Corpo dança Corpo

O texto abaixo é a Introdução da tese de Adriane R. O. Grey. 

Ao escrever este texto, pretendi, primeiramente, apresentar e descrever o “objeto” de meu estudo, o espetáculo de dança contemporânea O Corpo, e, a partir desta apresentação, trazer à discussão as questões teóricas que me despertou. Mas, talvez ironicamente, não pude ter ao meu dispor, até a conclusão da escritura desta introdução, o material audiovisual que registrou o espetáculo e precisei trabalhar com os fragmentos que me ofereceram a memória. Em conseqüência disto, esta primeira parte de meu texto apresenta uma estrutura em que a descrição d’ O Corpo surge desobedecendo a uma organização linear enquanto que dialoga, concomitantemente, com as indagações teóricas que as lembranças instigaram-me. A não-linearidade da estruturação desta introdução acaba por estender-se a todo o texto, em decorrência, igualmente, das direções que o próprio espetáculo vai me informando ao longo desta reflexão. Estrutura que a princípio não busquei, mas a que, a certa altura, cedi, por perceber que podia também apresentar em sua construção as hipóteses que me levaram a produzi-lo: circularidades, recorrências e reenvios fazem o corpo de meu texto mover-se “de lá para cá”, para usar as palavras do título do ensaio de Inês Bogéa [1], como num balanço, seguindo o movimento d’ O Corpo que dança. Para que o leitor possa trilhar comigo o caminho que quero percorrer, procuro definir, então, mais claramente, ao final desta apresentação de meu estudo — que, simultaneamente o descreve e discute — o enfoque que quero dar a este espetáculo e sistematizar a abordagem por meio da qual o farei.  

O CORPO CONTA HISTÓRIA

Em 2000, quando completava vinte e cinco anos de fundação, o Grupo Corpo, companhia mineira de dança contemporânea, estreou em São Paulo o espetáculo de mesmo nome. O Corpo, vigésima nona coreografia do grupo, abordava um tema até então inédito em sua trajetória: a urbanidade.
A companhia, fundada por iniciativa de Paulo Pederneiras, em 1975, tem sua trajetória dividida em quatro momentos maiores, conforme explicaria Inês Bogéa, ex-bailarina da companhia e organizadora do livro Oito ou nove ensaios sobre o Grupo Corpo [2], na descrição da história da companhia em sua página eletrônica. O primeiro, que vai da fundação do grupo, em 1975, até 1984; o segundo, que começa em 1985 com o espetáculo Prelúdios, primeiro grande sucesso de público de Rodrigo Pederneiras como coreógrafo, até 1988; o terceiro que começa em 1989, com Missa do Orfanato e termina em 1999 e que caracteriza exatamente o período de patrocínio da Shell, durante o qual foram produzidos espetáculos bastante conhecidos do público como, além de Missa do Orfanato, 21, Nazareth, Sete ou Oito Peças para um Ballet, entre outros; e, por fim, um quarto momento que iria de 1996 até hoje, sob o patrocínio da Petrobrás, e que inclui os espetáculos Bach, Parabelo, Benguelê, O Corpo, e agora também Santagustin,  Lecuona e Onqotô. O primeiro momento diria respeito à consolidação do Grupo Corpo como companhia de dança e incluiria sua fundação, o início da atuação de Rodrigo Pederneiras como coreográfo, a instalação da companhia em uma sede própria, enfim, todos os passos que, conforme diz Bogéa, levariam o grupo a ocupar um lugar mais definido e destacado no cenário da dança nacional. Seria a partir do segundo momento da companhia que começaria, então, o descobrimento e a exploração de uma linguagem mais própria, com a quebra dos movimentos da dança clássica pelos movimentos das danças folclóricas e de rua, com ocupações de palco definidas por novas linhas e deslocamentos e, a partir de Prelúdios, com o início de uma interação muito mais intensa e evidente das diferentes artes que compunham o espetáculo e que se fortalece quando, pela primeira vez em 21, o grupo começa a trabalhar com trilhas sonoras brasileiras e exclusivas. Lecuona, espetáculo de 2004, quebra esta seqüência de produções que apresentam com música original e a companhia mostra uma coreografia baseada nas composições do cubano Ernesto Lecuona (1898 — 1963). Na verdade, Lecuona não seria o início de uma outra fase do Grupo Corpo, mas, mais provavelmente, um parêntese ou uma exceção que confirma a regra, já que o espetáculo que estreou no segundo semestre de 2005 e que comemorou os trinta anos da companhia tem, novamente, trilha sonora original, agora composta por Caetano Veloso e José Miguel Wisnik.

É com o espetáculo de nome 21, apresentado em 1992, quando, pela primeira vez a companhia convida artistas para comporem trilhas sonoras exclusivas para suas produções, que o grupo inicia um processo de construção que se efetiva por meio daquilo que Bogéa chama de “núcleo criativo”. Por meio deste “núcleo criativo”, as diferentes artes que compõem o espetáculo são envolvidas concomitantemente em sua realização. Deste núcleo participam o coreógrafo e as assistentes de coreografia, os cenógrafos, o iluminador, a figurinista, além do compositor da trilha sonora e dos bailarinos e sua dança que (des)constroem processos significativos ao longo de sua performance. Os espetáculos — objetos/ processos artísticos — que o Grupo Corpo apresenta-nos são esta amálgama de diferentes linguagens e suportes, consumido por seu espectador/ fruidor como uma única “obra”.

O CORPO SE MOSTRA

Para a realização do espetáculo O Corpo, o coreógrafo Rodrigo Pederneiras, convida o poeta/ performer Arnaldo Antunes a compor a trilha sonora. Pederneiras, que pensa suas coreografias principalmente partindo da música, assistido por Carmen Purri e Miriam Pederneiras, escolhe um compositor reconhecidamente urbano para desenvolver a temática da cidade. Esta temática inserirá no vocabulário da companhia uma movimentação mais típica dos habitantes da urbe. Seria importante explicar que, quando a companhia começa a buscar uma gestualidade mais própria, acrescenta a suas coreografias uma expressão corporal mais brasileira, em que os movimentos são menos rígidos do que malemolentes, mais arqueados e amplos, muitas vezes inspirados nas danças populares ou na própria gestualidade das pessoas nas ruas. Estes movimentos dialogavam, muito especialmente, com expressão corporal própria do interior do Brasil, conforme explicaria Inês Bogéa. Em 2000, no entanto, tematiza-se um outro popular, o popular urbano. Neste trabalho, inserem-se gestos mais bruscos, rápidos e nervosos, unindo aos movimentos malemolentes, mais utilizados em outras apresentações do grupo, outros mais robóticos.
Elementos coreográficos, sonoros, verbais, cenográficos e de iluminação e figurino relacionam-se de forma a compor um espetáculo em que alusões aos componentes característicos da cidade — certos ruídos e luzes, o grupo humano representado como (quase) homogêneo — são trazidos ao palco, possibilitando esta outra movimentação e expressão mais urbana. Arnaldo Antunes, por sua vez, traz a’ O Corpo, um contexto sonoro diferente, mais tecnológico ou eletrônico, sem, no entanto, esquecer ou abandonar as sonoridades primeiras, com as quais a companhia já trabalhava e que, na verdade, estão também presentes nas grandes cidades brasileiras, apresentando-nos, simultaneamente, como ele mesmo diz, “tambor e sampler” para compor “tribo e urbe”, e misturando diferentes influências como o rock, o baião, o funk, o techno, a marcha, a balada, o reggae, o samba de roda, a música árabe e a música indígena. A própria estrutura da trilha musical sugeriria a rarefação de separações ou fronteiras: são quarenta e dois minutos desenvolvidos como uma peça sinfônica de oito movimentos interligados, que “vão se transformando sem que a gente perceba”, conforme diz o compositor no encarte do CD [3] . A música composta por Antunes utiliza-se, ao longo do espetáculo, dos timbres de violão, guitarra, sons processados, percussão, baixo e teclado. Os timbres vocais, por sua vez, exploram o contraste de gênero, já que, na trilha sonora, as vozes de Arnaldo Antunes distingue-se das vozes de Mônica Salmaso e Saadet Turkoz.
O cenário deste espetáculo, minimamente constituído, é idealizado por Fernando Velloso e Paulo Pederneiras que o apresentam totalmente plano, utilizando a estrutura do palco tradicional que tem a forma do interior de uma caixa. Ele é composto por três cores — vermelho, preto e branco —, praticamente sem matizes, dentre as quais o vermelho apresentará, em certos instantes, diferentes nuanças. No cenário, os únicos elementos tridimensionais são os bailarinos em preto. A iluminação, que desde o espetáculo Bach3 é criação de Paulo Pederneiras, torna-se componente do cenário em O Corpo, na medida em que a luz que se projeta sobre o tablado torna-se o espaço vermelho onde dançam os bailarinos e em que pequenos spots são elementos constituintes do painel vermelho que fica ao fundo do palco, apagando-se e acendendo-se sucessivamente, muitas vezes ao ritmo das emissões sonoras, e, ainda, na medida em que, também sobre este painel, projeta-se, a certa altura do espetáculo, um quadrado de luz branca, na frente do qual a coreografia desenvolve-se.  Poder-se-ia dizer, portanto, que cenário transforma-se em luz e a luz, por sua vez, em cenário [4] .
Tem-se ainda um cenário móvel, constituído pelos próprios dançarinos, todos em negro, vestindo os modelos criados por Freusa Zechmeister. Zechmeister, ao nos apresentar seu figurino, brinca com o conceito de grupos urbanos, mostrando todos os bailarinos em uma mesma cor, caracterizando os ajuntamentos de tipos humanos semelhantes entre si, mas que, ao mesmo tempo, também permitem certa individualidade a seus elementos. Esta sutil heterogeneidade é construída por meio das diferentes tonalidades do preto que apresentam as roupas dos bailarinos e pelos diversos materiais e cortes que as constituem, perceptíveis apenas para o olhar que se detém mais cuidadosamente sobre eles, como acontece com as multidões nas cidades. Estes são os nomes que compõem o núcleo criador do espetáculo; nomes que, possivelmente, no decorrer deste texto, não serão tão freqüentemente mencionados por se tornarem, talvez, ao longo de minha análise, superpostos pelo próprio Corpo que criaram, sendo mais provável falar dos elementos que o compõem do que daqueles que o conceberam. Poderia aqui, abrir precedente para a questão já há muito discutida entre os estudiosos de arte e de literatura, que é a questão do autor. Mas, ao invés de abordá-la especialmente, esta reflexão surgirá incorporada ao texto e às outras discussões que aqui se enfocarão. Seria interessante, neste sentido, lembrar o que Paulo Pederneiras, também diretor artístico e responsável pela fundação do grupo, diz sobre a companhia: o Grupo Corpo “não tem nome de ninguém”. Não tem nome de ninguém e tem o nome de todos, acrescentaria eu, pressupondo que os diversos artistas/ criadores que contribuem na produção d’ O Corpo, concebem-no num campo de forças, como se o suspendendo em uma rede de relações que nada mais é que uma “teia criadora”, na qual cada elemento ou arte ou fio remete a outro, completando-se neste contato.

Quando me aproprio de expressões da Física como “campo de forças” ou quando penso em uma rede de “tensões” que permite o surgimento do espetáculo, quero evidenciar a estrutura dinâmica que constitui O Corpo. O Corpo não é estático, mas se constrói a partir de um constante enviar e reenviar de uma expressão artística a outra. Lembro-me,  aqui, da idéia de “circuito reversível” sugerida por Haroldo de Campos, em seu ensaio “olho por olho a olho nu”, no livro Teoria da Poesia Concreta. Ao falar sobre as composições poéticas, Haroldo explica que nelas se encontram três diferentes dimensões: uma dimensão gráfico-espacial, uma dimensão acústico-oral e uma dimensão conteudística, que se estimulam mutuamente e remetem uma a outra sem cessar, fazendo do poema uma estrutura dinâmica [5] . No espetáculo, têm-se diferentes linguagens que interagem simultaneamente constituindo um movimento circular e contínuo.

Ao discutir o circuito que percorre O Corpo que dança, lembro-me tanto de recorrências que se efetivam dentro da mesma linguagem quanto de recorrências que se realizam entre linguagens diferentes. Vejo, por exemplo, nas coreografias de Pederneiras a que tive oportunidade de assistir, a freqüente existência de núcleos de bailarinos que executam, simultaneamente, seqüências de movimentos distintas. Em determinados momentos da coreografia, ocorre a desagregação de um ou mais elementos de seu grupo original que, como se impulsionados por uma “força centrífuga”, reorganizam-se em outros núcleos, até sofrerem, conforme as palavras de Bogéa, a “pressão do próximo impulso” [6] que os leva a um novo rearranjo. Esta sua dinâmica seria como uma representação metonímica do movimento circular que caracteriza a totalidade do espetáculo. A constante tensão nos núcleos e sua sucessiva reordenação mostrariam, no âmbito coreográfico, a cinética d’ O Corpo que se efetiva no contato e na troca de informação contínua entre as diferentes linguagens que o compõem.

Nos reenvios que ocorrem no âmbito das relações que se estabelecem entre as linguagens, penso no diálogo que os núcleos coreográficos que cito acima instalam com a trilha sonora de Antunes que tende, igualmente, a operar com as texturas sonoras sendo apresentadas simultaneamente ou estabelecendo um jogo de adensamento e esvaziamento. Diversos movimentos podem ser concomitantemente executados no palco, bem como a música pode estar construída por um amontoamento de sonoridades verbais e não-verbais. Ou, ao contrário, como no Momento VII, por exemplo, a trilha sonora esvazia-se de palavra, que se retiram da cena, e a própria vocalização da melodia dá-se, durante um minuto, somente por meio de uma voz feminina, que é, então acompanhada da outra voz também feminina e da masculina. Analogamente, as bailarinas à frente do quadrado de luz repetem uma seqüência coreográfica curta executada, até certo momento, sem a presença de nenhum outro bailarino no palco.

Retomo o primeiro momento da coreografia como exemplo para melhor explicar esta questão: os bailarinos formam diferentes grupos, aqueles que acompanham as enunciações mais graves e distantes das palavras (mão   pé   mão   pé), com movimentos mais lentos, como, por exemplo, os movimentos de rolamento, e aqueles que executam movimentos mais rápidos e saltitantes que seguem os vocábulos pronunciados em um tom mais agudo e andamento mais acelerado (mãopémãopémãopé…). Os grupos alternam-se, evidenciando-se, na coreografia, a inexistência de uma hierarquia entre elementos ou conjuntos de elementos que estão no palco. Esta organização sintática, muito utilizada pela companhia em seus trabalhos mais recentes, é chamada de parataxe, na medida em que, na dança, como na gramática, todos os componentes mostram ter a mesma relevância para a coreografia, algo que se evidencia pela rotatividade de sua presença em cena e pela troca de componentes que executam diferentes seqüências coreográficas. A parataxe seria a relação que predomina no espetáculo como um todo, se se considera, igualmente, a coexistência das diferentes artes completando-se umas nas outras. É interessante observar, ainda, que, no que tange à movimentação dos bailarinos ocorre, neste trabalho, aquela que Susan Lee Foster reconhece como a principal técnica da sintaxe paratática: a variação [7] . Em O Corpo, a variação ocorre por meio de recursos como as seqüências que se repetem em grupos e momentos diferentes, as diferentes distribuições e direções que os bailarinos que as executam podem apresentar no tablado em instantes diversos, a apresentação simultânea destas seqüências, ainda que acompanhando ritmos diferentes, e os grupos de bailarinos que se desagregam e se reúnem novamente, entre outras possibilidades.
Diria que o circuito percorrido por este espetáculo, sua circularidade e seu caráter dinâmico, por motivos sonoros e semânticos, são também expressos pelo título deste trabalho: Corpo dança corpo.

Na tentativa de explicar este título, seguirei o percurso igualmente realizado pel’ O Corpo que dança, constituído de reenvios sucessivos. Há leituras diversas suscitadas por Corpo dança corpo e todas elas me levam, de diferentes maneiras, em direção à reflexão que me proponho a desenvolver neste texto. Em primeiro lugar, pode-se pensar em uma leitura mais literal deste título, na qual a companhia dança a coreografia do espetáculo O Corpo; poder-se-ia supor também que, conhecendo o processo de criação coreográfica, que parte da trilha sonora, “os corpos dos bailarinos” dançam “os corpos das palavras e dos sons”, segundo diz Arnaldo Antunes no encarte do CD [8] . Enfocando-se mais especificamente a linguagem poética, poder-se-ia dizer, ainda, que o texto, sob a pressão de um volume que insiste em se acentuar e romper o plano do papel, expande-se na direção de um terceiro eixo, conquista o espaço [9] , “ganhando corpo” e gerando o movimento. O corpo humano dança os corpos das palavras e dos sons, mas a dança também é a música e a palavra incorporadas. A dinâmica circular do espetáculo faz com que a palavra e o som, que saem do corpo emitidos pela voz, voltem a ele e sejam por ele materializados na coreografia apresentada. Atentando-se novamente para os núcleos de bailarinos que se desagregam e se reorganizam sucessivamente, pode-se ainda relacionar analogamente sua dinâmica à das palavras que, como seus corpos, impulsionados para outros grupos, são, também, impelidas por uma força ao movimento fora da página. Há, em ambas as situações, a idéia de um acúmulo de “energia potencial” que se transforma em “energia cinética”, para outra vez apropriar-me dos termos da Física. Pode-se, finalmente, partindo do título, simplesmente pensar que, conforme teria dito Eliane Robert de Moraes, em seu ensaio “A mecânica lírica do corpo”, neste espetáculo, “o corpo nada mais tem a apresentar que não a si mesmo” [10] .

O CORPO QUESTIONA

A partir das leituras do título deste trabalho, apresentaram-se a mim três grandes questões, que exporei, aqui, brevemente e que se tornaram os “motes” dos três capítulos que constituem esta tese. A organização destes capítulos será explicada ao final desta introdução. 
O primeiro questionamento que me traz O Corpo que dança, mais imediato, é aquele que trata da própria apresentação d’ O Corpo que dança à platéia. Este processo, referido por Moraes, seria, igualmente, a problemática a que Jean-François Lyotard teria se referido em seu ensaio “O Anjo”, sobre o quadro de mesmo nome do pintor norte-americano Barnett Baruch Newman (1905 — 1970). Propõe Lyotard, sobre o anjo da tela de Newman, que “a mensagem é a apresentação (…) da presença” [11]. Explica ele que o anjo é uma figura mensageira que nada anuncia, mas que se constitui no próprio anúncio. Não se estabelece, neste quadro, uma relação triádica na qual se envolvem destinador, destinatário e referente, diz o filósofo. Na falta de alusões externas, o quadro de Newman acaba por constituir-se na própria ocorrência. Lyotard chama atenção para o tempo desta ocorrência, que é, na verdade, um tempo condensado em um instante pictórico.  

Esta questão leva-me a pensar na noção de tangibilidade ou de palpabilidade de um objeto ou processo artístico ou estético, bastante pertinente à crítica contemporânea. Hans Ulrich Gumbrecht, em seu livro mais recente, Production of presence — what meaning cannot convey, que aborda a questão da “presença”, aborda esta relação. O termo “presença”, explica ele, não se caracterizaria por um sentido mais ontológico, mas seria constituído, na verdade, em algo que, na vivência da fruição estética, apresentar-se-ia como um objeto ou processo artístico que ocorre no espaço, ou seja, “presença” como um elemento que estabelece uma relação espacial com o mundo e seus componentes, que nos é alcançável e que é capaz de causar impacto imediato em nossos corpos.
Em seu livro, Gumbrecht propõe uma retomada do corpo e da materialidade do significante no estudo e na crítica da experiência estética, elementos relegados ao esquecimento na tradição ocidental calcada no cogito cartesiano. Para ele, a incontestável condição da centralidade da interpretação e o conseqüente abandono da “presença” em todos estes longos anos de estudos desenvolvidos nas Ciências Humanas devem ser revistos e o enfoque sobre a arte, repensado. O estudioso, porém, esclarece que não pretende apresentar o paradigma metafísico ou a produção de significado como problemáticos, não havendo, portanto, a intenção de simplesmente negá-los. Há, isto sim, uma preocupação com a retomada de fenômenos materiais que foram esquecidos devido à ênfase dada exclusivamente a estas abordagens. A poesia, explica ele, seria um exemplo de uma arte que trabalha intensamente tanto com os efeitos de presença quanto com os efeitos de significado.

A linguagem poética não está absolutamente subordinada ao significado, mas se efetiva num jogo de tensões, exatamente como comentei anteriormente a respeito do espetáculo O Corpo, no qual elementos formais como a rima, o verso, a estrofe, os recursos de assonância e aliteração, entre tantos outros, a compõem na mesma intensidade e importância que o elemento interpretativo. Na mesma medida, n’ O Corpo, a linguagem coreográfica e a musical apresentam-se como possibilidades semânticas e como plasticidade e concretude sonora, respectivamente.
Vejo O Corpo como um espetáculo congruente ao pensamento de Gumbrecht, na medida que reconsidera não só a questão da participação do corpo físico no processo de reflexão estética, mas também na medida em que recupera a materialidade do significante, e, mais especificamente, da palavra, visto que, pela primeira vez em sua trajetória, a companhia apresenta uma trilha sonora na qual as canções ou “momentos”, como os chama Antunes, na sua maioria, são compostos por elementos melódicos e verbais, ou seja, a música é acompanhada de letra. A poesia que acompanha a música constitui-se de quatro poemas especialmente criados para O Corpo, dois poemas retirados de seus livros Psia (1986) e as coisas (1992), além de um fragmento de Alice através do espelho, de Lewis Carroll, com tradução de Sebastião Uchôa Leite.  Aqui, a dança não é mais uma “arte muda”, como quer a maioria das definições mais tradicionais, fato que não somente se evidencia quando também atentamos para os ruídos orgânicos que, como as palavras, compõem a trilha sonora, mas também pela capacidade que o corpo que dança tem de produzir significado, como se verá no decorrer da discussão desenvolvida neste trabalho.

É interessante lembrar que Antunes já foi descrito como um “homem de palavras” [12], visto que o signo verbal é o ponto de partida e fundamento do seu trabalho. Mas a palavra de Antunes, em suas composições poéticas, sempre se apresenta transitando por diferentes registros, que vão desde meios eletro-eletrônicos, como o vídeo, o CD e o computador, por exemplo, até seu próprio corpo e voz, suportes de suas performances, com o objetivo de também destacar e potencializar sua própria materialidade do signo verbal. Na trilha musical d’ O Corpo, ela se transforma também em “célula rítmica e sonora”, por meio da qual dançam os corpos dos bailarinos. As palavras são tanto enunciadas calma e separadamente quanto superpostas ao longo do espetáculo. Muitas vezes, fazem-se acompanhar de uma marcação eletrônica e a simultaneidade de vozes corresponde a uma simultaneidade musical. Há, igualmente, forte acompanhamento percussivo em muitos instantes da trilha sonora e não posso deixar de lembrar que, na música, a noção de ritmo está ligada à de pulso, palavra que, por sua vez, alude a corpo. Corpo vivo. As canções são, ainda, igualmente compostas por elemento melódico e esta concomitância de instrumentos acústicos, elétricos e sons eletrônicos, juntamente com os signos verbais e ruídos orgânicos, constitui toda a trilha sonora de O Corpo cujos resultados são muitas vezes obtidos por meio de um sampler, operado por Chico Neves. Há, ainda, ao longo da trilha de Antunes, a tendência a uma dissolução da palavra que dá lugar ao registro sonoro instrumental ou à vocalise. A recorrência deste procedimento tende a colocar em foco os movimentos dos bailarinos, como no caso do Momento VII, em que este processo efetiva-se literalmente. Este procedimento possibilita, ainda, uma dinâmica em que a palavra dá lugar à indizibilidade.

Toda esta lógica que permeia estes processos de construção d’ O Corpo, ao se expor pelo corpo do dançarino, reporta-me à questão da presença e de seu caráter “alcançável” na experiência da fruição estética. Talvez pareça que o conceito de tangibilidade relacione-se ao de presença de maneira a conduzir-nos a inferir uma noção de permanência a ele intrincada. Mas, ao recordar que, na verdade, o termo “presença” foi apresentado por Gumbrecht no contexto da expressão “produção de presença” [13], tem-se uma outra compreensão de sua proposição. “Produção”, explica ele, vem do latim producere, e é usada no sentido de sua raiz etimológica, na qual producere significa, literalmente, trazer à tona ou trazer à vista um objeto no espaço. Nesta medida, a tangibilidade que apresentam os materiais de comunicação seria um efeito resultante de um processo em contínuo movimento. Sob a concepção de Gumbrecht, a experiência estética estabelece-se, justamente, por meio desta “produção de presença”. Todavia, ao contrário do que o termo “presença” poderia fazer pensar, esta condição não apresenta nenhuma garantia de extensão ou durabilidade no tempo, tendo, na verdade, uma existência muito mais fugaz do que se poderia imaginar ou pretender. Fato que se torna evidente quando se atenta para a presença dos corpos dos bailarinos na dança. Nada mais tangível e nada mais efêmero. O Corpo apresenta-se e apaga-se no espaço. Ao movimento sináptico que ocorre na cabeça, ao cogito que sempre buscou definições e certezas, acrescenta-se o movimento do corpo, que se constrói e se desconstrói no instante seguinte da escrita coreográfica. A presença do corpo que dança só existe na medida que é impermanente.

A noção de impermanência, que está, na verdade, no cerne das questões que despertam as artes performáticas como um todo, fez com que sobre a dança debruçassem-se muitos intelectuais, muito especialmente aqueles que foram contemporâneos ao seu surgimento como a nova arte da modernidade. Entre estes nomes estão o do coreógrafo francês Jean-George Noverre (1727 — 1810) e dos escritores Stéphane Mallarmé (1842 — 1989), Paul Valéry (1871 — 1945) e Oscar Wilde (1854 — 1900).

Para Valéry e Wilde, a dança, por meio da movimentação de seus bailarinos, seria uma arte capaz de promover a proliferação de significantes no espaço e de desmaterializar a Verdade que a eles correspondesse, considerada absoluta em sua essência. A conseqüência deste processo seria a abolição de significados, na medida em que a dança estaria sempre dando um passo a frente de seu estabelecimento. Para alguns, a efemeridade da dança era considerada sua glória, porque a tornava uma forma absoluta de arte, na medida em que não conduzia a nada, a nenhum conceito ou idéia, mas por “ter um fim em si mesma”, conforme palavras de Valéry. Mas sua impermanência era, sobretudo, razão para que fosse olhada como uma arte menor, como puro entretenimento. Nenhuma arte séria poderia ser irrecuperável. Talvez por este motivo e por um certo apego a procedimentos críticos mais próximos aos princípios da metafísica [14] , muitas tentativas de registro definitivo da dança foram feitos, desde as notações do século dezoito até o contemporâneo registro tecnológico. Porém, como explica André Lepecki, conforme o coreógrafo e teórico da dança Mark Franko [15] , a efemeridade não deve ser vista como aquilo que falta à dança ou que deva nela ser corrigido, mas sim como um componente que lhe permite instigar uma série de outros questionamentos também pertinentes à reflexão estética. A teoria da dança, explica ele, pode se desenvolver além da necessidade da documentação, escrevendo-se ao longo do apagamento que se efetiva.

Penso em Mallarmé, poeta discutido por Franko em seu ensaio “Mimique” [16]. Mallarmé refletiu longamente sobre a dança: para o poeta, ela apresentava o estado ideal que ele buscava na literatura. Retomo seu poema Un coup de dés, e penso em seu poeta/ criador/ marujo, que na tentativa da composição, fracassa e desaparece no mar do texto. Mas a possibilidade da criação não se esgota, na medida em que as últimas palavras do poema são exatamente as mesmas que as primeiras, indicando a possibilidade de reinício de todo o processo criativo. Volto à dança e reflito sobre o corpo do bailarino que se inscreve no espaço, fazendo-se presente e causando impacto sobre nossos corpos, como quer Gumbrecht, mas que, na medida em que se move no palco, apagando suas próprias imagens, não se constitui, como o quadro comentado por Lyotard, em uma ocorrência fixada no instante, mas num evento que também se inscreve no próprio tempo que o extingue, sendo concomitantemente presença e impermanência: os dois conceitos que estabelecem o diálogo que se instala no primeiro grande questionamento que me instiga o espetáculo.

Este questionamento estende-se também à problemática da documentação da dança. Sua impermanência levou muitos de seus estudiosos à nostalgia da presença e à busca, por vezes insistente, de sua fixação por meio de um registro físico. Em algum momento surge a vontade do familiar e do previsível e tenta-se inscrever esta presença fluida em forma de documento. Há mecanismos mnemônicos dos mais variados graus tecnológicos que vão desde as fotos do programa ou do encarte do CD, do próprio CD de áudio, até o vídeo e/ ou o DVD, entendidos, talvez, como recursos capazes de garantir a autenticidade do registro. É o apego à permanência que, ainda com estes recursos, não se pode efetivar integralmente. Pense-se, por exemplo, na fixação das imagens no suporte audiovisual: é preciso, primeiramente, que haja uma iluminação específica, além da iluminação do espetáculo, para que a gravação efetive-se e este é um elemento determinado por uma escolha individual ou de equipe; esta, por sua vez, deve ser refratada pela lente da câmera; há a seleção das imagens via lente e via olho humano no processo de filmagem; e, por fim, o corte feito pelo olhar do(s) editor(es) é mais um componente que evidencia a parcialidade de um registro, isto sem sequer considerarmos o olho que assiste ao vídeo ou ao DVD.

A dança não pode ser completamente apreendida, diz André Lepecki. Sua presença será sempre assombrada pela invisibilidade, uma presença que estabelece a ausência [17] . Não há, portanto, registro definitivo, ele será limitado, relativo, fracionado. Características que também pertencem ao espetáculo registrado na memória de seus espectadores, memória que é sabidamente fragmentária, não-linear e distorcida. Reflito sobre esta questão e sorrio ao lembrar que escrevo toda esta introdução sem nenhum registro visual além do fotográfico, fator razoavelmente complicador para quem trabalha com um espetáculo de dança. Mas leio novamente a introdução de Lepecki e consolo-me ao entender que escrever sobre uma performance, depois de sua realização, é uma contenda não exclusivamente minha. A simples tarefa de definir a origem de nossas lembranças — advindas do próprio espetáculo ou das fotografias, dos vídeos, se houver, ou até mesmo de comentários de outros críticos —, já é, por si só, bastante complexa.

Creio que, com muitos estudiosos da dança, é preciso partir da aceitação da sua condição plural — presença e impermanência compõem o mesmo corpo que dança — para poder pensar criticamente sobre esta arte. Peggy Phelan é uma dentre os teóricos que requer para a dança um pensamento crítico que se produza a partir da tensão que estabelece a concomitância de sua presença e de seu apagamento e que possa, com esta tensão e partindo de dentro de um espaço de fricção por ela estabelecido, discutir a dança apropriadamente. Para esta teórica, o corpo que dança percorre um ciclo que se realiza na relação dinâmica entre sua presença,  seu apagamento e sua (re)(a)presentação. A (re)(a)presentação proposta por Phelan refere-se a uma volta da presença, que não é mais só física, mas contextualizada, forjada por condições culturais, na qual o corpo e sua história retornam juntos à cena [18] . Este percurso realizado pelo corpo que dança constitui-se no segundo grande questionamento que me apresenta o espetáculo.
Sob a perspectiva que resgata o corpo com sua carga histórica e cultural, muitos dos estudiosos contemporâneos da dança propõem sua (re)apresentação à cena. No estudo do apagamento do corpo que dança, alguns teóricos como André Lepecki, Mark Franko, Peggy Phelan e Ann Cooper Albright dialogam muito intensamente com as proposições do filósofo Jacques Derrida, aproximando a idéia do traço por ele proposto, que igualmente trata da mutabilidade e da não fixidez de conceitos, à fugacidade deste corpo. No movimento circular que o corpo que dança prescreve, sua presença, como o traço derridiano, desloca-se e apaga-se. Todavia ela não se torna, por este motivo, culturalmente irrecuperável. Retorna, na verdade, apresentando as distinções políticas, culturais e de gênero que nele se inscrevem de maneira palpável e concreta, como propõe Lepecki. Nesta medida, o olhar que se detém sobre a dança amplia-se para além de seu apagamento e, paralelamente, para além da abordagem derridiana. Como propõe este estudioso, no movimento que leva o corpo que dança à sua (re)apresentação, o problema do auto-apagamento é deslocado para um contexto histórico-político e, dentro dele, ao mover-se, o corpo é, ainda, um corpo presente, agora, porém, marcado pelas inscrições que este contexto lhe determina [19] , bem como apresenta a possibilidade de nele intervir.

É evidente que a dança, como as outras artes, é produzida em meio a discursos dados e que nenhum bailarino, coreógrafo ou artista envolvido em sua concepção está isento das determinações impostas por seu contexto. Como propõe Helena Katz, “nosso olho não passeia nu pelo mundo, mas carregado de instruções” [20]. Todavia, para alguns teóricos como Foucault, esta condição é predominante e o corpo, como a literatura, é visto como um elemento formado por um conjunto de textos previamente existentes em sua herança cultural e construído por suas condições históricas e geográficas, estando, nesta medida, completamente sujeito à disciplina e às determinações externas. De acordo com este pressuposto, o corpo seria como se um mero suporte que carregaria as inscrições que lhe foram impostas [21] . Os estudos da dança, no entanto, apesar de retomarem a perspectiva foucaultiana e dialogarem intensamente com ela, como o fazem com as proposições derridianas, percorrem uma trajetória que se desdobra em possibilidades de intervenção para o corpo que dança. Na mesma medida que se constitui em suporte no qual se registram as marcas de sua cultura e do seu tempo, este corpo pode tornar-se um corpo agente capaz de desestabilizar alguns conceitos ou pressupostos relativos a seu papel no contexto social e também no palco, a partir de sua própria condição histórica e de seu conhecimento e entendimento. Esta proposição é trazida aos escritos sobre a dança por estudiosos como, além daqueles já citados no parágrafo anterior, Cynthia Novack, Carmen Mackendric, Susan Lee Foster, dentre outros.

Diria que a primeira maneira pela qual O Corpo que dança aborda a questão da sua (re)apresentação encontrar-se-ia no próprio fato da trilha sonora do espetáculo apresentar letra na maioria de suas canções, o que remeteria à relação do corpo com a palavra que compõe o discurso que o determina e que é por ele modificado. Há momentos no espetáculo em que a coreografia e a poesia da canção dialogam e tensionam-se mutuamente, como ocorre quando certos gestos dos bailarinos, por breves instantes, correspondem a alguns versos das canções para, imediatamente depois, seguirem com sua movimentação, desafiando a literariedade daquilo que se enuncia. Por vezes, este diálogo estabelece-se de forma antitética, quando os movimentos realizados são contrários ao que a canção anuncia. Em contrapartida, os poemas das canções listam ou descrevem partes ou propriedades do corpo, tornando-se igualmente, para além de seus atributos semânticos, célula rítmica e sonora que embala a dança dos corpos dos bailarinos. Creio que todas estas inter-relações que se instalam entre corpo e palavra, no espetáculo, seriam uma abordagem metafórica da questão do corpo como elemento determinado pelo discurso e, concomitantemente, como componente capaz de nele intervir e de produzir significado.
Creio que um segundo enfoque proposto para a problemática da (re)apresentação do corpo que dança trazido por este espetáculo que tematiza a urbanidade seria aquele que se debruça sobre a problemática do corpo individual ser formatado pelo grande corpo social. O Corpo traz à cena, em diferentes momentos, a imagem do “homem-massa”, do elemento humano diluído em seu grupo. A configuração dos bailarinos no palco, percebida primeiramente como homogênea, constrói-se por meio de elementos de figurino e de coreografia. Os corpos todos em preto e os movimentos robóticos executados pelos integrantes da companhia aludem muito claramente a esta uniformidade determinada pelo conjunto. No entanto, simultaneamente, a idéia da matriz coletiva prescrevendo o comportamento individual suspende-se pelos mesmos meios: há movimentos individuais que se destacam da coreografia dançada pelo grupo maior e há componentes do figurino que mostram discretas diferenças do grande Corpo em preto. 

Por fim, penso que uma outra questão que se estabelece quando se abordam as inter-relações que se instalam entre corpo e palavra, ou corpo e texto, é aquela que se refere às discussões sobre gênero. No espetáculo, creio que este aspecto é especialmente trazido ao palco por meio dos pas de deux que nele são executados. O pas de deux  tradicional do ballet clássico, como diz o nome, constitui-se numa seqüência coreográfica realizada por duas pessoas, um homem e uma mulher, e é um dos momentos mais destacados de uma coreografia, no qual se expõe todo o virtuosismo técnico alcançado pelos bailarinos solistas da companhia. O casal de bailarinos dança numa movimentação que os pode apresentar numa execução conjunta do movimento, em alguns momentos, ou separadamente —  e se for este o caso eles percorrerão linhas simétricas em sua dança —, e em ambas as maneiras, a representação dos papéis masculino e feminino mostra-se bastante definida.
Retomo O Corpo como grupo e penso nos vários pas de deux homossexuais a que assisti em suas apresentações. Lembro, especialmente, do pas de deux lésbico do espetáculo aqui estudado, que, subseqüente a um pas de deux heterossexual de interpretação intensa, quase bruta, apresenta movimentos que procuram o chão nos quais uma das bailarinas dança de costas para a platéia, e, nesta medida, suspende a idéia clássica do ballet com os gêneros definidos e os padrões de corporalidade pré-estabelecidos. “(…)SEXO 0 x 0”, diria o verso do Momento VI d´O Corpo. Da mesma maneira que instala a inconstância nas relações que se estabelecem nos processos de linguagem, o ato de dançar desestabiliza as relações de corpo e gênero. A dança apresenta corpos construídos textualmente que também se inscrevem enquanto executam sua performance. Ambos os fenômenos ocorrem concomitantemente, talvez porque o corpo, ou O Corpo, tenha outra lógica à qual não pertençam categorias duais, como aquela que opõe o natural ao construído culturalmente.

Toda esta discussão conduz-me ao terceiro grande questionamento que me sugere este espetáculo: o corpo que dança como elemento em que confluem materialidade e racionalidade, o entendimento do corpo físico e, mais especificamente, do corpo que dança como um espaço em que e a partir do qual também se efetivam a  reflexão e a teorização. Nesta medida, o corpo que dança seria um tropo relevante na proposição de outras intervenções teóricas. Susan Leigh Foster, em seu livro Dances that describe themselves – the improvised choreography of Richard Bull, aborda algumas coreografias deste artista, em que dança e fala apresentam-se simultaneamente no palco. Nesta abordagem, Foster discute, entre outros temas, como, na contemporaneidade, quebra-se, primeiramente, a exigência da virtuose física trazida da tradição clássica e, igualmente, a crença vigente, especialmente na dança moderna, de que esta seria uma arte que teria para compartilhar com seu público não mais que experiências e sentimentos pessoais, emoções individuais que não poderiam ser expressas por outros meios. A palavra, dentro destas duas acepções de dança, seria distinta do corpo que a executa e entendida como dela completamente afastada. Como conseqüência desta concepção, compreendiam-se as práticas expressivas verbais como hierarquicamente superiores às não-verbais, correlação que predominava também no espaço acadêmico, onde a dança era vista como uma arte “não-cognitiva”, considerada como parte das disciplinas de Educação Física ou como mero entretenimento.

A partir, especialmente, das performances realizadas na década de sessenta nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, a dança começa a ser reconhecida como um espaço onde, conforme Foster, os aspectos corporais e intelectuais interagem e são problematizados no palco. Tanto para Foster quanto para Bull a linguagem do movimento é articulada como o é a linguagem verbal, algo que se pode ver claramente quando este corpo dança. Tanto o corpo que dança quanto a palavra e o discurso constituem-se em linguagens que produzem diferentes línguas, com gramática e léxico próprios. No que tange à primeira, podemos pensar nos diversos vocabulários que se organizam em diferentes sintaxes nas várias línguas das escolas clássica, moderna, contemporânea, entre outras. Ambas linguagens — do verbo e do movimento — são, como sugere Foster, produtos de uma “intelligent physicality” [22] e efetivam-se somente no afluxo da materialidade e da racionalidade. Para Foster, coreografar é uma maneira de aprender a teorizar e dançar, uma assimilação pelos bailarinos dos fatos e das estruturas que permitem que a teorização ocorra. Nesta medida, a voz d’ O Corpo é um elemento que reafirma a dança como lugar também de teorização.
 
Helena Katz, em um ensaio seu publicado no livro O homem máquina —  a ciência manipula o corpo [23], quase homônimo de sua tese de doutoramento chamada Um, dois, três — a dança é o pensamento do corpo, explica que, na dança, há um estágio mental atuando no qual não se tem “consciência de”, mas “consciência com”. Para Katz, a consciência também está no corpo, e a dança é o momento no qual o corpo todo pensa. Ela cita Arnaldo Antunes:
“Pensamento vem de fora
e pensa que vem de dentro, (…)
   (Tudos, s/p.)

Uma possível leitura destes dois versos sugeriria o “fora” como a fisicalidade do corpo e o “dentro” como uma suposta capacidade de raciocínio e análise dele independente, determinada por fatores a ele excêntricos, como uma existência espiritual que o geraria. O pensamento estabelecer-se-ia — e, mais que isso, começaria — no suporte físico. Não haveria pensamento fora do corpo.

Para Helena Katz, conforme exposto em sua tese de doutoramento, o corpo que dança seria a apresentação plástica de um percurso neuronial que se estabelece no cérebro, de uma matriz lógica que, ao tornar-se movimento, caracteriza o que ela chama de pensamento do corpo. No âmbito cerebral, informações sobre a movimentação a ser efetuada seguem esta trajetória nervosa que determina um mapa ou padrão estrutural. Quando este padrão é reproduzido na musculatura, por meio de processos de codificação e decodificação de instruções, e constrói no corpo a estrutura da matriz neurológica que o gerou, a dança realiza-se e, sob estas circunstâncias, apresenta o pensamento que instala por meio de sua movimentação. Para reforçar seu pensamento, retomo as palavras de Foster: “bodily articulation is mindful. Thoughts occupy space and time” [24]. Inúmeros elementos do espetáculo reforçam a materialidade d’ O Corpo que dança. Sua tangibilidade não é somente apresentada pelos corpos dos bailarinos em cena, mas por toda a materialidade das linguagens envolvidas neste trabalho. Ela se instala por meio das imagens sugeridas no cenário-luz — a microscopia sangüínea, o contraste radiográfico dos bailarinos em frente ao quadrado branco de luz — e pelas sonoridades que O Corpo apresenta — sons de respiração, ruídos do corpo. A fisicalidade deste Corpo reafirma-se ainda por meio das palavras das canções, elementos semânticos — e sonoros — que o descrevem, estabelecendo, nesta última relação, o vínculo entre sua fisicalidade e inteligência.

É interessante lembrar, neste momento, do pensamento de Jean-François Lyotard. Para este estudioso, o corpo é o hardware que torna o pensamento — o software — possível. Segundo Lyotard, não há lugar fora do corpo para o pensamento filosófico formular suas questões [25] . Qualquer possibilidade de pensamento, portanto, sob a forma da dança ou dela desvinculado, teria como suporte a materialidade do corpo e esta materialidade constituir-se-ia no único meio pelo qual o pensamento pode ser instituído. Ou, como Helena Katz teria afirmado em seu ensaio supracitado, a cognição é algo que está encarnado, que faz parte do próprio corpo. A biologia e a física seriam, assim, tão responsáveis pelo nosso sistema de conceituar quanto a cultura.

O corpo que dança, por meio da própria linguagem do movimento, fala por si mesmo e sobre si mesmo. A dança d’ O Corpo leva o caminho de nossas reflexões a sempre se dobrarem mais uma vez, e mais outra, num movimento sucessivo de questões que remetem a outras questões, construindo uma teia de referências mútuas sem fim. Quando Eliane Robert Morais fala que “o corpo nada mais tem a apresentar que não a si mesmo”, leio que o corpo apresenta-se como elemento tangível e, neste sentido, presente, mas penso igualmente no corpo como o elemento que traz à cena, por meio de sua fisicalidade mesma, uma série de questionamentos. Por meio da materialidade d’ O Corpo que dança, surgem as indagações teóricas que o espetáculo sugere-me. 

UM PERCURSO A SEGUIR

Creio que chego no ponto crucial de meus questionamentos: como O Corpo de maneira lúdica e inquisitiva traz ao palco todas estas interrogações, como se efetiva este processo de instigar tantas questões por meio deste espetáculo e quais são os recursos materiais de que ele dispõe para que eu chegue a todas estas indagações. O Corpo mostra-me que ele também se refere a outros eventos, mas me faz querer saber como estas referências são construídas e, como explica Foster, entender como se efetiva a capacidade do corpo anunciar e ser anunciado por outras linguagens. Percebo, ao longo do meu texto, palavras recorrentes: presença, impermanência, corpo, movimento, palavra, simultaneidade, voz, repetição, circularidade, dobra. Estes vocábulos oferecem-me o caminho que pretendo percorrer em minha tese, caminho que deverá ser mais tortuoso do que linear, muito menos retilíneo e muito mais curvo: quero seguir o fluxo que o espetáculo propõe-me, acompanhando o movimento de ida e volta de uma questão a outra.
Suponho que o caminho traçado por Linda Hutcheon em seus estudos acadêmicos esclareceu-me algumas questões e mostrou-me, em certa medida, um percurso a seguir. Hutcheon parte de suas considerações sobre as tantas indagações suscitadas pelo que se convencionou chamar de pós-modernismo, para, então, debruçar-se mais atentamente sobre a ópera. As questões ali suscitadas e agora amadurecidas são absorvidas em sua reflexão sobre esta arte escolhida. A ópera, explica Hutcheon, que como a dança era também considerada apenas entretenimento, uma manifestação menor, é hoje entendida por muitos teóricos como uma arte que instiga inúmeros questionamentos que estão igualmente no cerne das reflexões estruturais e teóricas da teoria literária — além é claro de serem pertinentes a outros estudos estéticos e culturais como aquele que se refere à linguagem cinematográfica, por exemplo, ou às questões de gênero — e que, pelo estabelecimento de um diálogo com ela, acresce suas discussões, enriquecendo-se simultaneamente.

Minha reflexão parte e retorna a’ O Corpo que dança continuamente. Divide-se em três grandes partes, correspondentes às três maiores questões que o espetáculo apresentou-me. A essas partes chamo Mo(vi)mentos. Numa primeira leitura deste nome, quero aludir aos Momentos da trilha musical, que não estão claramente divididos, mas entretecidos, e em que o começo de uma canção e o final de outra apresentam transbordamentos. Movimentos, a outra possibilidade de leitura que proponho, reporta-se à mobilidade da estrutura d’ O Corpo, à dinâmica circular e contínua que se instala entre os elementos que o constroem e ao transpassamento sucessivo de fronteiras ou conceituações rígidas, no qual se inclui o percurso que se dobra para além dos limites corpóreos da dança para estabelecer diálogos com outras artes e sugerir significados.

No Primeiro Mo(vi)mento, detenho-me no pensamento d’ O Corpo que dança. Dedico-me a investigar como materialidade e inteligência articulam-se para o definirem, como o corpo que dança institui-se como espaço para teorização.

No Segundo Mo(vi)mento, retomo a questão da pluralidade d’ O Corpo que dança que se constitui num elemento determinado por sua presença e impermanência, na medida em que se inscreve nas dimensões espaciais e temporais. A necessidade do registro, a impossibilidade de fazê-lo integralmente e o apagamento que acompanha inevitavelmente a dança serão também abordados neste momento de minha discussão.
Por fim, no Terceiro Mo(vi)mento, busco discutir a relação entre corpo e palavra/ texto, considerando, nesta reflexão, elementos coreográficos, sonoros e verbais. Focalizo, especialmente, a maneira como o corpo é construído textualmente por sua realidade cultural e histórica e como é, igualmente, capaz de intervir neste contexto, abordando brevemente, nesta reflexão, questões que se estabelecem entre o individual e o coletivo, e as determinações de gênero.

A característica cinética d’ O Corpo é elemento fundamental neste estudo que, conforme comentei diversas vezes, tem sua atenção transitando de uma linguagem a outra, de uma indagação a outra, num caminho de muitas voltas: voltas que perfazem o corpo de meu texto, que não segue uma ordenação linear, não abordando, portanto, os Momentos do espetáculo na ordem em que se apresentam. Escrevo, na verdade, seguindo uma ordem temática e retomo estes momentos constantemente, enfatizando mais ou menos seus diferentes elementos — coreográficos, musicais, cenográficos ou de iluminação — de acordo com sua contribuição para a reflexão que se desenvolve num determinado instante de minha discussão.
Retomo as partes que constituem o espetáculo constantemente, mas creio que, conforme expliquei anteriormente, este movimento segue aquele que O Corpo realiza, enviando e reenviando minha leitura de uma linguagem a outra, levando-me, no mesmo ritmo, de uma a outra questão, ou a questões, simultaneamente. Repetição, circularidade, simultaneidade e tensão são, portanto, características físicas e intelectuais deste espetáculo e deste texto.

QUANDO O REGISTRO ACONTECE

Ao terminar de escrever minha introdução, recebi, enfim, o material audiovisual do espetáculo O Corpo. O DVD, produzido em 2001 pela empresa alemã Kultur, apresenta algumas diferenças em relação ao espetáculo a que assisti em 2000, ano de seu lançamento, cujas imagens, incompletas e fragmentadas juntamente com as fotografias do programa do espetáculo, serviram-me como referências mnemônicas para o exercício de reflexão que fiz na parte introdutória deste trabalho que concluo aqui.
O número de bailarinos, no DVD, aumentou de dezenove para vinte, e dez dos integrantes do grupo são profissionais diferentes. A perspectiva que oferece a tela plana da TV também é diversa, pois muitas vezes se me apresentam certas imagens, enquanto, na verdade, eu escolheria ter pousado meu olhar sobre outras tantas e sinto, nestes momentos, uma certa frustração. Por outro lado, a possibilidade de ter este material à minha disposição a toda e qualquer hora constitui-se num excelente instrumento de trabalho. Assisto e reassisto o espetáculo, congelo as imagens ou observo os movimentos num ritmo mais lento, podendo apreender deles pequenos detalhes e “sua consistência, não apenas seus efeitos” [26].

O recurso audiovisual permite-me desenvolver de maneira mais pertinente aquilo que Susan Bannes define como close analyses [27], procedimento que registra o léxico, a sintaxe e as relações gramaticais de uma coreografia. Esta abordagem, como explica Bannes, é fundamental para desenvolver a reflexão que relaciona a dança a seu contexto, como, neste trabalho, a que ocorre quando analiso, por exemplo, a questão do corpo como formação cultural e/ ou textual e também como agente capaz de se inscrever neste mesmo quadro que o constrói. Neste texto, a close analyses constitui-se, também, em ponto de partida para a abordagem epistemológica a que me proponho, na medida em que me permite amparar meu pensamento nos elementos coreográficos do espetáculo que, unidos aos componentes poético-musicais, de luz, cenário e figurino, ofertam-me os dados de que preciso para efetuar minha leitura d’ O Corpo. O percurso que parte da gramática da coreografia para a gramática do espetáculo, que nada mais é do que a maneira como ele se constrói e como interagem as diferentes linguagens na sua realização, instrumentaliza-me para abordar estes questionamentos.
 
O DVD d’ O Corpo encontra-se anexado a esta tese e contém, por problemas de limitações técnicas que impediram o corte do material apropriado, igualmente o espetáculo Bach e um documentário sobre a companhia. O Corpo inicia sua apresentação na faixa de número quinze. Desejo que possam apreciá-lo como o fiz, desde a primeira vez que o assisti no teatro.

Notas:

[1] BOGÉA, Inês. “O Corpo: de lá para cá”.In: BOGÉA, Inês. (org). Oito ou nove ensaios sobre o Grupo Corpo,  p. 22-35.

[2] Idem, ibidem.

[3] ANTUNES, Arnaldo. O corpo. Estúdio Rosa Celeste, São Paulo: 1999.

[3] Sobre o espetáculo Bach ver o artigo de Tereza Virginia de Almeida. “Corpos em tensão: masculino, feminino e barroco no espetáculo Bach do Grupo Corpo” In: Revista de Estudos Feministas, p. 137-153.

[4] BOGÉA, Inês. Op. cit., p. 34.

[5] CAMPOS, Haroldo et alii. “olho por olho a olho nu”. In:  Teoria da Poesia Concreta. p. 46.

[6] BOGÉA, Inês. www.grupocorpo.com.br/pt/historico.php

[7] FOSTER, Susan Leigh. Reading dancing. p. 92. Susan Leigh Foster, bailarina, coreógrafa e teórica da dança, classifica a sintaxe coreográfica em três grandes grupos: a mimética, a patológica e a paratática. O Corpo trabalha predominantemente com esta última, como se explica neste texto.

[8] ANTUNES, Arnaldo. Op. cit.

[9] ________. 40 escritos, p.113.

[10] MORAES, Eliane Robert de. “A mecânica lírica do Corpo”. Op. Cit., p. 64.

[11] LYOTARD, Jean-François. O inumano. p. 87.

[12] 89 a revista rock (no 6/ ano I, 1998)

[13] Mantenho a expressão em português porque foi em nossa língua que ela foi sugerida ao professor por um de seus alunos, provavelmente um brasileiro, considerando as ligações acadêmicas de Gumbrecht com o Brasil.

[14] Quando uso o termo metafísica, faço-o como o fez Gumbrecht: “metafísica se refere muito mais a uma atitude e uma perspectiva acadêmica que dão um valor muito maior ao significado dos fenômenos do que à presença material; a palavra, portanto, sempre quer ir além ou abaixo daquilo que é físico.” (GUMBRECHT, Hans Ulrich, Op. cit., p. xiv., minha tradução) Não há, na escolha deste termo, nenhuma conotação transcendental ou religiosa, cf. Gumbrecht. The production of presence — what meaning cannot convey, p. xiv.

[15] André Lepecki editou o livro Of the presence of the body —  essays on dance and performance theory (Middletown, Connecticut: Wesleyan University Press, 2004), no qual reúne ensaios de muitos teóricos, entre eles, Mark Franko e Peggy Phelan, de que falarei logo adiante. Em seu próprio ensaio, Lepecki comenta a abordagem de outros teóricos, entre eles, os dois anteriores, comparando-os. O ensaio de Lepecki chama-se “Inscribing dance”, p. 124 – 135.

[16] FRANKO, Mark. Op. cit., 205 – 216.

[17] LEPECKI, André. Introduction – Presence and Body in Dance and Performance Theory. In: Op. cit., p. 1-12.

[18] No livro que organiza, Of the presence of the body—- essays on dance and performance theory, em seu próprio ensaio, intitulado “Inscribing dance”, André Lepecki comenta sobre outros autores que também participam desta publicação. Lepecki reporta-se muito especialmente aos escritos de Peggy Phelan e Mark Franko e explica este ciclo de apresentação, apagamento e (re)apresentação, quando trata da abordagem de Peggy Phelan em relação à dança e às artes performáticas em geral.

[19] LEPECKI, André. Inscribing dance. In: Op. cit., p. 135.

[20] KATZ, Helena. Um, dois, três —  a dança é o pensamento do corpo, p. 140.

[21] Michel Foucault desenvolve seu pensamento sobre a questão do condicionamento do corpo e do indivíduo em seu livro Discipline and punish, e é um teórico constantemente retomado por estudiosos da dança como Susan Lee Foster, André Lepecki, Mark Franko e Peggy Phelan, entre outros.

[22] FOSTER, Susan Leigh. Op. cit., p. 181.

[23] KATZ, Helena. A dança, pensamento do corpo. In: O homem máquina—  a ciência manipula o corpo. p. 266.

[24] FOSTER, Susan Leigh. Op. cit., p. 241.

[25] LYOTARD, Jean-François. “Se pudermos pensar sem corpo.” In: O Inumano. p. 17 -31. Este ensaio, na verdade, uma comunicação que Lyotard realizou em um seminário ocorrido no Graduiertenkolleg da Universidade de Siegen (RFA), por solicitação de seu diretor, que era, então Hans Ulrich Gumbrecht. Gumbrecht dirige a pergunta expressa no título a Lyotar que, ao longo de seu texto, responde; “não, não podemos pensar sem corpo.”

[26] KATZ, Helena. Op. cit., p.16.

[27] BANNES, Sally. Dancing women- female bodies on stage. p. 3.