Festival de Dança de Teresopolis / Foto: Divulgação

Dançando depois da chuva

Como é a dança no interior do Estado do Rio de Janeiro? Qual é a produção artística em municípios como Paraty e Teresópolis? E o ensino? Para responder a essas questões, o idança, com apoio da Secretaria de Estado de Cultura (SEC), fez um levantamento nos quatro cantos do Estado, buscando entender melhor o que acontece fora da capital. A colaboradora Clarissa Vasconcellos entrou em contato com secretarias municipais de cultura, Ongs e artistas locais e traz para nós um raio-X da dança fluminense. Abaixo, segue o segundo texto. Aproveite a leitura!

Como ficou a situação da dança na Região Serrana do Rio depois da tragédia de janeiro

A ideia era levantar o astral da cidade depois da maior catástrofe natural da história do país. Portanto, Petrópolis, uma das localidades afetadas pelas chuvas de janeiro – junto com Nova Friburgo, Sumidouro, Areal, São José do Rio Preto e Teresópolis – não dispensou as comemorações de seus 168 anos em março, mesmo apenas dois meses depois da tragédia. Entre as atrações gratuitas do evento, lá estavam representantes da dança fluminense, mais especificamente o balé do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, que se apresentou junto com a orquestra no Parque de Exposições de Itaipava. Uma forma de homenagear as vítimas.

A Cidade Imperial, como também é conhecida, é um famoso reduto de profissionais da dança no Estado do Rio (assim como Teresópolis e Nova Friburgo), com dezenas de academias, companhias amadoras e festivais. Petrópolis não teve seu centro histórico atingido e nem sofreu muitos danos em seu patrimônio cultural, conforme afirma o músico e compositor Marco Aureh, responsável de Gestão Pública da Secretaria de Turismo. Mas nem por isso deixou de se envolver em projetos como o Abrace a Serra, uma iniciativa de empresários em parceria com a Prefeitura Municipal, cuja renda foi destinada a ajudar aos desabrigados.

Antes mesmo da catástrofe, Petrópolis já contava com programas vitoriosos para levar cultura aos menos assistidos, como o Ciranda das Artes. “As aulas são realizadas em alguns quarteirões localizados na periferia da cidade”, explica Aureh. Mantido pela Fundação de Cultura e Turismo de Petrópolis, o projeto promove aulas de iniciação ao balé clássico, jazz, dança do ventre, dança de salão e hip hop.

Entre as principais escolas de dança petropolitanas, estão a de Analu Muniz, o Ballet Heloisa Shanuel, o Rotima Ballet, a Escola de Dança Aline Calile, o Bauerngrupe Danças Folclóricas de Petrópolis, o Centro de Artes e Dança (de Alessandra Zappala) e o Ballet Jane Ferraudy. Existem também companhias semiprofissionais como a Novart, o Grupo de Dança Hip Boi, a Companhia Alan Keuppert e a Corpo em Cena Cia. de Dança-Teatro.

“A retomada de uma mostra anual, produzida pela gestão pública de caráter estadual e nacional, é uma das metas da dança na cidade”, detalha Aureh, que lembra que a criação de uma escola de formação profissional de bailarinos também é um dos pontos de pauta entre os projetos da Fundação de Cultura e Turismo.

Nova Friburgo: danos materiais e mostra adiada

As chuvas em Petrópolis pouparam espaços como o Theatro D. Pedro, o SESC Quitandinha e os teatros Afonso Arinos e Santa Cecília, que costumam dedicar seus palcos para apresentações. Mas infelizmente o mesmo não se pode dizer de Nova Friburgo. Além das perdas humanas e materiais, os friburguenses tiveram uma grande parte de seu patrimônio histórico e cultural destruído.

Não foi diferente em relação a academias e escolas de dança. Iane Rocha, dona da Studio 3, teve prejuízos com infiltrações e no vestiário, mas conta que “o pior mesmo foi a perda de pessoas e alunos”, mortos na tragédia.

Iane organizou em 2010 sua primeira mostra de dança, mas a segunda edição, prevista para maio de 2011, não pôde ser realizada porque o Teatro Municipal da cidade ainda estava interditado para apresentações. “Possivelmente será em setembro”, torce.

Iane afirma que se pudesse sugerir um evento para levantar o astral e ajudar aos desempregados seria um espetáculo itinerante pelas cidades atingidas e adjacências “que ainda estão muito danificadas”. “Uma só apresentação realizada gera conforto, alegria e descontração. Mas não é suficiente”, justifica, reforçando a ideia de fazer várias delas.

Apesar das dificuldades, a cidade conseguiu realizar seu 21º Encontro de Dança, coincidindo com o Festival de Inverno SESC (também presente em Petrópolis e Teresópolis). E escolas como a de balé de Bibiana de Sá, o grupo de Cosme Silva e a de dança de salão de Ricardo Costa fazem o show continuar. “Grupos oficiais ainda não temos”, explica Iane, que, no entanto, revelou que sua companhia jovem e infantil viaja para “quatro ou cinco” festivais por ano.

Outra iniciativa a destacar é a Oficina Escola de Artes de Nova Friburgo, mantida pela prefeitura friburguense através de sua Secretaria Municipal de Cultura. São mais de 2.000 jovens, a maioria estudantes do ensino público, que têm aulas de diversos tipo de arte, incluindo a dança. Porém, para Iane, “faltam projetos sociais que envolvam a dança”.

Ela revela que a Prefeitura já apoiou mais essa área, como na época em que sua escola se apresentava na praça. “Quando muda o partido, mudam os interesses. Temos um problema de falta de continuidade”, lamenta, dando o exemplo da Oficina Escola, que hoje tem cerca de “um terço” dos alunos que tinha quando começou. “É muito difícil. Tudo o que nós queremos é apenas promover a dança”, conclui.

Teresópolis: crise política atrasa projetos

No caso de Teresópolis, além dos baques sofridos pela tragédia, atualmente a crise política da cidade também respingou no mundo da dança. O troca-troca de prefeitos, motivado pelas acusações de desvio de dinheiro para a reconstrução do município, vem atrasando a realização dos planos.

“A cultura é sempre vista como algo supérfluo”, lamenta Simone Chacon, dona da escola que leva seu nome. “Os problemas políticos estão afetando bastante todos os eventos de Teresópolis, mas seguimos tentando resgatar o título de Cidade dos Festivais”, detalha.

Ela acredita que, apesar de a verba destinada ser “pouca”, “não há má vontade” do Governo. “Grande parte tem mesmo que ir para educação e saúde, mas agora temos a esperança de melhorar nossa situação”, afirma, detalhando que estão sendo criados um plano e um fundo de cultura. “Os eventos culturais são interessantes para atrair o turista”, aposta, com esperança em ver a situação mudar.

Um dos exemplos para estimular o reerguimento da cidade é o Festival Nacional de Dança de Teresópolis, que existe há 11 anos e começou no dia 30 de setembro. Além da mostra competitiva, o evento também contará com palestras e fóruns sobre temas como ecoturismo e economia criativa. “O festival acontece anualmente, sempre com apoio da Prefeitura, e não pode deixar de ser realizado neste momento, em que a região serrana está reaquecendo sua economia e ainda sofre com a falta de turistas”, conta. Simone, uma das organizadoras, afirma que pensa em convidar habitantes das comunidades mais afetadas para o festival, como forma de “levantar o astral da cidade”.

A bailarina relata que “diferentemente de Nova Friburgo, nossas escolas e prédios principais não sofreram danos”, mas que “alguns bairros distantes tiveram perdas”. E destaca: “se antes a situação da dança nas áreas rurais já era complicada, agora está pior”.

Apesar disso, Teresópolis é uma referência no meio por ter criado uma Escola Municipal de Dança, com o objetivo de fomentar a inclusão social. Simone lembra que os alunos recebem ajuda integral para se profissionalizar. Também sublinha o trabalho da delegação do Sindicato dos Profissionais de Dança do Rio de Janeiro no município e a atuação de escolas como a de Natália Gonçalves, o Balé da Casa de Portugal e o Ballet Pro Arte. Os palcos para apresentações costumam ser o do Teatro SESC e o do Espaço Cultural Higino, onde será realizado o Festival. “É o nosso Palácio Quitandinha”, compara Simone, em referência a uma das maiores atrações turísticas de Petrópolis.

Clarissa Vasconcellos é jornalista, formada e pós-graduada na Uerj, com especialização em Jornalismo Internacional na Espanha.

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