Quem aí já foi pra baixa da égua e conseguiu voltar?

Logo ali na baixa da égua beleza e ameaça são sinônimos. É tênue a linha que separa truculência e exibição. O duo da Cia Luzia Amélia começa gerando estranheza, começa com seleção, começa separando quem pode e quem não pode, quem deve e quem não deve, quem fica e quem vai.

As dançarinas estão visivelmente embelezadas. Sua beleza – no entanto – não atrai nem é dócil. É uma arma de guerra. Sua beleza não é pra quem ninguém lhes diga que são belas, mas é para que se sintam poderosas. Elas vão para uma guerra! E essa guerra não é apenas metáfora. A ameaça, o embate, a força, os golpes, o peso dos corpos tombados são literalmente sentidos pela plateia. A tensão de ser mandado para a baixa da égua é real. Não é só metáfora, não. Dá vontade de ir embora, constrói o desejo de não querer saber mais daquilo e – paradoxalmente – alimenta a sádica vontade de ver o quão longe se chegará.

“A baixa da égua” é coreografia árida, que fala aridamente sobre a aridez. E a redundância que o texto propõe é necessária para tentar comunicar todos os afetos que sucedem. Não há conforto. Não há deleite. As bailarinas- éguas estão carregadas por de mais, e de tudo que se possa imaginar. E apesar de serem mandadas pra baixa da égua, apesar de serem mandadas pra onde ninguém quer ir, apesar de tudo que lhes é imposto conseguem encontrar um modo gracioso de existir. Essa afirmação não é condescendente, não é um elogio ao ostracismo, não é ode a quem – desde o olhar deste que escreve – cria luxo do lixo. Longe disso. É quase um desafio. Como não se abater? Como continuar a produzir beleza no momento em que estamos? Como não deixar de rir no lugar do qual parecemos não ter condições de sair? Principalmente pela potência que constrói, o final da coreografia é seu ponto forte. É hipnotizante e poderia durar para sempre, pois deixa claro que sem dúvida é ruim ser mandado pra baixa da égua, mas – ao mesmo tempo – nos pergunta como é que voltaríamos de lá. Como continuaríamos?