Capital à margem

Em abril deste ano o Centro Cultural Banco do Brasil promoveu, nas cidades do Rio de Janeiro e Brasília, o festival 4 Movimentos, dedicado à dança contemporânea. O evento trouxe em sua programação artistas internacionais (França, Bélgica e Espanha) e mais 16 atrações brasileiras que se apresentaram ao longo de quatro fins de semana. Dentre os convidados nacionais, um do Rio Grande do Sul, um da Bahia, dois de São Paulo e outros doze do Rio de Janeiro.

A programação do evento suscitou o questionamento de diversos artistas de Brasília sobre a ausência de espetáculos da cidade no Festival. Questão pertinente visto que pela segunda vez consecutiva isto ocorre em um evento de dança contemporânea realizado pelo CCBB na cidade. Ano passado, o festival Dança em Pauta também não continha nenhuma criação brasiliense.

A crítica não deve ser encarada como um simples “bairrismo”. O ponto principal não é simplesmente a ausência de um brasiliense em um evento da cidade, mas sim o entendimento sobre “difundir a dança contemporânea”, proposta do 4 Movimentos. Essa difusão deve passar pela consideração do contexto local e de suas necessidades, para poder preencher os espaços vazios. Parece faltar um olhar mais sensível nos eventos de dança realizados pelo CCBB na cidade.

A presença de artistas brasilienses nas mostras realizadas pelo Centro seria de grande contribuição para formação de público local. Não incluir as criações locais com o pretexto de que não são inéditas na cidade é um discurso muito frágil, pois o CCBB atrai uma platéia diferenciada dos que habitualmente freqüentam os teatros da cidade.

É preciso ressaltar que os eventos do Banco do Brasil em Brasília trazem uma grande contribuição para a divulgação das artes em geral, pela qualidade de sua programação e pelo preço acessível. Um evento de dança contemporânea realizado apenas com atrações de fora dá a impressão de que Brasília não tem uma produção artística própria e de qualidade. O que não é verdade. E esta situação reforça um discurso recorrente nas platéias brasileiras “de que só é bom o que vem de fora”, seja de fora do país ou da cidade.

Além disso, vale ressaltar que o evento também ocorreu no Rio de Janeiro, com praticamente a mesma pauta apresentada em Brasília. A inclusão de espetáculos brasilienses contribuiria de forma mais efetiva para a “democratização da cultura” ressaltada pelo Banco do Brasil como uma de suas diretrizes e supriria uma demanda dos artistas locais de conseguir circular com seus trabalhos em outros estados.

Outro questionamento sobre a realização do evento 4 Movimentos é referente à iniciativa de promover apresentações de dança em espaços fora do teatro, a partir da mostra Dança em Trânsito. A ótima idéia foi também aqui cerceada, já que limitou-se ao jardim do próprio Centro Cultural. No Rio de Janeiro, a mostra realizou intervenções no Aterro do Flamengo, na praça XV, na Lagoa Rodrigo de Freitas e na praia de Copacabana.

Se o objetivo era “transformar marcos históricos urbanos em verdadeiros palcos ao ar livre atraindo o público comum através de improvisações e espetáculos em movimento”, como diz o programa do evento, a idéia não foi concretizada em Brasília. As apresentações feitas no jardim do CCBB apenas atingiram um público que já se encontrava no local para assistir alguma atração artística.

É fato que o CCBB de Brasília se encontra em um lugar afastado dos lugares de grande circulação de pessoas. Mas se a idéia era chamar o público a partir das intervenções na rua, seria interessante, por exemplo, realizar as apresentações nas paradas em que passa o ônibus do Centro Cultural. Este ônibus oferece transporte gratuito para o Centro e têm locais e horário fixos de passagem.

Como citei anteriormente, a crítica aqui colocada não se trata apenas do evento 4 Movimentos. O festival Dança em Pauta realizado na cidade em 2006 também apresentou algumas falhas pela falta de conhecimento da cidade. Uma das iniciativas foi a de promover discussões com os coreógrafos participantes do evento. Horário e local impróprios não reuniam mais que seis pessoas na platéia.

A promoção de festivais de dança contemporânea é um instrumento importante de difusão, formação de público e circulação de espetáculos. A produção e realização desses eventos não são fáceis, consumindo muito trabalho e recursos para sua concretização. O financiamento de uma instituição como o Banco do Brasil para esse tipo de ação é uma iniciativa imprescindível. E é nesse sentido que faz-se necessário uma reflexão de como potencializar as ações propostas pelos eventos de dança realizados, seja em Brasília ou em outro lugar do país.