Corpos entre margens | Bodies between margins

A idéia deste texto partiu de um tempo de convivência com o Núcleo de Criação do Dirceu, periferia de Teresina, Piauí, em fevereiro de 2008. O grupo Musicanoar foi convidado a se apresentar com o espetáculo de dança Vapor no projeto lançado pelo Núcleo de Criação do Dirceu denominado Mapas do Corpo (leia aqui notícia sobre a 3ª edição do evento).

Sabemos que qualquer construção bem realizada depende de parcerias e condições as quais propiciam possibilidades mais concretas de realizações com um devido sucesso. No caso do Musicanoar, eu – Helena Bastos – e Raul Rachou tínhamos a disponibilidade da diretora de Vapor que nos acompanhou: Vera Sala. Da parte do Núcleo de Criação do Dirceu contávamos com a coordenação de Marcelo Evelin (coreógrafo/criador/intérprete) neste projeto, a produção de Regina Velloso e Klayton Amorim e o diretor administrativo Francisco de Castro. Neste circuito houve também a mão do Itaú Cultural – Rumos Dança2006/2007, que administrou nosso cachê, nossas idas e vindas tendo sempre a presença da gestora de projetos de dança Sônia Sobral.

Quando mapeamos estas relações é por querer chamar atenção que qualquer pensamento, para existir, necessita de visibilidade que estará sempre vinculada a uma temporalidade no ambiente e co-dependente do modo como as relações se articulam num determinado espaço focado e disponível em direções que fomentem o fazer criativo. Em Teresina, era falar de dança, criação, dramaturgia, contemporaneidade em dança, enfim, pretendia-se deste encontro uma reflexão conjunta em que artistas, professores e iniciantes ligados à pesquisa de linguagem cênica movessem suas ações e conseguissem expandir modos de pensar organização no corpo que dança.

Arte no projeto Dirceu passa pelo entendimento de outras formas de conhecimento. Todo conhecimento é uma forma de educação vital. Vale ressaltar a pertinência deste encontro com o Musicanoar. Apesar de morarmos em cidades distantes entre si, como São Paulo e Teresina, parte do que alimentou nosso encontro foi a percepção de haver uma proximidade por questões conceituais inseridas nas nossas investigações contemporâneas.

Nestes 16 anos de trabalho, o Musicanoar ampliou o entendimento sobre composição e coreografia no ambiente contemporâneo. Hoje, o perfil deste artista na relação com uma obra coreográfica exige uma intervenção diferente tanto no momento da construção, produção e execução do espetáculo.

O Musicanoar apresenta um perfil que lida com uma conduta investigativa, em que determinados padrões de movimentos se formalizam, a partir do modo como construo o espaço deste ambiente num passo a passo. É um modo de construção que, para aquele que está envolvido no ambiente enquanto intérprete-criador, é muito difícil. Em conversas, durante ou depois de uma coreografia ser concluída, muitos destes intérpretes desabafavam comigo ou com outros que uma das maiores dificuldades era a da sensação de se mover num ambiente escuro e desconhecido – eles tinham dificuldades de nomear este “dançar”, perdiam referência sobre o chão desta dança. O encadeamento desta fala era recebido com estranhamentos e conseqüentemente geravam preocupações como aonde tudo isso iria levá-los?

Esta maneira de construção exige uma disponibilidade imensa. O chão inicial é a idéia da pesquisa coreográfica que surge com um padrão de movimento. A partir deste passo, inicia-se um processo em rede – a idéia se amplia, o padrão inicial de movimento vai se tornando mais preciso no espaço, desenhos espaciais em deslocamento vão surgindo nestas conversas e um ambiente musical vai-se configurando. A coreografia anda para frente, apesar de sensações que lidam com perdas, ganhos, avanços e retrocessos. Estes parceiros, intérpretes-criadores, marcaram o Musicanoar com atos de imensa generosidade no propósito de criar outros mundos, cheios de significados, num ambiente onde a princípio nada está configurado.

Desde 1993, Raul Rachou pôs os pés no Musicanoar e, aos poucos, suas longas pernas contaminaram o meu caminhar com o Musicanoar. Ele é o meu grande companheiro de cena. Sem premeditação, simplesmente uma construção mútua, contínua, de uma imensa caminhada. Apesar de Raul, na sua trajetória de vida, ter passado por várias aulas e cursos de dança, é a partir de 1990 que se lança com uma dedicação mais profunda e sistematizada na sua formação corporal.

Em 1999, decidi que o próximo trabalho seria com a participação de poucos intérpretes. Esta escolha surgiu a partir da minha necessidade em averiguar mais profundamente o corpo, o que acontece quando provocamos criação de outros padrões de movimentos e o que esta relação provoca no contexto do ambiente. Neste momento, poderia ter escolhido a direção de um solo coreográfico, porém, gosto de compartilhar a cena com alguém. Neste caso, perguntei ao Raul se ele concordava que a próxima aventura fosse somente entre eu e ele. Juntos, decidimos ir além, mais fundo na busca de outros entendimentos de corpo que lidam com a criação e investigação da cena contemporânea em dança.

A convivência com Raul foi ampliando o meu entendimento sobre o papel do intérprete-criador. Na realidade, ao montar os espetáculos, no início da minha convivência com o Programa de Comunicação e Semiótica, eu achava que uma mistura de referências poderia dar conta desta conduta contemporânea. Hoje é claríssimo que não basta misturar e ficarmos no nível de inúmeras colagens. A crítica de dança Laurence Louppe nos fala da idéia de hibridação: “Mistura evoca uma idéia de universalidade que está em harmonia com o tipo de abertura cultural oferecida por correntes mundiais de pensamento com suas idéias sobre alteridade, identidade de grupo e diálogo inter-grupal. Contrastando com isso, o híbrido. Esse híbrido não se situa em nenhum lugar, não é nada. Freqüentemente, ele é totalmente isolado e atípico, o resultado de uma combinação única e acidental. A hibridação funciona muito mais do lado da perda. A hibridação age mais na nucleação dos genes ao subvertê-los e deslocá-los”. (2000: L. Dança2)

Outro dia, conversando com Raul e a nossa consultora de improvisação, Cleide Martins, nos questionamos sobre o que é que há, nesta nossa parceria, que colabora nesta configuração de dois, enquanto ótimas condições de trabalho, voltada para uma produção de pensamento investigativo e da cena? Levantei a seguinte hipótese: a necessidade de ocupação. Dessa forma, o meu olhar lida com composição. Busco decifrar na relação do pensamento lançado possibilidades de diversas ocupações no ambiente que lidam com diferentes níveis de criação. Neste caso, falo de vetores, deslocamentos, aceleração, produção de outros padrões de movimentos e desenhos no espaço, por exemplo. É como se eu fosse criando toda uma geografia deste lugar com seus inúmeros relevos e apontando as necessidades destas diversas relações.

O Raul tem a mão de um cirurgião. No momento em que proponho uma investigação de padrão de movimento no corpo, o seu mergulho gera uma obsessão profunda de auto-investigação na relação com tudo que começa a povoar o nosso ambiente. Tal rigor contamina todo o fazer da cena. Ele libera interações neste ambiente em que todo um trabalho exploratório no próprio corpo ilumina as necessidades das minhas solicitações, liberando um aspecto poético e filosófico. Neste tempo de convivência com este meu parceiro, a sua dedicação ao trabalho de professor baseado na técnica do método de pilates aguçou nele um grande entendimento do corpo. Hoje, ele me ensina sutilezas deste nível de disponibilidade corporal, em um caminho povoado de diferenças. A cada vez que proponho uma fala, sua primeira ignição é a da necessidade de um grande mergulho na experimentação. A conversa entre palavras surge depois. Percebemos que, por mais estranha que seja a minha solicitação de coreógrafa, a formulação de qualquer dúvida se tornará mais precisa após diferentes experimentações e elaborações neste processo criativo que demanda tempo.

À medida que o Musicanoar avança nos seus projetos, ao longo destes anos, nos inserimos em diferentes movimentos representativos de profissionais de dança, que propiciaram diferentes estratégias de atuação conjunta na cidade de São Paulo. Se, enquanto artistas, não nos envolvemos e elaboramos outras estratégias coletivas de organização e condução que venham a atender nossas necessidades, quem irá criá-las? No nosso caso, um exemplo é lutar por subvenções públicas e leis que garantam a subsistência e manutenção de diferentes grupos em projetos de criação, circulação e produção.

Nestes 16 anos muitos movimentos de dança foram criados, desmontados, aglutinados de outros jeitos exigindo de seus participantes conversas e estratégias de permanência da realidade de dança contemporânea. Não cabe agora explicitá-los, porém, existe um aspecto comum entre todos – cada um destes grupos e artistas lidam com uma produção investigativa e de pesquisa de linguagem num fazer contemporâneo. Entendo que o Núcleo de Criação do Dirceu também está ligado a estas reflexões. Expandir modos de organização a fim de gerar compromisso dos governantes na elaboração de política pública de cultura de forma mais eficiente e condizente com nossas necessidades contemporâneas.

É importante esclarecer que o termo contemporâneo não está associado a uma técnica ou estilo de dança. O termo contemporâneo traduz uma ação investigativa na relação das nossas propostas coreográficas que passam por um pensamento e o modo singular como cada grupo ou coreógrafo constrói seus espetáculos. Os espetáculos gerados por estes diferentes criadores nunca são produtos prontos, quer dizer, as apresentações públicas são oportunidades deles testarem suas investigações. Uma vez que estes criadores buscam invenções com outros modos de construção, geralmente, seus espetáculos funcionam como protocolos de laboratórios, resultantes de pesquisas direcionadas para uma linguagem da cena.

Espetáculo Vapor / Foto divulgação

Espetáculo Vapor / Foto divulgação

Todo conhecimento é uma forma de educação vital. Vivemos porque conhecemos. Por esta razão, entendemos que a arte é um mecanismo co-evolutivo em que a estética faz parte de uma realidade concreta. A natureza também é estética. Estética é lidar com eficiência e, não à toa, as coisas precisam se adaptar para sobreviver. A pertinência da arte age na relação de uma necessidade de expandir uma realidade para permanecer (isto é, sobreviver), conhecer e construir, numa mesma escala temporal, outras possibilidades de se pensar sobre processos organizativos.

O Centro de Criação do Dirceu foi criado em agosto de 2005 pela prefeitura de Teresina, respondendo a insistentes reivindicações da Comunidade do Grande Dirceu, bairro mais populoso da cidade. Esta ação atende a uma urgência colocada por seus munícipes. Isso é uma iniciativa pública com possibilidades de sucesso pelo fato de ser compartilhada e apoiada por uma comunidade que deseja investigar a arte. Esta empreitada vem mobilizando e reconfigurando este ambiente público como um espaço de discussão, troca, trânsito, interação, pesquisa, aproximando artistas de diferentes pólos do Brasil e do exterior para fomentar o pensamento de um fazer estético numa direção contemporânea.

O Núcleo de Criação do Dirceu na estréia de Mapas do Corpo foi competente na articulação entre regiões distantes, que comprovaram que a distância não é um obstáculo para se entrar em contato. Qualquer expansão de pensar outros modos de organização depende da imaginação, inventividade e coragem de se quebrar rotinas e tentar caminhos não experimentados. No Dirceu houve um belo encontro. Caso o modo de articular um pensamento de dança fosse totalmente diferente daquilo que o Musicanoar acredita, com certeza as falas seriam levadas ao vento. Porém, lá em Teresina, percebemos que apesar de cada um dos artistas resolverem em cena suas questões de forma diferente estamos discutindo em cena os mesmos conceitos. Em outras palavras dependemos da capacidade de nós, artistas contemporâneos, viver com riscos e de aceitarmos a responsabilidade pelas conseqüências: cuidados e auxílios mútuos.

No Dirceu, a criatividade não está disponível para linha de montagem, e sim para ações que acionam no coletivo, pensamentos que se cruzam e estimulam encontros que reforçam outras formas de pensar organização. Com os Grupos Residentes, Núcleo de Criação do Dirceu, oficinas oferecidas ao NCD e à comunidade, Mapas do Corpo, Projeto Instantâneo, residências artísticas, espetáculos e palestras, Marcelo Evelin e seus parceiros elevaram Teresina a um ambiente de referência na construção de novos modos de pensar e compartilhar a arte contemporânea.

Não podemos admitir um entendimento de dança contemporânea que margeia em significados devaneios de pessoas sem “praticidade” ou ainda algo supérfluo. Como diz o astrofísico Jorge Albuquerque, dança é uma manifestação de complexidade e evolução, é um reflexo de valores mais elevados que a humanidade tem tentado vivenciar. É assim a tentativa de efetivação de formas elevadas de sobrevivência, formas essas, sabemos, bastante inacessíveis à maioria dos seres humanos, mas potenciais em todos eles.

Transitamos num discurso temporal. Marcas de uma práxis que se constrói a todo instante. Vivemos a ação em tempo real. Desta maneira se defrontam normas e formas. No nosso caso, trilhamos caminhos que apostam em outros tipos de autonomias de dança. Percebemo-nos artistas ativistas que sob outros modos de organizar dança encaramos ações co-adaptativas numa realidade emergente, de caráter urgente. O professor geógrafo Milton Santos nos lembra:

“Há quem prefira dizer que o tempo se unifica, mas não é disso que se trata. O que realmente se dá, nesses nossos dias, é a possibilidade de conhecer instantaneamente eventos longínquos e, assim, a possibilidade de perceber a sua simultaneidade. O evento é uma manifestação corpórea do tempo histórico, algo como se a chamada flecha do tempo apontasse e pousasse num ponto dado da superfície da terra, povoando-o como um novo acontecer. Quando, no mesmo instante, outro ponto é atingido e podemos conhecer o acontecer que ali se instalou, então estamos presenciando uma convergência de momentos”. (2008:196)

Foi um privilégio co-habitar provisoriamente o mundo do Dirceu, um espaço brotado da experiência enquanto existência. Como nos lembram as águas do rio Poti e Parnaíba – um longo processo de encontros que deságuam num grande oceano.

Helena Bastos é bailarina, coreógrafa, professora/USP e pesquisadora.

Referências Bibliográficas:

GREINER, Christine (2005). O Corpo. Pistas Para Estudos Indisciplinares. São Paulo: Annablume.

KATZ, H.(1994). Um, Dois, Três: A Dança é pensamento do Corpo. FID: Belo Horizonte

SANTOS, Milton (2008). A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4ªed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.

VIEIRA, Jorge de Albuquerque (2006). Teoria do Conhecimento e Arte – Formas de conhecimento – arte e ciência numa visão a partir da complexidade. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora.

The idea for this article came up after a time of working together with Núcleo de criação do Dirceu, in the outskirts of Teresina, Piauí, in February 2008. The Musicanoar group was invited to perform with the dance piece Vapor in a project launched by Núcleo de criação do dirceu called “Mapas do Corpo” (Maps of the body).

We all know that any well built construction depends on partnerships and conditions that create more concrete possibilities of successful realizations. In the case of Musicanoar, I – Helena Bastos – and Raul Rachou had the availability of the director of Vapor, Vera Sala. On the part of Núcleo de Criação do Dirceu we counted on the coordination of Marcelo Evelin (choreographer/creator/performer) in this project, production by Regina Velloso and Klayton Amorim and administrative direction by Francisco de Castro. In the circuit, there was the hand of “Itaú Cultural – Rumos Dança 2006/2007”, which managed our payment, our coming and going, always with the presence of dance project manager Sônia Sobral.

When we map these relationships, we want to draw attention to the fact that any thought, in order to exist, needs visibility, which will always be linked to temporality in surroundings and is co-dependent on the way the relationships articulate themselves in a given space, focused and available in directions that promote the creative act. In Teresina, it was talking about dance, creation, dramaturgy, contemporarity in dance, from the meeting, the intention was a joint reflection, in which artists, teachers and beginners on scenic language research moved their actions and were able to expand ways of thinking the organization of the dancing body.

Art, in the “Dirceu” project, goes through the understanding of other forms of knowledge. All knowledge is a form of vital education. It is important to point out the pertinence of the encounter with Musicanoar. Although we live in cities far apart, like São Paulo and Teresina, part of what nurtured our meeting was the perception that there was a proximity in conceptual issues inserted in our contemporary investigations.
In the sixteen years of work, Musicanoar has widened the understanding about composition and choreography in the contemporary environment. Today, the profile of the artist in relation to a choreographic work demands a different intervention in the moment of construction, production and execution of the show.

Musicanoar presents a profile that deals with an investigating conduct, in which certain movement patterns are formalized, from the way I build a space within this environment step by step. For those involved in this environment as a performer-creator, this is a very difficult way to work. In conversations, during the work or after a choreography is concluded, many of these performers vented with me or with others, that one of the biggest difficulties was the feeling of moving in a dark and unknown space – they had trouble naming this “dancing”, they lost reference about the ground of this dance. The concatenation of this speech was received with uneasiness and consequently generated worries, how and where would all this lead them?

This way of working demands great availability. The initial ground is the idea of choreographic research that comes up with a pattern of movement. From this step, a network process starts – the idea amplifies, the initial movement pattern starts to get more precise within the space, spatial drawings in displacement come up in  conversations and a musical ambience is configured. The choreography moves forward, in spite of feelings that deal with loss, gains, advances and withdrawals. These partners, performer-creators, made their mark in Musicanoar with acts of extreme generosity with the purpose of creating other worlds, filled with meaning, in an environment in which nothing is previously configured.

Since 1993, Raul Rachou set foot in Musicanoar and, gradually, his long legs contaminated my walk with Musicanoar. He is my great scene partner. Without  premeditation, simply  a mutual, continuous construction of a huge walk. Although Raul had, in the course of his life, gone through many dance classes, it was from 1990 on that he launched in a profound and systemized dedication of his body development.

In 1999, I decided that my next work would involve the participation of few performers. This choice arose from my need to examine the body more deeply, what happens when we provoke other movement patterns, I could have chosen the direction of a choreographic solo, however, I like to share the scene with someone. In that case, I asked Raul if he agreed that the next venture would be just him and me. Together, we decided to go beyond, deeper in the search of other understandings of the body that deal with creation and investigation of the contemporary scene in dance.

The time I spent with Raul increased my understanding about the role of the performer-creator. In fact, creating the shows, in the beginning of the time I spent in the Communication and Semiotics Program, I thought that a mixture of references could be enough for the contemporary conduct. Nowadays, it has become more than clear that it is not enough to mix and remain in the level of countless collages. Dance critic Laurence Louppe tells us about the idea of hybridization: “Mixture evokes an idea of universality that is in tune with the type of cultural opening offered by international thought currents and their ideas of otherness, group identity and inter-group dialogue. Opposing all that, is the hybrid. This hybrid is not situated anywhere, it is nothing. Often, it is totally isolated and atypical, the result is a unique and accidental combination. Hybridization works more on the side of loss. Hybridization acts more in the nucleation of genes, subverting and dislocating.” (2000: L. Dança2).

Other day, talking to Raul and Cleide Martins, our improvisation advisor, we questioned ourselves about what is it about our partnership that collaborates in this configuration of two as optimal working conditions, driven towards producing investigating and scene thought? I raised the following hypothesis: the need to occupy. In this way, my eyes deal with composition. I seek to decipher, in relation to a thought that is released into the open, possibilities of diverse occupations in the environment that deal with different levels of creation. In this case, I speak of vectors, displacements, acceleration, productions of other patterns of movement and drawings in space, for example. It is as if I were creating an entire geography in this place with its countless reliefs and pointing to the needs of those diverse relations.

Raul has the hands of a surgeon. The moment I propose to investigate the movement patterns of the body, his dive generates a deep obsession of self-investigation in relation to all that starts to populate our thoughts. Such rigidity contaminates all his scene actions. He releases interactions in this environment, in which a whole exploratory work with his own body illuminates the needs of my solicitations, releasing a poetic and philosophical aspect. During the time I worked together with this partner of mine, his dedication to teaching the technique of the “Pilates” method sharpened his understanding of the human body. Nowadays, he teaches me subtleties in that level of physical availability, in a path filled with differences. Every time I propose a line, the first ignition is the need of a great dive into experimentation.  The conversation between words comes up later. We realized that, even for my strangest solicitation as a choreographer, the formulation of any doubts will become more precise after different experimentation and elaborations in this time consuming creative process.

As Musicanoar advances in its projects, trough the years, we have inserted ourselves in representative movements of dance professionals that offer different strategies of working together in the city of São Paulo. If we, as artists, do not get involved and elaborate other collective organization strategies of organization and conduct that answers our needs, who will do it? In our case, one example is to fight for public subventions and laws that ensure the subsistence and maintenance of different groups in creation, circulation and production projects.

During these 16 years, many dance movements were created, dismantled, merged in different ways, demanding conversations and strategies for permanence from their members in the contemporary dance reality. This is not the place to talk about them, however, there is one common aspect to them all – each one of these groups and artists deal with an investigating production and language research in the contemporary act. I understand that Núcleo de criação do Dirceu is also connected to these reflections. To expand ways of organization in order to generate a compromise of the government for the elaboration of Culture Public Policy in a more efficient way and more appropriate to our contemporary needs.

It is important to clarify that the contemporary term is not associated here with a dance technique or style. The contemporary term translates an investigating action in relation to our choreographic proposals that happen trough thinking and the singular way in which each group or choreographer builds their shows. The shows that are generated by those different creators are never finished products, I mean, the public presentations are opportunities for them to test their investigations. Since these creators seek inventions with other constructing ways, usually, their shows work as laboratory protocols, resulting from research directed to scene language.

Espetáculo Vapor / Foto divulgação

Espetáculo Vapor / Foto divulgação

All knowledge is a form of vital education. We live because we know. For that reason, we understand that art is a co-evolutionary mechanism in which aesthetics is part of a concrete reality. Nature is also aesthetics. Aesthetics is dealing with efficiency and, not by chance, things need to adapt in order to survive. The pertinence of art acts in relation to a need to expand a given reality to remain (or to survive), to know and to build, in a same time scale, other possibilities of thinking about organization processes.
“Centro de Criação do Dirceu” was created in august 2005 by the government of Teresina, in response to persistent demands from the community of “Grande Dirceu”, the most populated district of Teresina. This action answers the urgency brought out by the inhabitant of the district. This is an official initiative with many possibilities for success, since it is shared and supported by a community that wishes to investigate art. This enterprise has been mobilizing and reshaping the public space as a space for discussion, exchange, transit, interaction, research, bringing together artists from different places in Brazil and abroad to foment the thought of an aesthetic act in a contemporary direction.

In the premiere of “Mapas do Corpo”, Núcleo de Criação do Dirceu was competent in articulating distant regions, proving that distance is not an obstacle to geting in touch. Any expansion of thinking other ways of organizing depends on imagination, inventiveness and courage to break routine and try paths that were not tried before. In Dirceu there was a beautiful encounter. If the way of articulating a dance thought was completely different from what Musicanoar believes, certainly the speech would have vanished in the wind. However, in Teresina, we realized that, although each of artists resolved their issues in the scene in different ways, they were discussing the same concepts. In other words, depending on our hability as contemporary artists to live with risks and to accept responsibility for the consequences: mutual care and help.

In Dirceu, creativity is not available for an assembly line, but rather for actions that are activated in the collectiveness, thoughts that cross each other and stimulate encounters that reinforce other forms of thinking organization. With the projects Grupos Residentes (Resident Groups), Núcleo de Criação do Dirceu and the workshops offered to the NDC and to the community, Mapas do Corpo (Maps of the Body), Projeto Instantâneo (Instantaneous Project), shows and seminars, Marcelo Evelin and his partners have raised Teresina to the level of reference place in the construction of new ways of thinking and sharing contemporary art.

We cannot admit an understanding of contemporary dance that is borderline in meaning, daydreams of people with no practical sense or even something superfluous. As astro-physicist Jorge Albuquerque says, “Dance is the manifestation of complexity and evolution, it is a reflection of elevated values that humankind has been trying to experience. Thus, it is an attempt to make elevated forms of survival effective, forms that, as we all know, are pretty inaccessible to most human beings, but potential in all of them.”

We circulate in a temporal speech. Traces of praxis that is built at every instant. We experience action in real time. Thus, norms and forms confront each other. In our case, we walk paths that invest in other types of autonomy in dance. We perceive ourselves as activist artists that, under different ways of organizing dance, view co-adaptive actions in an emerging reality, of an urgent character. Professor and geographer Milton Santos reminds us: “Some people would rather say that time unifies, but that is not it. What really happens, in our days is the possibility of knowing instantly about remote events and, in this way, the possibility of perceiving their simultaneity. The event is a corporeal manifestation of historic time, something as if the so-called arrow of time pointed and landed in a given point of the surface of the earth, populating it with a new happening. When, in the same instant, another point is hit and we can get to know the happening that placed  itself there, we witness a convergence of moments.” (2008:196)

It was a privilege to temporarily inhabit the Dirceu world, a space blooming with experience as existence. As the waters of the rivers Poti and Parnaíba reminds us – a long process of encounters that flow into a great ocean.

Helena Bastos is a dancer, choregrapher, professor at University of São Paulo and researcher.

References:
GREINER, Christine (2005). O Corpo. Pistas Para Estudos Indisciplinares. São Paulo: Annablume.

KATZ, H.(1994). Um, Dois, Três: A Dança é pensamento do Corpo. FID: Belo Horizonte

SANTOS, Milton (2008). A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4ªed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo.

VIEIRA, Jorge de Albuquerque (2006). Teoria do Conhecimento e Arte – Formas de conhecimento – arte e ciência numa visão a partir da complexidade. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora.