Impressões Latentes|Latent impressions
“Teoria e prática não se separam, seja na dança de um corpo ou na crítica que reflete sobre ele. Ambos são de natureza intelectual e performática ao mesmo tempo” (Paulo Paixão)
Tentar refletir sobre um evento é realizar um exercício de articulação das impressões que permanecem latentes em relação àquilo do que se deu a ver. Por certo, as impressões são diversas e, antes disso se configurar como um problema, possibilita um campo fértil para o debate, aberto a contribuir para o alargamento e revisão das inúmeras questões que permeiam o fazer-pensar a dança.
A 5º edição do Conexão Sul ocorreu pela segunda vez na cidade de Curitiba entre os dias 22 e 25 de novembro deste ano. Seguindo a premissa das edições anteriores, as atividades se mantiveram concentradas, sem programações simultâneas, o que favoreceu enormemente o estreitamento das relações entre os participantes. As mesas, apresentações artísticas, debates e oficinas tiveram como foco de discussão os “caminhos e processos de pesquisa em dança”. Assunto tão presente como gerador de polêmicas e divergências (salutares e profícuas) em eventos desta natureza.
A escolha dos artistas e pesquisadores convidados foi feita pelos articuladores estaduais Mônica Infante, Rosemeri Rocha, Cinthia Kunifas e Marila Velloso no Paraná, Sandra Meyer, Vera Torres e Jussara Xavier em Santa Catarina e Heloisa Gravina, Marco Fillipin, Tatiana da Rosa e Cibele Sastre no Rio Grande do Sul. Estas escolhas se referem à parte da produção em dança destes estados. Não sei se por coincidência ou por deliberação, se fez presente nas produções uma grande similaridade regional, principalmente nas obras vindas de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. De qualquer modo, este fato nos leva a refletir o quanto e de que maneira tradições, modelos e referenciais contaminam os processos criativos e como lidamos com estas qualidades informativas.
Muito embora algumas obras ainda se mostrassem atreladas a modelos pré-estabelecidos, deixando frágeis as questões apresentadas, as experiências evidenciaram uma grande diversidade no entendimento do que seja fazer dança contemporânea, quer seja nos procedimentos adotados ou na articulação das questões formuladas, como no modo de testá-las no corpo e na elaboração de uma dramaturgia.
Trabalhos como Attraverso de Gladis Tridapalli, Ob-gestos da PIP Cia de Dança e Hipo-teses de Volmir Cordeiro, Marcos Klann, Manoela Rangel e Cleístenes Groot deixaram claro que o processo de pesquisa em dança é um trabalho de práticas entrelaçadas, que se dão num continum espaço-temporal que transpõe a obra e se estabelece como mote propulsor do artista.
Outros momentos de intensa troca foram os debates após as apresentações, que trouxeram reflexões e indagações mais que pertinentes e, por isso mesmo, merecia uma maior duração, por mais que elas se distendessem em conversas futuras em outros espaços. Questões referentes ao processo criativo como: dramaturgia, relação com outras linguagens, coreografia, criação colaborativa, entre outras tantas, ganharam corpo entre os presentes. Do mesmo modo, a mesa de pesquisa em dança, proporcionou espaço para o alargamento e a revisão de conceitos, contribuindo com a tarefa, ainda muito necessária, de romper com estruturas deterministas e dualistas, que emergem em diversos discursos referentes ao corpo, a pesquisa e a dança.
O Conexão Sul, ao reunir parcela da comunidade da dança não só da Região Sul, mas também convidados de outras localidades (neste ano foram convidados: Joubert Arrais – CE, Simone Avancini – SP, Ítala Clay – AM, Tuca Pinheiro – MG e Eva Schul – RS) cria um espaço continuado propício à disseminação de idéias e propostas, de partilha da informação, favorecendo a discussão e o diálogo com a diversidade, fortalecendo a atuação política dos artistas da dança e sua efetiva inserção no tecido social.
A proposta inicial permanece presente e ganha força a cada novo encontro, no entanto, é importante a manutenção constante de espaços para abarcar novas demandas e questões que emergem nos ambientes e, para não se restringir tão somente a conversas entre artistas, faz-se necessário a criação de estratégias que aproximem ainda mais o público do evento, de modo a torná-lo mais familiarizado com questões relacionadas à produção artística contemporânea, cumprindo assim papel de produtor e difusor de conhecimento em dança.
Afinal, como salienta a pesquisadora Fabiana Britto os eventos de dança, são mecanismos eficientes na promoção do confronto crítico entre idéias diversas e que, ao congregar, num espaço de tempo e lugar, produções geograficamente dispersas, “atualiza referências, mobiliza reflexão crítica, desafia hábitos de pensamento. Mas acima de tudo, cria demanda – apontam novas perspectivas de investigação.” (Britto 2004)[i]
[i] BRITTO, Fabiana. Dança e política: Uma questão de tempo. In: NORA, Sigrid (org.). Húmus1, Caxias do Sul, 2004. p. 73-78
Theory and practice aren’t apart, be it in the dance of a body or in the critic that reflects about it. Both are, at the same time, of intellectual and performatic nature” (Paulo Paixão)
To try to reflect upon an event is to make an exercise of articulation of the impressions that remain latent in relation to that which has rendered itself visible. For sure, the impressions are diverse and, before that becomes a problem, it makes possible a fertile field for an open debate contributing this way to the enlargement and revision of the numberless questions that permeate the making and thinking of dance.
The 5th edition of Conexão Sul (South Connection) took place for the second time in the city of Curitiba between the days of November 22nd and 25th this year. Following the premise of the previous editions, the activities were concentrated, without any simultaneous programming, what has favored enormously the narrowing of the relationships among the participants. The panels, artistic presentations, debates and workshops had as discussion focus the “ways and processes of research in dance”. A very present subject, as generator of polemics ad divergences (healthy and useful ones) in events of this nature.
The choice of the invited artists and researchers was made by the state-based articulators Mônica Infante, Rosemeri Rocha, Cinthia Kunifas and Marila Velloso in Paraná, Sandra Meyer, Vera Torres and Jussara Xavier in Santa Catarina and Heloisa Gravina, Marco Fillipin, Tatiana da Rosa and Cibele Sastre in Rio Grande do Sul. These choices refer to the part of the production in dance in these states. I don’t know if by coincidence or deliberation a big regional similarity makes itself present, mainly in the works coming from Santa Catarina and Rio Grande do Sul. Any way, this fact makes reflect how much and in which ways traditions, models and references contaminate the creative processes and how we deal with these informative qualities.
Although some works still showed a connection to pre-established models, rendering fragile the presented questions, the experiences put into evidence a great diversity of understanding what making contemporary dance might mean, be it in the adopted proceedings or in the enounced articulation of the questions, as in the way of testing them in the body and in the elaboration of a dramaturgy.
Works as Attraverso (Across) by Gladis Tridapalli, Ob-gestos (Ob-gestures) by PIP Cia de Dança and Hipo-teses (Hypo-thesis) by Volmir Cordeiro, Marcos Klann, Manoela Rangel and Cleístenes Groot made it clear that the dance research process is a work of interlaced practices which happen in a space-time continuum that transposes the work and establishes itself as the propelling motto of the artist.
Other moments of intense exchange were the debates after the presentations, what brought up reflections and questionings more than pertinent and, really because of that, deserved a bigger duration, although having been distended in future conversations into other spaces. Questions referring to the creative process as: dramaturgy, relationship with other artistic languages, choreography, collaborative creation, among so many others, took form among the present people. In the same way, the panel on research in dance has provided space for the enlargement and the revision of concepts, contributing with the task, still very necessary, of breaking through determinist and dualistic structures, which emerge in different speeches referring to body, research and dance.
Conexão Sul, when gathering parcel of the dance community not only from the South Region, but also guests from other localities (this year the guests were Joubert Arrais – CE, Simone Avancini – SP, Ítala Clay – AM, Tuca Pinheiro – MG and Eva Schul – RS), creates a continued space favorable to the dissemination of ideas and proposals, of sharing of information, promoting the discussion and the dialogue with the diversity, fortifying the political engagement of the dance artists and their effective insertion in the social tissue.
The initial proposal remains present and gains force at every new meeting. Nevertheless, it’s important the constant maintenance of spaces to host new demands and questions that emerge in the ambiences and, in order not to get restricted solely to the conversations between artists, it’s necessary the creation of strategies that cause the public of the event to approach even more, in such a way that render it more familiar with questions related to the contemporary artistic production, fulfilling this way the role of producer and diffuser of knowledge in dance.
After all, as underlines the researcher Fabiana Britto, the dance events, are efficient mechanisms in the promotion of the critical confrontation between diverse ideas and that, when it congregates, in space and time, geographically dispersed productions, it “updates references, mobilizes critical reflection, challenges thinking habits. But more than anything else, it creates demand – it points to new perspectives of investigation.”( Britto 2004)[i].
[i] BRITTO, Fabiana. Dança e política: Uma questão de tempo. (Dance and politics: a matter of time) In: NORA, Sigrid (org.). Húmus1, Caxias do Sul, 2004. p. 73-78