Mostra Rumos: afinal, o que é processo? | Rumos showcase: what is process, after all?

A Mostra de Processos Rumos Itaú terminou no domingo (14/03). Mais do que um espaço de encontro de artistas – cerca de 100 passaram por lá durante todo o evento – e pesquisadores, ela acendeu uma importante discussão em torno do formato proposto pelo edital 2009-2010, que focou na mostra dos processos de criação e não no produto final, como normalmente acontece. Resultado: por onde se andava, antes e depois das apresentações, pipocavam perguntas sobre o que é exatamente o processo de criação? Como mostrá-lo? Será que o público está interessado nisso?

“Processo é um termo usado não apenas nas artes, mas também nos campos econômico e científico. Quer dizer um conjunto organizado de trocas que influencia na mudança de algo e pode ter várias fases”, definiu o pesquisador e crítico francês Christophe Wavelet, na palestra Experimentação e Pesquisa nos Espetáculos Processuais, dentro da programação da mostra. “Na arte, quando falamos de processos mais complexos, é muito arbitrária a distinção entre processo e produto”, completa.

Ele lembrou, que nos anos 80 na França, muito se discutiu sobre o que seria de fato uma obra coreográfica em processo, mas que hoje esse assunto já estaria esgotado. “Quando soube que viria ao Brasil, pensei se isso seria uma questão na dança contemporânea brasileira. Conversei com artistas e teóricos e descobri que havia muito em comum entre os dois países. Me perguntei várias vezes sobre o entendimento de processo, mas não tenho uma resposta…”, relatou Christophe.

Uma outra visão sobre o tema, que se aproxima mais da forma de expor essa etapa de criação, foi dada pela professora da PUC-SP, Cecilia Almeida Salles. Ela analisou os blogs criados pelos artistas durante os meses de trabalho – uma exigência inédita do edital – ressaltando aspectos interessantes da utilização da ferramenta (clique aqui para ver os blogs criados). “Busquei especificidades e diferenças nas relações entre obra e processo. Observei que existe uma banalização dessa palavra, o que acaba valorando algo. Toda criação tem um processo vinculado, mas não podemos quantificá-lo, dizer que um é mais que o outro”, explicou.

Órgão / Foto: Ivson

Órgão / Foto: Ivson

De acordo com a análise de Cecilia, os blogs serviram como um espaço de registro das reflexões dos artistas e ocupou um lugar dentro do próprio processo criativo. “Eles funcionaram em paralelo à pesquisa”. Ela também observou que uma das principais dúvidas estava relacionada à forma de apresentar o trabalho. “Muitos artistas deixaram claro que o problema era tornar público o processo e que isso gerava um certo medo”, ressaltou.

Para Michel Groisman, que mostrou a performance-instalação Órgão (foto) durante a mostra, a dificuldade maior é limitar um fim para o processo. “O que é obra final? Existe esse momento final? A todo momento parece que pode mudar…”, reflete ele, que divide a autoria e ‘manejo’ do objeto com Gabriela Duvivier. “No caso do Rumos, acho que é mais fácil para lidar com pressão interna de ter que ter algo pronto para mostrar. Me senti à vontade de não estar no lugar ideal. O processo é contínuo”, argumenta.

Quatro ‘processos’ continuam suas pesquisas

Assim como previsto no edital, dos 21 trabalhos apresentados, quatro receberão um novo aporte para dar prosseguimento à pesquisa nos próximos meses. São eles: Piranha: Dramaturgia da Migração, de Wagner Schwartz  (MG); Espaço como Fluxos de Possibilidades, de Clube Ur=H0r (MG); Coleta de Vestígios, de Marta Soares (SP); e Transformers, de Thelma Bonavita (SP). A comissão de seleção foi formada por Alejandro Ahmed, Christine Greiner, Marcelo Evelin e Vera Sala (Lia Rodrigues fez parte apenas da primeira etapa de seleção pois não pode assistir a todos os trabalhos). Eles levaram em conta os seguintes critérios: maturidade da pesquisa; clareza das questões investigadas; importância e pertinência da continuidade da pesquisa. Agora, cada um deles receberá R$ 40 mil para aprofundamento da pesquisa, cuja nova etapa será apresentada na primeira semana de dezembro.

Para a gerente da área de Artes Cênicas do Itaú Cultural, Sônia Sobral, essa foi uma das melhores edições do programa. “Ainda não sei bem o porquê, mas tem a ver com maturidade e disponibilidade, tanto do programa quanto de todos que aqui estiveram. A sequência agora é pensar na publicação dos resultados que serão distribuídos para instituições culturais e de ensino de todo país, além da fase de difusão”, analisa.

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Inquietações no Rumos Dança

Novos e instigantes processos de pesquisa (crítica escrita por Helena Katz no jornal O Estado de São Paulo do dia 23/03/10)

Rumos Itaú’s Mostra de Processos (“Process showcase”) ended on Sunday (14/03). More than a meeting space for artists and researchers, it sparked an important discussion about the format proposed by the program, which focused on the creative process instead of the final product, as it usually happens. The result was that everybody started wondering: what is the creative process exactly? How can it be shown? Is the audience interested?

“Process is a term used not only in the arts, but also in the economic and scientific fields. It means an organized set of exchanges that influences changes in something and may have many stages”, defined French researcher and critic Christophe Wavelet, in the lecture Experimentação e Pesquisa nos Espetáculos Processuais (“Experimentation and Research in Processual Shows”), as part of the showcase’s program. “When we speak of more complex processes in art, the distinction between process and product is very arbitrary”, he says.

He remembered there had been much debate in France in the 80’s about what would be a choreographic piece in process. But today this subject already burned out. “When I learned I would come to Brazil, I wondered if this would be an issue for Brazilian contemporary dance. I talked to many artists and theorists and found out there is much in both countries. I asked myself about the understanding of process many times, but I don´t have an answer…”, said Christophe.

Cecília Almeida Salles, a professor at PUC-SP, offered another view about the subject, which comes closer to the way of showing this step of creation. She analyzed the blogs created by the artists during the work – a new requirement of this edition of the program – highlighting interesting aspects of the tool’s use. “I searched for specificities and differences in the relationship between piece and process. I noticed the word has been trivialized, which ends up attributing value to something. Every creation has a process attached to it, but we can´t quantify it, say that one is more than the other”, she explained.

According to Cecilia’s analysis, the blogs served as a space to document the artists’ reflections and had a place within the creative process itself. “They worked in parallel with the research”. She also observed that one of the main doubts was related to the way of showing the work. “Many artists made clear that the problem was making the process public and that created some fear”.

Michel Groisman presented the performance-installation Órgão during the showcase, a partnership with Gabriela Duvivier. For him the biggest difficulty is establishing an end for the process. “What is the final art piece? Is there a final moment? At each moment it seems like it can change…”, he reflects. “In the case of Rumos, I think it´s easier to deal with internal pressure to have something ready to present. I felt at ease not being in the ideal place. The process is ongoing”, he argues.

Four ‘processes’ will continue

According to the program’s regulation, four out of the 21 works will receive more funds to keep working on the research in the following months. The projects are Piranha: Dramaturgia da Migração , by Wagner Schwartz (MG); Espaço como Fluxos de Possibilidades , by Clube Ur=H0r (MG); Coleta de Vestígios , by Marta Soares (SP); and Transformers , by Thelma Bonavita (SP). The selection process was composed by Alejandro Ahmed, Christine Greiner, Marcelo Evelin and Vera Sala. They considered the following aspects: maturity of the research; importance and relevance for the research’s continuity; clarity of the issues investigated. Each one will receive R$ 40.000 to deepen the research, whose new phase will be presented in the first week of December.

Sônia Sobral, manager of performing arts at Itaú Cultural, considers this edition is one of the best. “I still don´t know exactly why, but it has something to do with maturity and availability, both the program and everyone that came here. The next step is to think about the publication of the results, which will be distributed to cultural and learning institutions around the country”.