Intervenções pelas ruas de São Paulo

Foi um mês de encontros, trocas de experiências e reflexões. Agora é hora de mostrar o resultado do trabalho que reuniu 16 jovens artistas em São Paulo para o 1º Entorno – Encontro Latino-Americano de Dança Contemporânea, projeto de residências artísticas realizado numa parceria entre o Núcleo Corpo Rastreado e a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo.

Divididos entre três espaços – Galeria Olido, Centro Cultural São Paulo (CCSP) e Centro Cultural da Juventude – eles pensaram (e agora apresentam) formas de interação entre artista, espaço público e seus frequentadores. Além das residências, o programa promoveu palestras abertas ao público com convidados relacionados ao tema. Todo o processo teve assistência do artista plástico Maurício Leonard e de Wagner Schwartz.

Esta última fase do projeto vai durar quatro dias – ela começou hoje e vai até sábado (18 a 21/08), com 16 intervenções. Durante todo o período de ações, haverá exibição de vídeos simultânea nos três espaços citados acima. O encerramento do encontro acontece na Galeria Olido, domingo (22/08), quando haverá um balanço final com a pesquisadora Christine Greiner.

Abaixo, siga os caminhos do Entorno, com textos de apresentação escritos pelos próprios artistas. E na página do idança no facebook confira a galeria de fotos produzidas pelos participantes.


quinta-feira (19/08)

11h – Grietas (Marisol Cordero)
Viaduto Santa Efigênia, perto do metrô São Bento (Olido)
Pasos extranjeros que se situaron en lo conocido: un puente. Lugar que forma parte de paisaje recorrido y habitual. Recorrí sus fisuras y las vinculé con las cicatrices de mi ciudad. Las grietas son cicatrices de una estructura, así como lo son de un cuerpo. Las fisuras son espacios de inconexión, de quiebre temporal la fractura los deseos y encuentros.

12h – Trilha para hormigas (Ema Letícia Falkin)
Avenida São João, próximo da Galeria Olido
Numa das experiências no entorno, uma senhora me contou que la Galeria Olido e o centro velho, apesar de serem lugares bem importantes e muito concorridos, não têm calçadas tão chiques como em la Av. Paulista. Ela disse: “O governo deveria fazer alguma coisa pra embelezar essa calçada”. Intenté agregar mais uma capa pra fazer visible la anterior, pra realçar ou ocultar alguma coisa que ali me chamou atenção. Eu me perdi. O centro é um mundo e milhões de submundos. É só ficar um tempo observando o entorno pra começar a ver o que não era visto até então. Pra me encontrar, fui criando uma trilha com rastros que pudera seguir na procura do caminho a casa. Nessa procura, ‘comencé’ a cobrir, revestir a calçada, pra criar espaços pra formigas, lugares existentes ‘mais’ não vistos.  Fazer um convite. Procurar o familiar, um lugar que possa ser habitado.

13h – Estudo em 30 metros: pequena coleção de gestos ordinários (Ana Pi)
Praça da República, em frente à Secretaria de Educação (Olido)
Na linha do comum, emerge uma questão: até que ponto o corpo de uma cidade é evidente?

15h30 – Número 40, na foto 1 (Ricardo Alvarenga)
Entorno Olido
Durante três semanas, experienciei a deriva como prática artística, partindo sempre da Galeria Olido, no centro de São Paulo. Num primeiro momento, uma ação de deixar-se ao fluxo, caminhando para conhecer e reconhecer espaços, suas especificidades, diversidades e possibilidades de afecção. Num segundo momento, à deriva variando os calçados, investigando tanto os estímulos  sensoriais como as relações de signo social. Estar de chinelo no Centro Cultural Banco do Brasil gera um deslocamento que não se dá nas ruas. Estar descalço em qualquer das situações a seguir é sempre estranho. Quase um despudor. Nojento e prazeroso. Experimentar um blazer na loja e comer num restaurante classe média geram tensões notáveis nos funcionários e clientes. Na ponte, parado, cogitaram a possibilidade de eu ser um suicida. Caminhando, fui abordado por um menino de rua que queria saber por que eu estava descalço. Experimentando sapatos de salto em diferentes lojas, potencializou-se outras reações, que variaram de vendedoras que quase me esconderam a outros e outras que, com simpatia, davam dicas de uso e argumentavam a venda do produto. Na rua, outro campo. O que faz um homem de barba e salto alto? Simples ações, complexas relações.

16h – Estudo acerca do Vale do Aiangabaú (Ibon Salvador)
partindo da Olido para o Vale do Anhangabaú
Vou todos os dias no vale de ‘Aiangabaú’ e fico sentado nas bancadas de mármore. Vou com minha ‘ropa’, caderno e caneta. Lá observo, escuto, cheiro e toco; às vezes escrevo e algumas vezes me levanto e danço. Volto a sentar. Caminho uma linha e sento lá na frente. Aprendo o português oralmente, nunca fui à academia e isso é por uma vontade de observar como se reorganizam em mim as línguas, se reorganizam ‘o’ se confundem. Desde os primeiros meses de minha vida em Portugal, degustei no palato e na língua como português e espanhol vinham a brincar. Para mim desde “los colores” até “as cores” há um mundo de vivencias, historias e texturas.

sexta-feira (20/08)

10h – Hominidae (Ricardo Alvarenga)
Praça da República, ao lado do prédio da Secretaria de Educação do Estado e da entrada do metrô
Na Praça da República, entre árvores e uma rica fauna humana, se instala uma nova composição na paisagem. Uma árvore tramada de fios brancos é habitada por um homem. Ele come frutas, ouve música, lê um livro. Não fala com ninguém, mas olha, percebe e pergunta. Se propõe a vivenciar a passagem do tempo e as possibilidades de atravessamentos: corpo, árvores, pessoas, políticas e espaços dilatados ao imaginário.

12h30 – Intervir (Silvana de Jesus Santos)
semáforo em frente à Olido
Observando o fenômeno que causa vários desastres no verão, a performance vem com intuito de refletir, juntamente com o público – neste caso os motoristas e pedestres -, sobre a problemática das enchentes. Eu moro na periferia de São Paulo, São Miguel Paulista, Zona Leste. E, dentro dessa comunidade eu sou uma pessoa da minoria, que conseguiu se inserir dentro da dança profissionalmente. Aos 13 anos, entrei num projeto e tive a felicidade de encontrar um professor que influenciou muito as minhas opiniões. Uma delas, a de não jogar lixo nas ruas porque eles entopem os bueiros, e não só nas nossas comunidades, como em outras, levavam a enchentes. Esse final de ano foi desesperador, houve muitas enchentes e deslizamentos de terra e ainda está acontecendo em outros lugares. Isso me preocupa muito, porque o verão está chegando e esse cenário poderá voltar. A minha comunidade agora está asfaltada, com tudo canalizado, só que estou observando que as ruas estão muito sujas. Como já existe probabilidade de ter enchentes por conta do rio, imagina com os nossos esgotos entupidos?

13h30 – 1 real por seu pensamento ou isso não é uma cena (Morena Nascimento)
nos entornos da Galeria Olido, próximo aos grupos de plaqueiros ou “homens-sanduíches” que vendem ouro.
Eu serei plaqueira por um dia, substituindo a propaganda por mensagens atípicas de ordem subjetiva, metafórica e não-comercial.

16h – Exhalo en los pies (Monica Vergara)
entorno da Olido (1º dia: esquina de Largo do Paissandu y Sao João, al frente de Olido / 2º dia: en la esquina de Sao Joao con San Bento)
Pasar de los pasos llenos vacíos sin pasar
El aroma silencioso marca el ritmo de la fuga
Los ojos brillan en la exalacion de los pies

17h30 – Árvores (Clarice Lima e convidados)
esquina da Avenida Ipiranga com Avenida São Luis (Olido)
Árvores é uma pesquisa sobre o desejo de permanência.

sábado (21/08)

10h – Canteiro de obras (Deca Madureira)
JR Espínola – guitarra – construção de trilha improvisada
Saída do metrô república (Olido)
“Quem ergue uma cidade?”
“O que constroi uma comunidade?”
“Quais elemento formam uma pessoa?”
Com elementos simples, como pandeiro, sombrinha de frevo e carrinho de mão, criar um canteiro de obras pensando na migração nordestina em São Paulo.

11h – O que os olhos não veem o coração sente (Ricardo Neves)
Largo Paissandu (Olido)
“Para onde você me levaria?
Posso confiar em você?”
Eu estarei no entorno de olho vendados, em meio aos pedestres, precisando de um ou mais guias que me conduzirão através de comandos vindos de um celular ou similar, de forma que minha locomoção e segurança fiquem dependentes destes comandos enviados pelo próprio público.

12h – Homo (Alexandre Magno)
Galeria Olido (escadaria da bilheteria para ruas do entorno)
Terça 3 de Agosto:
Saí de casa em direção à Galeria Olido; o meu ritmo de caminhar mudou em comparação aos dias normais. No número 542, uma moça abordou-me:
– Moço sabe onde fica o nº 570?
– Olha, se aqui é o nº 542 ali…
Mas, ali não estava o 570, sugeri que perguntasse no prédio aonde ficaria o 570.
Ela entrou e eu fui atrás, uma senhora nos disse:
– O nº 570 mudou se para a Lapa.
– Que pena. Vim de tão longe para pegar a minha carteira de trabalho, viagem em vão.
Atravessamos a rua, outra rua e ao passar a moça ficou à minha frente. Entendi que me esperava, alcancei-a e continuamos a conversar até o metro. Falou-me que vivia no bairro Francisco Mourato perto de Caeiras, ela disse que não conseguiria viver no centro de São Paulo, lá de onde o ar era puro e tinha animais.
Tinha feito uma viagem longa e não iria conseguir resolver a sua carteira de trabalho.
– De onde você é?
Perguntou. Chegamos ao metrô e disse-lhe:
– Escuta esta música.
Escutou dois fados:
– Você é romântico?
– Sou.
– Esta música é melosa.
Escutou outro fado:
– Esta fala da capital de Portugal. Entendi. “Lisboa, não sejas Francesa, tu és Portuguesa, tu és só para nós”.
Depois ela falou dos seus gostos musicais:
– Gosto de Elton John, Michael Jackson.
Toquei para ela, no MP3, durante 10 min, várias músicas da minha seleção.
– Tchau, tenho que ir, meu nome é Fabíola.
– Tchau, Alexandre.

15h – Carpe diem (Natália Vanessa Taborda Gimenez)
Cruce entre la Estación da Luz y el Parque da Luz
Salvar el día
Ir a dormir tranquila/o
Sentir el deseo
Jugar sobre la paradoja
Elegir cada segundo
Hablar con el espejo
Conocer la necesidad
Pensar en no pensar
Andar sobre una sola sombra
Pensar si será verdad

16h – Estudo acerca do Vale do Aiangabaú (Ibon Salvador)

18h – Pasaje, na foto 2 (Diana Salcedo)
Vitrine da Dança – Galeria Olido
(Datos “no exactos” logrados gracias a un casi-diario)
Día #2
Avenida São João. Segunda-feira. El centro de la ciudad con su flujo normal se presenta ante los ojos de esta visitante. Carros, pitos, ônibus, semáforos, sol, desconocidos que luego serán conocidos. Continúa por una calle perpendicular, casi escondida, a las 13:15:06 horas, llena de establecimientos, vendedores ambulantes, ruido, moradores de calle, comida, charla.
Día #12
Rua Dom José de Barros o “calle perpendicular, casi escondida, llena de establecimientos, vendedores ambulantes, ruido, moradores de calle, comida, charla”
Una mirada de 187.74° me permitió darme cuenta de la importancia de esta Rua al colocarme como un objeto de exhibición en la vitrine da dança en la Galería Olido desde las 10:00 hasta las 14:00 los martes y los jueves…
– querrá decir terça-feira e quinta-feira.
– Eso mismo.
Día #20, 21, 22
Un espacio intermedio.
Las calles se comunican, falam una con la otra. Un espacio, un pasaje se sitúa debajo de la galería. Eu había recorrido este camino una y otra vez, sin darme cuenta de él. Cada día un espacio se revela, por múltiples causas, entre ellas algunas burocráticas. Al final del día, cada recorrido, cada persona, cada paso se esfuma.
Otro día comienza y todos somos desconocidos de nuevo.

A programação completa está disponível aqui.