. Não só os valores são mais altos se você solicita co-financiamento, como o status social é mais bem regulado.

VI. Cada uma das dançarinas tem interesses muito específicos a respeito da criação artística, mas o que todas têm em comum é uma certa concepção do corpo que dança que saiu do conceito moderno do corpo como uma totalidade estética autônoma em direção a uma concepção do corpo como entidade social que não pertence exclusivamente ao domínio estético e que, além disso, se revela incoerente e heterogêneo. O corpo que dança é, assim, real, específico e concreto, determinado pelo contexto social, pela história pessoal e pela experiência. Ou, nas palavras de Tina Valentan, “Meu corpo é um todo heterogêneo, já que é composto por muitas partes que têm diferentes origens (biológica, social, experimental, psicológica) – isso conecta meu corpo com o ambiente e possibilita minha compreensão. Dentre essas partes, a mente e o corpo físico são co-dependentes, eles influenciam um a outro em ambas as direções – às vezes um pensamento suscita uma reação física e às vezes a ação física suscita uma idéia.” Essa integração corpo/sujeito – se eu utilizar a caracterização de Elizabeth Grosz – funciona como uma fita de Moebius, na qual “corpo e mente não são duas substâncias distintas ou dois tipos de atributos que de uma mesma substância, mas algo entre essas duas alternativas” [11] Com a percepção do corpo como uma fita de Moebius, podemos mostrar “a inflexão da mente no corpo e do corpo na mente, as maneiras como, por meio de uma torção ou inversão, uma coisa vira a outra. [12] O corpo é, então, “o conceito de partida ou limítrofe que ronda perigosamente e de forma dúbia sobre o ponto central de pares binários” [13], indo sempre em ambas as direções e buscando a comunicação com o espectador. Eu acho que as quatro artistas entraram em uma batalha excepcionalmente construtiva e criativa contra as representações do corpo impostas socialmente, clichês, etiquetas e categorias, não se colocando na posição de vítimas, mas construindo, com seu trabalho, uma atitude reflexiva e irônica que é marcada por várias estratégias.

A trilha sonora de Dust Republic, de Urska Vohar é uma nostálgica música pop – a acumulação história da cultura pop local, coordenada com um pensamento que oscila entre a atividade do corpo e efeitos visuais. “Em Dust Republic, o maior impulso foi explorar como sou percebida pelos outros, o que meu corpo representa. No meu primeiro solo Rojena sem bila v dedeljo (Eu nasci num domingo), eu também lidava com frustrações – minha natureza anti-social e o fato de que eu projeto uma imagem que não condiz com a maneira como eu realmente me sinto.”

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Em HAWBFA, de Nina Fajdiga e Jasmina Krizaj, a estratégia de performance é baseada na transformação do fenômeno pop contemporâneo da industria da moda (e o fanatismo inerente a ela). Na peça, as autoras apresentam um material de movimento obsessivamente disciplinado, que é estruturado de forma minimalista. “Estávamos interessadas no tema da mulher na cultura pop, o caráter figurativo do corpo da mulher, no momento em que tudo se torna igual (unificado). A raiva pessoal se conecta, então, com o estado global do mundo em que vivemos, no qual somos bombardeados por moldes que supostamente devemos preencher.” [14] Ou, como Nina diz: “Estou interessada na realidade no palco, principalmente através da improvisação. Fico interessada quando o corpo no palco produz formas de comunicar, através de estados emocionais, sentimentos que quero mostrar.”

Em seu solo Measure with micrometer, mark with chalk, cut with axe, when the moon is increasing, Tina Valentan estabelece sua estratégia através da selvageria bizarra do primitivo e do bestial, na qual ela constrói formas e efeitos performáticos únicos, híbridos, energéticos e ousados. “Estou interessada em três conceitos, em relação à dança: transformação, o presente (a situação presente) e o que está no meio – o corpo que escapa uma definição exata e que nunca é exatamente puro, é uma mistura de memórias, reflexos, idéias e várias facetas do eu, presentes em nós. Me parece que a sociedade contemporânea nos limita e nos define demais, quando somos muito mais e, na verdade, transcendemos estes limites. Eu vejo a sociedade como controle, a mídia de massa manipula e controla. As pessoas são muito passivas e pouco espontâneas e o selvagem, de uma certa forma, estimula isso.”

VII. A última característica que une as quatro artistas (e a autora deste artigo) nas potencialidades heterogêneas de expressão artística e criações de corpos que dançam é o compromisso com uma intensa exploração das possibilidades da arte e sua cooperação ativa com a sociedade. Como Tina diz, “A arte aponta para detalhes que a maioria das pessoas não nota, porque nossa vida é muito acelerada e nós, de passagem, deixamos de prestar atenção em pequenas coisas interessantes; ela chama a atenção para os problemas da sociedade e esse é o papel que eu quero desempenhar, talvez com a dança ou sobre ela. Eu gostaria de ampliar a percepção da dança e de tudo que ela pode vir a ser.” Ou, nas palavras de Urska: “A arte incentiva a pensar sobre onde você está, quem você é, ela intriga com seu olhar, com sua forma de comunicação. Você sempre vivencia a arte por você mesmo e isso exige um certo esforço para que você entre no universo do outro, ao invés de ficar fechado em si mesmo – me parece que, hoje, muitas pessoas estão limitadas em seu próprio mundo. Se eu crio uma coreografia, o espectador terá que entrar no meu mundo para tentar entender – ou para não entender – mas é necessário entrar para se abrir para o outro. Eu acho que, atualmente, é preciso persistir e inventar repetidamente maneiras de mostrar como a arte é importante e precisa existir.”

Neste momento, deixe-me concluir a tarefa de uma observadora apaixonada da dança contemporânea. Uma forma de arte que afirma a comunicação da corporeidade e que, na paixão por realizar experiências e estados cinéticos (que podem ser lidos através do corpo), busca um espectador curioso que deseje inventar formas de ler a arte contemporânea e decifrar as questões que ela nos propõe.

[1] Eda Cufer, “Odrevesu, prasicu, premogu, koreografu in gledalcu” (Sobre uma árvore, porco, carvão, coreógrafo e espectador), Maska, Vol. 7, número 1-2 (Inverno 19997/98), p. 59-62, p.60.

[2] Denis de Rougemont, Love in the Western World, Princeton University Press 1983, p. 320.

[3] Eda Cufer, ibid, p. 60

[4] Eu me refiro, aqui, à caracterização de Eda Cufer: “Coreografar, dirigir – criar, de maneira geral – é, acima de tudo uma luta pela atenção daquele com quem queremos nos comunicar, é uma luta por um tipo de ressonância entre a estrutura ficcional de uma performance, pintura ou texto e o fluxo interno, desestruturado do imaginário do espectador ou leitor.” Ibid., p. 59.

[5] Essa mudança está relacionada com a história, especialmente com o período e o desenvolvimento da dança nos anos 60 e 70 – com autores como Yvonne Rainer, Trisha Brown, Steve Paxton, Pina Bausch, etc.

Katja Praznik, Uprizarjanje telesa v sodobnem plesu: ideologije telesa (Desempenhando o corpo na dança contemporânea: ideologias do corpo), tese de mestrado, Faculdade de Artes, Liubliana 2006.

[6] Eda Cufer, Nemogoca zgodovina – uvod” (História impossível – introdução), Zgodovina sodobnega plesa v Ljubljani. Podatkovna baza za analizo in vzpostavitev institucionalnega sistema za sodobni ples v Sloveniji (História da dança contemporânea em Liubliana. Base de dados para análise e institucionalização da dança contemporânea na Eslovênia), Liubliana, Departamento de Cultura e Pesquisa, 1999, p. 12-20.

[7] Todos os depoimentos citados das artistas foram gravados nas seguintes entrevistas: Nina Fadjiga e Jasmina Krizaj, em 6 de março de 2008; Urska Vohar em 13 de março de 2008 e com Tina Valentan em 26 de março de 2008.

[8] Estreou no Moving Cake Slovene Dance Festival.

[9] Ambas as apresentações estrearam no Young Creators Platform Maribor, entre 26 de abril e 5 de maio de 2008. HAWBFA veio para a Eslovênia também para o festival Red Dawns, em março de 2008.

[10] Urska Vohar em produção do Instituto EMANAT e Tina Valentan, na Association for the Promotion of Women In Culture – City of Women (Associação para a promoção da mulher na cultura – Cidade da Mulher)

[11] Elizabeth Grosz, Volatile Bodies. Toward a Corporeal Feminism (Corpos voláteis. Em direção a um feminismo corpóreo), Indiana University Press, Bloomigton/Indianápolis 1994, p. XII

[12] Ibid. “Este modelo também proporciona uma maneira de problematizar e repensar as relações entre os aspectos internos e externos do sujeito, seu interior psíquico e seu exterior corpóreo, mostrando, não sua identidade fundamental ou redução, mas a tensão de um no outro, na passagem, no vetor ou no incontrolável movimento de dentro pra fora e de fora pra dentro.”

[13] Ibid., p. 23

[14] Entrevista com Jasmina Krizaj e Nina Fadjiga em 6 de março de 2008

Katja Praznik é mestre em Sociologia da Cultura pela Universidade de Liubliana, trabalha como crítica, pesquisadora e dramaturga independente no campo da arte cênica contemporânea.