Movimento Dança Recife entrega carta de repúdio à Prefeitura da cidade

No último mês, o Movimento Dança Recife entregou à Prefeitura da cidade um documento criticando o descaso em relação à área da dança. Uma das principais motivações foi o desligamento da gerente de dança, Mônica Lira, e a subsequente extinção do cargo. Outros pontos citados são o corte de 70% no orçamento do Festival Internacional de Dança do Recife, o atraso no pagamento de editais do ano passado, o fechamento e falta de manutenção dos teatros municipais.

Criado em 2004, o Movimento conta hoje com 125 artistas associados, de diversos segmentos da dança, com o objetivo de se articular politicamente e mediar negociações com o poder público.

Segue o documento na íntegra.

Manifesto de Repúdio pelo Desrespeito da Prefeitura do Recife com a Dança

A categoria da Dança vem, por meio desse documento, manifestar repúdio à forma como a dança e outras linguagens artísticas vem sendo tratadas por esta gestão. Neste mês a área da dança ficou indignada com a notícia de que a Gerente de Dança, Mônica Lira, fora exonerada do cargo sem explicações sobre essa decisão. A atitude demonstra um desrespeito com a pessoa e profissional de Mônica Lira, e também com a categoria de Dança. Além disso, fomos informados, pela ex-gerente, que com sua exoneração o cargo de Gerente de Dança fora extinto, assim como vem acontecendo com outros cargos de cultura nessa gestão. Gostaríamos de repudiar tal atitude, pois impossibilita a execução das ações que cada linguagem artística necessita, e reforçamos a importância do cargo da Gerência de Dança para a categoria. Pedimos portanto, explicações sobre os motivos da exoneração e reiteramos a importância do retorno do cargo e que ele seja ocupado por um profissional da área de Dança.

Ressaltamos que a criação de cargos de gestão em dança pelo país é uma luta constante dos movimentos dos artistas da dança. Foi a partir dessa luta nacional que em setembro de 2004 foi criado o cargo de Coordenação de Dança na Fundação Nacional das Artes, Funarte, que fora ocupado pelo coreógrafo Marcos Morais e que existe até hoje. Aqui em Pernambuco a luta aconteceu por meio do Movimento Dança Recife que a partir de um diálogo permanente com a gestão municipal local conquistou em 2005 a criação do cargo da Gerência de Dança, dentro da Fundação de Cultura da Cidade do Recife e em 2011 o cargo de Assessoria de Dança da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco – Fundarpe. Assim, entendemos a extinção do cargo de Gerência de Dança da gestão municipal  como um descaso com a luta histórica da categoria de Dança por valorização e reconhecimento e  consideramos um retrocesso no pensamento de política cultural dessa gestão, que irá prejudicar a cadeia produtiva da dança e seu desenvolvimento local.

Outras questões também apontam para graves atitudes diante da Dança: o corte de verbas do Festival Internacional de Dança do Recife; os atrasos do pagamento do Prêmio de Fomento de Artes Cênicas; os atrasos no pagamento do projeto “ O Solo do Outro”; e os atrasos do pagamento do DDDança. Para que haja uma manutenção das condições mínimas de trabalho em nossa área, é de extrema importância o cumprimento dos acordos de ambas as partes, da sociedade civil e do poder público.

Há anos que a sociedade vem cumprindo todas as suas obrigações e colaborações para a construção e fortalecimento, por meio das ferramentas democráticas fornecidas e estimuladas pelo poder público municipal, como a participação nas conferências municipais, na participação do Conselho Municipal de Cultura, assim como nas inúmeras reuniões em que a categoria foi convidada para contribuir e expor suas prioridades.

Mas o que temos tido como retorno está longe do que tem sido acordado em todos esses encontros, ferramentas e pronunciamentos públicos.

O anúncio de um corte de quase 70% no orçamento do Festival Internacional de Dança do Recife, após o lançamento da convocatória (incluindo o resultado dos selecionados) só demonstra um descaso e desrespeito com a categoria, já que esse tipo de notícia deveria ter sido dada com muito mais tempo de antecedência. Além de descumprir um acordo feito na edição anterior, em que a gestão pública garantiu um orçamento maior para 2015, já que houve um valor muito abaixo do que se esperava para a realização do Festival em 2014.

Após dois anos de gestão é que foi lançado o Edital de Fomento às Artes Cênicas do Recife 2014/2015, descumprindo o que rege em lei do Plano Municipal de Política Cultural, onde consta que este edital deveria ser anual. E mesmo com todo esse tempo para lançar o primeiro edital desta gestão, a Prefeitura efetuou o pagamento apenas em novembro deste ano, e a apenas 3 (três) contemplados, das 9 (nove) montagens de espetáculos de circo, teatro e dança, e depois que já tinham estreado e cumprido temporada. Além disso, nem todos os contemplados sequer assinaram contrato. Todas as propostas de projetos foram enviados em fevereiro de 2015 à Fundação de Cultura do Recife e analisadas por uma comissão, que também não recebeu seu pagamento. Segundo o edital, todos os espetáculos contemplados deveriam estrear no segundo semestre de 2015, realizando um total de 8 apresentações. Como o Fomento é um recurso da PCR que provém dos cofres do município, dessa forma, já deveria estar no orçamento anual, então não há qualquer desculpa ou crise que justifique a falta desse pagamento, uma vez que o orçamento anual foi aprovado no ano de 2014 pela Câmara dos Vereadores.

Além dessa ferramenta do Sistema de Incentivo à Cultura, não temos qualquer notícia ou previsão de lançamento do edital do Mecenato do SIC, que também deveria acontecer anualmente, conforme o Plano Municipal de Política Cultural, que é lei, mas que o último edital lançado foi em 2011. A explicação de que a PCR está trabalhando na reformulação da lei não se justifica mais, já que são mais de quatro anos. Inclusive, os projetos inscritos no ano de 2012, até a data de hoje, não tiveram respostas de quem foram os aprovados.

Outro projeto financiado pela Prefeitura do Recife, por meio da Secretaria de Cultura, “O Solo do Outro”, ainda não teve seus pagamentos efetivados até a data presente, descumprindo o edital. Assim como estão também atrasados os pagamentos prometidos ao DDDança, projeto que surgiu de uma parceria entre a Prefeitura e a categoria da dança, para a realização da celebração do Dia Internacional da Dança (29 de abril), um evento construído pela categoria da dança que fomentou muitas ações que deveriam estar sendo cobertas e incentivadas pela gestão pública. O DDDança surgiu durante os encontros de Artes Cênicas promovidos pela Gerência de Artes Cênicas no início deste ano, e contou também com 3 apresentações artísticas, e que também não receberam seus cachês até a data presente.

O atraso da reforma do Teatro do Parque, e a falta de manutenção dos teatros municipais, fechando mais um teatro (Teatro Barreto Júnior) para apresentações (que está funcionando apenas para ensaios), impossibilitam que a produção artística utilize esses espaços com as condições básicas de funcionamento, ou que nem possam ocupar suas pautas para apresentações, como é o caso do Teatro do Parque e do Teatro Barreto Júnior que mantinham um programa de formação de plateia de grande relevância para a categoria.

Infelizmente, esses editais e projetos citados acima e o Festival Internacional de Dança do Recife têm se mostrado como as únicas ferramentas da Prefeitura, expondo o frágil pensamento de política cultural desta gestão. Porém o edital do Fomento está com os pagamentos atrasados, o Mecenato nunca foi lançado por esta gestão, e o festival acaba de sofrer um grande corte orçamentário, impossibilitando a maior parte do que foi discutido entre a coordenação do Festival e a sociedade civil em fevereiro deste ano.

Precisamos cuidar e fortalecer o que já acontecia, mas também abrir outras possibilidades para que a cadeia produtiva da dança possa encontrar condições mínimas de continuar existindo, já que sabemos do papel do poder público para esse tipo de manifestação cultural na sociedade. A dança  precisa encontrar meios de produção, pesquisa, difusão, formação, memória e circulação para que tenha sua total expressividade garantida pelas políticas culturais do poder público. E ressaltando que não são apenas os trabalhadores da dança que sofrem com este descaso, mas também o público que se vê cada vez mais carente de produções, tendo seus direitos culturais negados (conforme artigo 215 da Constituição Federal).

É por esses motivos que manifestamos aqui nosso total repúdio ao modo como a gestão vem tratando a categoria da Dança. E aproveitamos para solicitar desta gestão um encontro com a categoria para maiores explicações e uma tomada de posicionamento mais pragmático em relação ao exposto neste manifesto.

Cordialmente,
Movimento Dança Recife