Resistir é preciso | It is necessary to resist

Promover a troca de experiências, dar visibilidade aos objetivos de cada um e suscitar discussões sobre os meios de sobrevivência e sustentabilidade. Esses foram os objetivos principais do evento Coletivo Corpo Autônomo, realizado entre 7 e 18 de maio pelo Instituto Itaú Cultural, em São Paulo, para colocar em foco essa nova forma de organização que vem crescendo nos últimos anos na dança contemporânea: os coletivos (para ler mais sobre o evento, clique aqui).

“Não estamos aqui para buscar uma definição sobre coletivos, e sim, para compreender os motivos que os levaram a se formar e para dar visibilidade aos objetivos de cada um deles”, disse a coordenadora de Artes Cênicas do Itaú Cultural, Sônia Sobral, durante o primeiro dia de debates.

Participaram do encontro o Couve-Flor Minicomunidade Artística Mundial (Paraná), Núcleo de Criação do Dirceu (Piauí), Hibridus (Minas Gerais), O 12 (Votorantim, São Paulo), Coletivo Dança Rio (Rio de Janeiro), o Movimento Dança Recife (Pernambuco), e o recém-criado Projeto MR (Diadema). Além dos debates e palestras, o público pôde assistir a alguns trabalhos produzidos pelos integrantes do Couve-Flor e do Núcleo de Criação do Dirceu.

Os debates foram divididos entre segunda e terça-feira (12 e 13/05). Nestes dois dias estiveram em pauta temas como autonomia, individualidade na criação e sustentabilidade financeira. Para instigar ainda mais a troca de opiniões e experiências entre os artistas, foram convidados a historiadora e doutora em Cultura da Informação Lucia Maciel Barbosa de Oliveira, e o filósofo Jorge Barros Pires, que falaram sobre diferentes formas de estudar e entender as teorias que envolvem os sistemas.

Um dos pontos abordados no encontro foi a questão da autonomia. Para todos os coletivos, preservar a autonomia criativa foi fundamental na hora de organizar uma forma de produção artística independente. “Nos coletivos, as individualidades são preservadas acima de tudo e essa forma de organização é diferente de tudo que já aconteceu antes na dança”, afirmou Dani Lima, que mediou as conversas.

“Vivemos num ambiente de constante troca e isso faz diferença nos nossos produtos finais. Mas isso não significa que temos características estéticas comuns. Nós já tivemos um período em que criamos juntos, mas não nos sentimos confortáveis com o resultado”, explicou Ricardo Marinelli, do Couve-Flor.

Outro tema bastante discutido por todos foi a sustentabilidade financeira de cada coletivo. Foram levantadas questões como: a entrada de um elemento novo (dinheiro, por exemplo) no cotidiano do trabalho atrapalha? A saída da informalidade quebra o sentido de resistência dos coletivos?

O caso do Núcleo de Criação do Dirceu é o mais específico. Com apoio financeiro da prefeitura de Teresina, o coletivo está seguindo o caminho inverso dos outros grupos, que ainda buscam algum tipo de patrocínio. Desde 2006, quando foi criado, cada integrante do Núcleo ganhava uma bolsa-auxílio para participar das atividades. Com o objetivo de valorizar e incentivar os mais engajados no projeto, o Núcleo criou uma ONG e agora recebe toda a verba da prefeitura e redistribui o dinheiro de acordo com o trabalho de cada um. “Eu ganho em euro e escolhi trabalhar no Piauí. Acho que dinheiro não é tudo. Estamos percorrendo o caminho inverso de quem procura a institucionalização”, explica o diretor do Núcleo, Marcelo Evelin.

Mesmo admitindo o peso da questão financeira na hora de se unir em coletivos, os artistas admitem que o que os une principalmente continua sendo a afetividade e a identificação criativa entre eles. “Sei que nunca vamos receber pelo trabalho que fazemos no Movimento Dança Recife, a renda de cada um vem de seus trabalhos paralelos. Nosso ligação é afetiva”, afirma Marcelo Sena, um dos coordenadores do coletivo pernambucano, que possui forte caráter político. O movimento foi um dos principais responsáveis pela recente criação do curso de graduação em Dança na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

No fim dos dois dias de discussões, a lição que todos levam para casa é a de que – independentemente de se auto-denominarem coletivo ou não – é necessário buscar uma nova forma de sustentabilidade que não dependa apenas dos editais e leis de incentivo. “Há de se criar uma resistência social, real, ou não é resistência. Não digo ser contra o sistema institucional, mas pensar meios de se sustentar além do que ele oferece. E a solução será pensada em meio a muitas conversas como essa”, afirmou a pesquisadora e crítica de dança Helena Katz.

Encontro será encerrado com estréia de espetáculo de Marcelo Evelin

Encerrando o evento Coletivo Corpo Autônomo, Marcelo Evelin fará a estréia de seu novo trabalho. Junto com Cipó Alvarenga e Jacob Alves – ambos integrantes do Núcleo de Criação do Dirceu – apresentarão MONO, de quarta-feira a domingo (14 a 18/05), às 19h30, no Piso PP do Itaú Cultural (Avenida Paulista 149. Telefone: 11 2168-1776).

MONO é o trabalho mais recente de Evelin, criado para testar a relação entre fazer/mostrar, suscitando no público questionamentos sobre estar em algum lugar. Durante três horas, os três artistas dividem o espaço simultaneamente com performances que envolvem bonecas, banha animal e luz negra.

“Quero dar ao público um espaço de percepção, possibilidades de pensar em si mesmo, sem necessariamente chegar a um resultado final. Mostrei esse trabalho em Amsterdã e tive boas experiências”, diz Evelin. Clique aqui e assista ao artista falando sobre o novo trabalho.Portuguese only