O olhar do espectador: personagens da Bienal SESC de Dança 2013

Idealizado pela artista Sheila Ribeiro, o 7×7 é um projeto de manifestações crítico-poéticas em torno de trabalhos artísticos escritos por artistas. Desde 2009, o 7×7 olha para o que acontece em dança contemporânea por ai. Nascido durante o Festival Contemporâneo de Dança (SP), já cobriu o Festival Panorama (RJ), Olhares sobre o Corpo e  FID (MG), Panorama Sesi (SP), Bienal SESC de Dança 2013 (Santos), dialogando com os eventos de dança do Brasil e produzindo + de 100 críticas artísticas. O 7×7 hoje é: Arthur Moreau, Caroline Moraes, Rodrigo Monteiro, Bruno Freire, Laura Bruno e Lucia Naser. O idanca.net, parceiro desde sempre, publica mais uma série de 7 críticas do projeto. Para conhecer + sobre,  acesse o site.

BIENAL SESC DE DANÇA 2013 X LUIZA ROSA = Olhares Convexos.

Por Luiza Rosa entorno de Bienal SESC de Dança 2013.

Patrícia decidiu faltar à reunião de professores na escola onde dá aula de artes, para assistir dança em Santos. Colocou os pés na areia da praia, se sentiu confortada com o cheiro do mar e sentou para admirar uma paisagem que formava à sua frente: um dançarino sumia no horizonte, se aproximando do mar, entre morros de areia, sob uma lua próxima a Vênus. Era o final do espetáculo “Vácuo I – impostor”, da key zetta e Cia., apresentado na Praça das Bandeiras, no dia 11 de setembro, durante a 7a Bienal SESC de Dança.

No mesmo fim de tarde, dançarinos da Cia. Danza Periférico, do Uruguai, praticavam o português com a cantora Paula Fernandes, pelo DVD exibido na TV da van que os levava do Hotel Balneário para o SESC Santos. “Sou teu mundo, sou teu poder, sou tua vida, sou meu eu em você…”, a legenda ajudava na compreensão. “Estão aprendendo palavras boas pra sussurrarem pro grande amor, viu gente?”, disse um jornalista curitibano. “Ando devagar porque já tive pressa e levo esse sorriso porque já chorei demais…”, cantaram com gosto a única música que já conheciam.

Larissa e Juliana decidiram aproveitar uma pausa na rotina do CAPS (Centro de Apoio Psicossocial), onde trabalham, para aproveitar a programação da Bienal. “Eu dançava”, disse Letícia com certo pesar, lembrando-se das aulas de balé que fez durante a adolescência em Ilha Solteira. “Nesse período senti na pele um lado meio perverso da dança. Sentia-me sabotada pela professora, por não abrir mão dos estudos para me dedicar totalmente aos ensaios.” Mesmo assim, ela diz que nunca parou de ter vontade de dançar. Vez ou outra faz aulas de balé ou de dança de salão e faz questão de assistir e conhecer novas formas de dançar.

Lá pelas 22h30, depois da “Sagração da Primavera”, de Xavier Le Roy, a comedoria do SESC se transformou em uma pista de dança, discotecada pelo DJ Dolores. Sheila Ribeiro, com seu vestido preto e cabelo longo, solto, que cobria as costas, fazia uma conexão complexa, parecia árabe, entre os braços, a bacia e os pés.

Por volta da meia-noite, Maria Dias voltava para São Paulo no ônibus oferecido pelo evento. Estava recostada na poltrona, com o olhar perdido em uma direção qualquer. Sua perna direita estava em cima da perna esquerda do marido, André Dias. Pareciam satisfeitos. “Assistir dança pra gente é uma necessidade. Tem gente que relaxa saindo pra beber com os amigos, a gente assiste dança e teatro pra voltar mais feliz pra rotina de trabalho.”, disse André. Ela é pedagoga, ele é enfermeiro.

Surpreenderam-se com o espetáculo “De repente fica tudo preto de gente”, dirigido por Marcelo Evelin. “Não imaginávamos que fosse ser tão visceral”, disseram. Ele gostou também de “A sagração da primavera”, performada por Xavier Le Roy. “Achei interessante como foi difícil identificar de onde a música surgia. Senti que ele quis chamar atenção para o fato de a música brotar de nós mesmos”. Completou dizendo que suspeitava que as caixas de som ficavam embaixo das poltronas da plateia e, por conta disso, o som ficava tão difuso.

A plateia ficou iluminada durante todo o espetáculo de Le Roy e Patrícia, a artista plástica que se emocionou na praia e que deu um pulo na piscina do SESC antes de ir ao Teatro, disse que se sentiu um pouco mal ao assistir ao espetáculo: “era uma energia muito forte pensar que a música emanava da gente.”.

Maria e André, que saíram de casa logo depois do almoço, do dia 11, chegaram antes das duas da manhã do dia seguinte. Moram em Taboão da Serra, região metropolitana de São Paulo. Por sorte, antes de cruzar a Av. Paulista, o ônibus Terminal Campo Limpo teve de parar no sinal que fechou. Foi a chance para conseguirem alcançá-lo a tempo. “Sua sensibilidade pra dança é muito interessante, André”, disse-me despedindo. Ele explicou que também dança todos os dias, quando cortinas dos quartos do hospital em que trabalha se fecham. “O biombo é o nosso instrumento ‘sagrado’. Ele é o que separa um paciente do outro em momentos delicados como a troca de roupas, a limpeza. Todo dia a gente faz o mesmo ritual.”, a mesma coreografia.

Luiza Rosa :: Qualquer movimento move Luiza. Para pertencer ao vento, ela escreve. Para conhecer, ela dança.