A fome com a vontade de comer

Em outros artigos neste site, repetiu-se este mesmo objetivo: retratar formas atuais de difusão da dança no Brasil. É satisfatório ver que a dança vem sendo paulatinamente alimentada por publicações, festivais e projetos diferentes que pretendem igualmente distribuir conhecimento, apesar de termos a impressão de que há muito a ser feito. Esperamos que tantas iniciativas possam galgar novas formas de incentivo, fortalecendo a importância de produzir conhecimento em dança.

Para este artigo, espelho uma experiência pessoal que se repete com muitos colegas. A formação de um dançarino hoje não passa somente pelo ensino informal. Cada vez mais tem um passo fundamental na faculdade.

No meu caso, além de uma formação em academias de dança, fazendo balé e dançando repertório, a chance de fazer uma graduação em dança era um privilégio há poucos anos atrás. Depois do bacharelado e licenciatura da UNICAMP, pude freqüentar o Centro de Estudos do Corpo, coordenado por Helena Katz. Com as portas para fazer um mestrado na PUC-SP, também pude perceber como uma pós-graduação traz valiosas noções acerca de teorias da dança.

Naturalmente, e é o que se espera da relação ensino-aprendizado, a experiência em trilhar uma formação acadêmica, seja no nível técnico, graduação, especialização ou pós-graduação, funciona como um incentivo para buscar novos horizontes, além daquele apresentado pelas aulas. Como um propulsor, cada aula, cada texto, cada debate, cada movimento ou seqüência, cada processo ou “dever de casa” é um pedaço de um currículo sistematizado, ao mesmo tempo que cabe a cada um, cada estudante ou dançarino usar estas ferramentas para descobrir outras.

É com esta perspectiva que ressalto a importância dos cursos de ensino formal em dança neste país. Cursos antigos estão paulatinamente sendo reformulados, cursos novos buscando novas possibilidades, cursos recém estruturados ganhando novas formas de articular seu conhecimento. Além disso, através de alguns núcleos de pós-graduação no país e com eles, núcleos de pesquisa, começa a se configurar um retrato evidente de teoria ligada à prática da dança. Afinal, o dançarino precisa estudar, seja nos movimentos técnicos da dança, seja nos discursos que a cercam e a definem. A responsabilidade hoje do dançarino está em saber usar tais ferramentas, sejam elas teóricas ou da prática da dança, uma vez que cada opção define politicamente seu campo de ação na área. Exige-se um artista autônomo e ciente de suas escolhas, fato que empurra muitas pessoas para a sala de confrontos e questões que é, por excelência, a sala de uma universidade.

Agora, faça a sua escolha: conheça cada instituição, veja as opções indicadas ao longo deste artigo, vá visitá-las (online ou pessoalmente), participe dos eventos e encontros, fuce grupos de pesquisa na área (veja no site do CNPq www.cnpq.br, o link Diretório de Grupos de Pesquisa). Este artigo pretende ser um guia para sua empreitada como estudante da dança em faculdades que ofereçam bacharelado ou licenciatura em dança, bem como algumas das opções em pós-graduação. A propósito, o artigo estende-se para atender a maioria da opções disponíveis. Alguns certamente não couberam aqui, mas consulte o Banco de Dados do Itaú Cultural (www.itaucultural.org.br), pode te ajudar.

A Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia fez 50 anos ano passado e ganhou o primeiro curso de mestrado especificamente em dança do país, ou seja, é um departamento autônomo, sem nenhuma área mãe ou parente que o abrigue. No site www.danca.ufba.br, a Escola de Dança e o Programa de Pós Graduação em Dança apresentam as premissas que norteiam a graduação, a especialização e o mestrado. A direção da escola é de Dulce Aquino, a vice, Profa. Carla Leite e a coordenação da graduação é da Profa. Beth Rangel (no site, você pode encontrar os e-mails dos professores para tirar dúvidas). O projeto pedagógico do curso de graduação em dança foi aprovado em 2005 e está, desde 2001, em ação. Vale a pena conhecer a estrutura do curso que busca atender a novos paradigmas da contemporaneidade. Os estudos e laboratórios são as formas encontradas para reforçar uma prática educacional em processo que coloca o aluno forçado a vivenciar cruzamentos interdisciplinares, e não mais reduzir o aprendizado a resultados de final de semestre.

A especialização é composta de três módulos ao longo de um ano. Oferece um instrumental teórico para questões contemporâneas na dança. Tal estrutura, desde julho 2005, é lecionada também na Faculdade Angel Vianna, em convênio com a UFBa. Com coordenação da Profa. Dra. Eloisa Domenici e vice-coordenação da Profa. Dra. Adriana Bittencourt, é salutar o número de professores doutores e mestres, o que indica, para os que desconhecem o jogo acadêmico, alto nível de rigor científico e, no nosso caso da dança, uma condição ideal para aprofundar processos artísticos como pouco se vê nas formações em dança.

No mestrado, são duas as linhas de pesquisa – a saber, estudos de processos e estudos de configurações. Inaugurado em março de 2006 com coordenação da Profa. Dra. Fabiana Britto e vice Profa. Dra. Jussara Setenta, é possível constatar a premissa que guia os estudos em dança: “o reconhecimento da dança como área de conhecimento a atividade cognitiva do corpo”. Entenda mais acompanhando os artigos e produção dos professores.

O Departamento de Artes Corporais da UNICAMP é o segundo da lista porque foi o segundo no país a se estruturar no Instituto de Artes, reconhecido em 1992. A meta do curso descrito no site (www.iar.unicamp.br/corporais/daco.html) é “a criação artística, a pesquisa e o ensino em dança apoiando-se na realidade brasileira”. Além de mostrar qual tipo de profissional sai desta graduação, seja bacharel ou licenciado, os objetivos gerais e específicos são apresentados no site, demonstrando o interesse em capacitar o estudante a ser sensível e participante da sociedade em que vive. As danças brasileiras são uma particularidade do curso e tem, na pesquisa de professores como Dr. Eusébio Lobo, Dra. Inaycira Falcão e Dra. Graziela Rodrigues, o escopo científico e artístico para tal empreitada. Segundo a Profa. e coordenadora Ângela Nolf, em 2006, um novo projeto pedagógico vem sendo desenhado, a partir do qual os ateliês são o lócus da experiência do intérprete-criador. A licenciatura agora está sob gestão do Departamento de Artes Corporais, e não mais da Educação, como era antes.

O IA da Unicamp também conta com uma pós graduação (www.iar.unicamp.br/pg ) em Artes. Implantado em 1998 e reconhecido pela CAPES em 1994, foca na “criação e produção contemporânea, enfatizando os procedimentos da mediação, entre os códigos e seus suportes, entre os discursos e narrativas e suas linguagens”. Na área de concentração das artes cênicas, existem duas linhas de pesquisa “Processos e Poéticas” e “Fundamentos Técnico/Poéticos do Intérprete”. Muitos profissionais se formaram na UNICAMP, eliminando o hiato que havia na falta de cursos de pós graduação até pouco tempo atrás.

No Rio de Janeiro, a UniverCidade oferece a graduação em dança, bem como 3 possibilidades de pós graduação, são estas: Estudos Avançados em Dança Contemporânea: Coreografia e Pesquisa (1), sob coordenação da Profa. Mestra Thereza Rocha, Educação Somática: Estudos e Métodos da Consciência Corporal e da Expressão pela Dança (2) que conta com a coordenação da Profa. Silvia Soter e Didática da Dança Infanto-Juvenil – Ensino de Dança para Crianças (3) na qual quem coordena é a Profa. Mestra Ângela Ferreira, que também dirige a escola de ensino de dança profissional no Centro de Dança Rio (http://artes.com ), no Méier, reconhecido pelo Ministério da Educação. Na UniverCidade, como se trata de uma universidade privada, todos os cursos são pagos.

Com currículos que dão sabor em estudar, as disciplinas da pós graduação apontam, segundo texto do site (http://www.univercidade.edu) para a formação (1). “de coreógrafos com habilidade em pesquisa a partir de uma abordagem interdisciplinar da dança”; (2) promover o “contato com diversos métodos de educação somática e consciência corporal” e (3) “formar profissionais envolvidos especificamente no ensino de dança para crianças e adolescentes”.

Um destaque polêmico é o recente convênio entre a UniverCidade e o Theatro Municipal do Rio de Janeiro que promete formar os dançarinos do Theatro junto com sua atuação profissional. Em matéria publicada no jornal O Globo (8 de janeiro de 2007), Roberto Pereira, prof. Dr. Coordenador do curso de licenciatura em dança, conta mais da idéia, falando das disciplinas e da possibilidade de casar estudo e balé.

O Curso de Dança da Universidade Federal do Rio de Janeiro (http://www.eefd.ufrj.br/Danca/topo.html) foi criado em 1994, tem a formação em interpretação e coreografia. Ligado ao Departamento de Arte Corporal da Escola de Educação Física e Desportos, tem ampla estrutura e uma linha de pesquisa desenvolvida pela Profa. Helenita Sá Earp. Tem um projeto de pós-graduação em andamento, possui vários professores formados em Ciência da Arte pela UFF e laboratórios de pesquisa – são eles “Laboratório de Pesquisa e Criação Coreográfica”, “Laboratório de Dança, Criação e Imagem”, “Laboratório de Musica e Movimento” e “Laboratório de Arte-Educação”.

Com relato de Sandra Meyer, a qual agradecemos gentilmente, conhecemos o Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) que já realizou três edições de uma Especialização em Dança Cênica – latu sensu, nos anos de 1999, 2000 e 2002. No momento o Departamento de Artes Cênicas não está atuando, pois a prioridade vem sendo a constituição de uma pós strito sensu, no momento Mestrado e Doutorado em Teatro. Afastada 4 anos por conta do doutorado, Sandra Meyer não tem previsão de retomar a Especialização. Mas a boa novidade é o lançamento previsto para este ano de um livro com alguns trabalhos de conclusão de Curso (monografias) deste período, organizado pela própria Sandra, por Jussara Xavier e Vera Torres.

A Escola e Faculdade Angel Vianna (www.escolaangelvianna.com.br), no Rio de Janeiro, oferece a formação de docentes e de dançarinos. Há 18 anos como escola, em 2001, inicia a jornada eficiente de uma faculdade acoplada aos estudos pioneiros da família Vianna. Auto-conhecimento e criatividade são as máximas do curso, que prepara o aluno para atuar na sociedade, segundo informações do site. Com a ajuda de Ausonia Bernardes, aí estão as atividades para 2007: 1. na graduação, em maio, a programação do Seminário do Núcleo de Pesquisas da Faculdade Angel Vianna, em parceria com a Universidade Técnica de Lisboa e com a UERJ; para junho, previsto a XIII Mostra Didática da Faculdade Angel Vianna. Na Pós- Graduação Lato Sensu, a novidade é o curso “Terapia através do Movimento.Corpo e Subjetivação, sob a coordenação geral de Angel Vianna e o curso “Estéticas do Movimento: Estudos em Dança, Videodança e Multimídia” sob a coordenação geral de Angel Vianna.

O Curso de Comunicação das Artes do Corpo, da PUC – SP (http://www.pucsp.br/paginas/ensino_pesquisa/cursos/comunicacao_artes_corpo.htm), proposto pela Profa. Dra. Christine Greiner, em 1999, oferece três tipos de habilitação, segundo a colaboração da Profa. Dra. Rosa Hercoles: dança, teatro e performance, inclusive sendo esta “uma habilitação inédita no país. Neste ano, entrará em vigor o novo currículo, que teve a questão da transdisciplinaridade como ponto de partida para sua reforma”. Ela ainda explica que “a proposta para a área de dança é a de oferecer ao aluno a oportunidade de desenvolver, a cada semestre, projetos criativos, além das disciplinas de história, teoria e dramaturgia da dança”. Importante notar que o curso de dança não se propõe a oferecer treinamento técnico, como comenta Rosa.

A Faculdade Paulista de Artes (http://www.fpa.art.br/graduacao_danca.php) também é outra opção pertinente em São Paulo, apesar de um curso de pequena dimensão, formou muitos dançarinos da cidade.

O Curso de dança da Anhembi Morumbi (www.anhembi.br), tem a coordenação da profa. Mestra Silvia Geraldi que, também por e-mail, comenta das atividades para 2007: 1. “Residência para Criação, um programa permanente do curso que acolhe artistas, grupos e cias de dança sem espaço para ensaios e desenvolvimento de seus trabalhos. Neste ano, estamos acolhendo: Omstrab, Staccato, Cia. 8 Nova Dança, além de acolhimentos temporários como Eliana de Santana e Zélia Monteiro”; 2. “Laboratório Coreográfico, um programa interno de apoio à pesquisa, criação e circulação da dança, de caráter extra-curricular, que tem por objetivo acompanhar e orientar processos criativos realizados por núcleos de alunos do curso, formal ou informalmente constituídos”; 3. “um programa de intercâmbio internacional com algumas das universidades que fazem parte da Rede Laureate, da qual fazemos parte. A idéia é desenvolvermos alguns projetos de interesse comum”. Como pode se constatar pela fala da professora, além das mostras de dança, oficinas para comunidade e mostra inter-estudantil de artes, o curso vem aquecendo programas de apoio à criação em dança na cidade, com seus alunos e profissionais do mercado.

No Sul do país, com a ajuda de Airton Tomazzoni, encontram-se os cursos da UERGS/ Fundarte, em Montenegro, da Ulbra, em Canoas, e da Unicris, em Cruz Alta, para tecnólogo em Dança. Existe ainda a pós em dança da PUC/RS e, neste semestre, também outra pós graduação na Ulbra. Em Montenegro, na Graduação em Dança (Licenciatura – http://www.fundarte.rs.gov.br/) foi estabelecida por um convênio entre Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (UERGS) e Fundação Municipal de Montenegro (FUNDARTE). Com isso, houve uma ampliação do mercado que, com a formatura de duas turmas, beneficia tanto os alunos que vêm sendo empregados em companhias, projetos e oficinas, como os professores, que, a partir da nova demanda, têm a chance de prestar concurso. O curso de licenciatura, segundo Airton, tem “ênfase no professor criador, com um currículo que investe bastante em técnicas corporais, dramaturgia da dança, composição coreográfica, etc.”. Chama atenção para a realização do 18° Encontro Nacional de Arte e Educação e vale a pena acompanhar. Flavia Valle acrescenta que a licenciatura é o único curso superior gratuito em dança do RS e faz ainda intercâmbios entre as linguagens artísticas.

Com a colaboração de Flávia Valle, obtemos mais informações sobre o Curso Superior de Tecnologia em Dança (www.ulbra.br/danca) da Universidade Luterana do Brasil/ULBRA (Canoas) que, “iniciou no 2º. semestre de 2003 suas atividades. O mais interessante, segundo Flavia, “os alunos que ingressam com experiência em dança aprendem a pensar criticamente sobre sua prática, assim como relacioná-las com outras práticas não familiares. Já os alunos que não tem experiência em dança são introduzidos a um corpo de conhecimento e orientados para a carreira que pressupõe constante dedicação”. Além disso, “o curso conta com um Grupo de Dança Experimental, Centro de Memória da Dança, Projeto Social Dança e Movimento, Grupo de Expressão Down-Up e Centro de Estudos e Apoio à Dança, estes dois últimos, em parceria com o curso de educação física”.

Na ULBRA, tem também a Especialização em Dança com sua primeira edição agora em 2007. Chama-se Contemporaneidade na Criação e no Ensino da Dança e se “propõe a pensar o que é feito em dança hoje a partir da tentativa de compreender os significados da arte relacionada ao ensino e a criação coreográfica”.

Sobre a Unicris, em Cruz Alta, e a pós em dança da PUC/RS, não obtivemos nenhuma informação a tempo, mas vale saber da existência e acompanhar.

Na Universidade de Viçosa (www.dan.ufv.br), os cursos são de licenciatura e bacharelado e têm propostas pedagógicas alinhadas com as diretrizes curriculares sugeridas pelo MED/MEC/SESU (1999), segundo informação do site. Aprovado em 2000, teve início em 2002, tem a grade curricular disponível na página do curso, bem como os ideais do curso. Conta com a coordenação da profa. Dra. Maristela Moura Silva Lima e tem professores doutores e mestres no corpo docente. Também conta com projetos de extensão e atelier coreográfico.

Na Faculdade de Artes do Paraná (www.fapr.br), o curso também é de bacharelado e licenciatura e tem o formato curricular convencionado, como algumas das opções já citadas.

Para encerrar, vale a pena comentar a tática dos grupos de pesquisas cuja função é aglomerar pesquisadores e alunos em torno de um recorte sugerido pelo líder, um professor doutor que estimula a produção e o encontro dos estudantes. Exemplo recente e promissor de novos cursos na cidade de São Paulo é o grupo “Dança: Educação e Estética”, liderado pela Profa. Dra. Kathya Godoy, na UNESP (www.ia.unesp.br). Segundo Kathya, “o Instituto de Artes da Unesp tem se preocupado com a inserção acadêmica da área de Dança nos últimos anos. Por isso abriu esse espaço no Programa de Mestrado em Artes, na área de concentração em Artes Cênicas, na linha de pesquisa Teoria, prática, história e ensino da arte. O grupo tem abarcado pesquisas de mestrandos, mestres e doutores que abordam as relações entre a Estética e a Educação na Dança Contemporânea”. Outra opção em andamento e que promete uma formação diferenciada é o Curso de Especialização Lato Sensu História da Arte e Cultura Contemporânea. Kathya explica que a proposta é de “entrelaçar as diferentes linguagens com um módulo dedicado à linguagem da dança”.

Como se vê, há opções para todos os gostos e lugares. Alguns cursos, como cometamos antes, não couberam aqui, mas se informem e divulguem. E, para quem interessar e entender dança como uma área de conhecimento instigante e em promissora produção, procure um modo de participar desta jornada de estudos.