Dez dicas para dar um bom nome ao seu espetáculo | Ten tips for a good show title

Diante da oficialização do acordo ortográfico e da escassez de bons nomes de espetáculos na cena contemporânea brasileira, achei que seria uma boa oportunidade para pensar em como são elaborados e grafados os títulos de nossas peças. Com essa preocupação, procurei esboçar algumas orientações simples, mas que, acredito, podem ajudar bastante na hora de escolher. Essas dicas não servem apenas para espetáculos, mas também podem ser adaptadas a performances, intervenções, instalações, além de congressos, encontros, mostras e festivais. Veja:

1. Evite títulos cheios de pontos, parênteses, hífens, colchetes, ou coisas desse tipo. Não pode: (In)body, Ex.pe.ri.men.to, Corp[o]rea[l] etc. Não é genial, não agrada o público, não melhora o trabalho e complica a vida do pobre jornalista que redige a coitada da agenda cultural. Também não é indicado mesclar indiscriminadamente caixa alta e baixa (por exemplo, eXpeRiMenTO iNcorpÓreO), ou ainda utilizar qualquer sinal gráfico que não seja letra, pontuação ou acento.

2. Não use a palavra “corpo”, que está para nome de espetáculo assim comoatualmente” para início de redação de vestibular. Se fizer muita falta, pode substituir por “porco”, o que tornará o seu produto cultural mais atraente a qualquer público que se deseje atingir.

3. Nomes em inglês devem ser igualmente evitados. Se for muito necessário, traduza, ou mescle inglês e outros idiomas. O melhor mesmo é português. Se quiser que a sua peça tenha abrangência internacional, lembre-se de que hoje um nome italiano ou espanhol é visto com muito mais simpatia. Se tiver algum caráter étnico, procure usar iorubá ou bantu.

4. O nome não precisa explicar ou sintetizar o que a pessoa vai assistir. O nome já faz parte da peça e, quase sempre, é bem mais importante. Tudo depende dele. É a primeira coisa que o espectador vê, e em muitos casos, a única da qual se lembra depois.

5. Evite referências aos recentes avanços tecnológicos. A não ser em casos muito específicos, não devem constar na nomenclatura (e de preferência nem no trabalho) termos como “digitais”, “virtuais”, “midiáticos”, “holográficos” – principalmente se estiverem no plural. Aliás, o plural deve sempre ser usado com bastante parcimônia.

6. Não empregue, exceto por ironia, palavras reconhecidamente de uso poético, tais como: “tempestade”, “etéreo”, “olhar”, “doce”, “eflúveo”, “translúcido”, “fogueira”, “crepitar”, “sinuoso”, “sutil” etc.

7. Alguma gracinha pode ser bem-vinda, desde que seja boa.

8. Não são recomendáveis referências a tempo e espaço, qualquer relação entre os dois, qualquer relação entre os dois e qualquer outra coisa. Não pode: Espaços expandidos, Tempos coe(x)istentes, (Não)-lugares ex(p)andidos, E(x)pa(ss)os-Temp(os), e por aí vai. Substantivos comoterritório”, assim como outros que remetem a essa ideia (por exemplo, “mapa”, “trajetória”, “trajeto”), ainda serão aceitos nos próximos dois ou três anos. Porém, se não quiser ter o trabalho de mudar o nome de seu espetáculo brevemente, evite-os desde agora. Nunca se sabe por quanto tempo será preciso apresentar a mesma peça.

9. Ao usar um título muito longo, procure imaginar como o seu trabalho será chamado no dia-a-dia. Digamos que você, com muito esforço, chega a um nome de que gosta, por exemplo, Corpo frito em berço de rúcula com pirão de baiacu. Considere que, na prática, seu espetáculo será chamado de Corpo – termo que, como já vimos, deve ser evitado.

10. Se não for possível encontrar um nome que agrade até a hora de escrever o release para imprensa, um recurso interessante é escolher aleatoriamente uma frase de algum livro do Bukowski. Outra coisa que pode funcionar é abrir ao acaso livros de arqueologia, engenharia elétrica, mecânica de automóveis etc. Se não souber manusear ou não dispuser de livros, é possível usar “bukowski”, “engenharia”, “automóveis” como termos de pesquisa no Google[1].

No mais, é importante dizer que a escolha do título é tão importante quanto ensaiar, produzir, apresentar. Um bom título não favorece apenas o seu trabalho, mas também ajuda a embelezar os roteiros culturais de nosso país. Portanto, escolha com responsabilidade.

[1] Eu mesmo fiz a experiência, pesquisando esses termos em conjunto. Cheguei a excelentes resultados logo nas primeiras páginas. Alguns exemplos: “Uma tecnologia barata e limpa”, “Charles em falta”, “Bukowski estava errado: lavo louça”, “Coquetel”, “A arte da enganação em termos técnicos”, “O João Gilberto aquele filho da puta”, “Várias coisas que não sei fazer na vida”, “La maquina de follar (106 views)”.

Given the institutionalization of the Portuguese language ortographic agreement and the scarcity of good names for shows in the Brazilian contemporary scene, I thought it would a good opportunity to think about how the titles of our pieces are elaborated and spelled. With that in mind, I tried to outline some orientations that are simple, but I believe can help a lot when it comes to choosing a name. These tips are good not only for shows, but can also be adapted for performances, interventions, installations, besides congress, meetings, showcases and festivals. Check it out:

1. Avoid titles filled with dots, parenthesis, hyphens, brackets, or anything of the kind. Not good: (In)body, Ex.pe.ri.men.to, Corp[o]rea[l], etc. It´s not brilliant, it doesn´t please the audience, it doesn´t improve the work and it complicates the life of the poor journalist who edits the pitiful cultural guide. It´s also not recommended to mix small and capital letters at random (for example eXpeRiMenTO, iNcorpÓreO) or to use any graphic sign that is not a letter, punctuation sign or accents.

2. Do not use the word “corpo” (body in Portuguese), which used for a show titles is just like “nowadays” used in the beginning of an essay in exams for getting into a University. If you really cannot live without it, you should replace it with “porco” (pig in Portuguese), which will make your cultural product a lot more attractive to any audience you wish to reach.

3. Titles in English should also be avoided. If it´s really necessary, translate it or mix English with other languages. But Portuguese is really best. In case you want your pieced to have international reach, remember that Italian or Spanish are seen with a lot more sympathy. If there is any ethnical quality, try to use Ioruba or Bantu.

4. The title doesn´t have to explain or sum up what the person is going to watch. The title is already part of the play and most often it´s a lot more important. Everything depends on it. It´s the first thing the spectator sees and in many cases the last thing he´ll remember afterwards.

5. Avoid references to recent technological developments. Unless in very specific cases the following should not appear in the name (and not even in the piece): digital, virtual, media, holographic – especially if they are used in plural. By the way, plural should be used with parsimony.

6. Except in cases of irony, don´t use words that are recognized for their poetic use, such as: “tempest”, “ethereal”, “glance”, “sweet”, “translucent”, “bonfire”, “crepitate”, “winding”, “subtle”, etc.

7. Any joke may be welcome, as long as it´s a good one.

8. References to time and space are not advisable, neither is any relation between the two and anything else. Not good: Espaços expandidos, Tempos coe(x)istentes, (Não)-lugares ex(p)andidos, E(x)pa(ss)os-Temp(os) and so on. Nouns like territory, as well as others that refer to that idea (for example, map, trajectory, path), are still going be accepted within the next two or three years. However, if you don´t want to change your show’s name soon, you should already avoid them. You never know for how you´ll have to perform the same piece.

9. When using a long title, try to imagine how your work is going called daily. Let´s say you find a name you like after much effort, like, for instance, Corpo frito em berço de rúcula com pirão de baiacu. Take it as a given that your piece is actually going to be called Corpo – a term that should be avoided, as we´ve seen before.

10. If it´s not possible to find a name that pleases you by time you have to send out releases to the press, an interesting resource is to randomly choose some sentence out of some “Bukowski” book. Another thing that might work is to open archeology, electric engineering or automobile mechanic books at random. If you don´t know how to handle or don´t have access to books, it´s possible to use the terms “bukowski”, engineering, automobile in a Google[1] search.

Finally, it´s important to say that the title choice is as important as rehearsing, producing, performing. A good title doesn´t favor only your work, but also helps make our country´s cultural guides prettier. Therefore, choose responsibly.

[1] I did this experience myself, searching these terms together. I reached some excellent results right in the first pages. Some examples: “Clean and cheap technology”, “No more Charles”, “Bukowski was wrong: I do the dishes”, “Cocktail”, “The art of conning using technical terms”, “João Gilberto that son of a bitch”, “Many things I don´t know how to do in life”, “La maquina de follar (106 views)”