Sandro Borelli, da Cooperativa Paulista de Dança, fala sobre os projetos de lei voltados à área

Recentemente, publicamos duas matérias sobre projetos de lei ligados à dança. O primeiro, de autoria do deputado federal Carlos Zaratini, do PT de São Paulo, tramita no Congresso e se refere à concessão de aposentadoria especial, com 25 anos de serviço, para os profissionais da área. O segundo, de autoria do senador Walter Pinheiro (PT), está em análise na Comissão de Assuntos Sociais do Senado e trata da regulamentação do exercício profissional em dança.

Ambos surgiram da discussões e articulações da classe artística. Uma das organizações que têm encabeçado essas discussões é a Cooperativa Paulista de Dança, presidida hoje por Sandro Borelli, que também participa da Frente Nacional Permanente de Dança, um grupo de artistas da dança de todo o país, criado ao final do ano passado com o propósito de discutir questões trabalhistas da categoria e se articular de forma mais abrangente junto aos parlamentares que a apoiam.

Fiz ao Sandro algumas perguntas sobre esses temas, que ele respondeu prontamente.

 

Como surgiu a Frente Nacional Permanente de Dança e como ela se articula?
Sandro Borelli: Ela nasceu no Encontro Nacional dos Gestores de Dança, que foi realizado em novembro do ano passado no Centro de Referência da Dança da Cidade de SP. Foi uma espécie de congresso que contou com a participação de artistas, produtores e representantes de movimentos de vários estados do país. Tal ação foi organizada pelo articulador de Dança da PNA (Política Nacional de Dança), Rui Moreira, Cooperativa Paulista de Dança e Fórum Nacional de Dança. Foi um momento ímpar da dança brasileira, pois durante dois dias estivemos reunidos debatendo intensamente políticas públicas para a categoria.

Qual foi a atuação da Frente na discussão desses projetos e desde quando esse processo vem acontecendo?
SB: O PLP 190/2015 (projeto de Lei da Aposentadoria Especial para os Profissionais da Dança) foi uma ação que nasceu em um encontro realizado pelo Movimento A Dança se Move aqui em São Paulo, como a Cooperativa Paulista de Dança já tinha uma conversa bem adiantada sobre este tema dentro do seu conselho diretivo, decidimos partir para uma ação mais objetiva, procuramos o deputado Federal Carlos Zarattini (PT-SP) que acolheu de imediato nossa proposta, hoje ele é o autor deste projeto que em breve deverá entrar em tramitação na Câmara dos Deputados. Por ser de extrema relevância para a Dança brasileira a notícia deste PL se espalhou pelo país e vem ganhando o apoio de todos, inclusive já teve o parecer favorável da Funarte.

O PLS 644/2015 (Regulamenta a atividade dos profissionais da Dança) é de autoria do senador Walter Pinheiro (PT-BA). Este assunto veio à baila em um encontro promovido pelo Movimento A Dança de Move no início de 2015, quando descobrimos que já havia uma minuta, construída pelo Forum Nacional da Dança, que tratava deste assunto, parada há algum tempo no senado federal. Foi a partir deste documento que retomamos esta discussão com companheiros de outros estados e felizmente ganhou força no meio da Dança. Hoje este PL já está tramitando no Senado Federal, na Comissão de Assuntos Sociais, sob a relatoria da senadora Lídice da Mata (PSB – BA).

É importante ressaltar que estes dois Projetos de Leis para a Dança brasileira só serão aprovados se conseguirmos ampliar a nossa articulação política junto aos parlamentares da Câmara e do Senado federal.

 

Sobre o projeto de aposentadoria especial, há muitas dúvidas sobre como comprovar o tempo de serviço, considerando que é uma atividade tantas vezes realizada na informalidade. Vocês acham satisfatória a redação atual do projeto quanto a esse aspecto? Senão, qual seria uma alternativa viável?
SB: O projeto ainda pode passar por alguns ajustes, não está fechado, mas acredito que de alguma forma o artista deverá comprovar com algum documento seus trabalhos realizados no passado. É preciso deixar claro que a contribuição na Previdência Social será obrigatória para o trabalhador da Dança poder entrar com pedido de aposentadoria. Entendo que o problema maior da categoria não seja a informalidade, quase que absoluta no meio profissional, e sim a falta de conhecimento e consciência sobre o quanto esta questão pode afetar seu futuro. Uma saída que considero viável para o trabalhador informal da dança é estar vinculado a uma cooperativa, por exemplo, pois por conta da lei estas entidades são obrigadas a reter este tributo, na verdade o que o artista precisa urgentemente entender é que esta contribuição é um benefício para ele próprio.

Acredito que com a aprovação da lei, o profissional que atua na informalidade deverá construir uma consciência crítica sobre seus deveres e direitos na questão previdenciária.

Todos nós sabemos que a especificidade física, técnica e mental que esta atividade exige para que se possa atuar profissionalmente, acarreta um alto custo na vida útil do artista, pois ele é obrigado a conviver com constantes lesões muitas vezes sérias, que afetarão sua qualidade de vida quando parar de atuar.

 

Sobre a regulamentação da profissão, um item controverso é a necessidade de ensino superior na área de dança para os novos profissionais. Muitos entendem que isso restringiria o acesso de certos nichos, como as danças populares e danças de rua, por exemplo. Qual é a sua perspectiva e a da Frente sobre esse assunto?
SB: Ao meu ver há um equívoco sobre este assunto, o ensino superior é apenas mais um caminho. Logo no seu artigo 1º a Lei apresenta cinco incisos que indicam quem poderá exercer a profissão. Em linhas gerais: os que possuem ensino superior; os habilitados em cursos técnicos; os que possuem diploma estrangeiro revalidado na forma da Lei; os que tem atestado de capacitação profissional fornecido pelos órgãos competentes (e aí entendo que não precisa de ensino superior, é exatamente, como é hoje, é necessário o DRT); e, por fim, é direito garantido a todos os que já exercem a profissão no momento da publicação da Lei. É assim que interpreto o inciso, com essas diversas possibilidades de exercício da profissão.

De qualquer forma, como disse em relação ao PL da Aposentadoria, o da Regulamentação também está aberto à discussões, entendimentos e porque não algumas mudanças.

Não podemos esquecer que são duas ações distintas no congresso: PL da Regulamentação da Dança (Senado) e PL da aposentadoria especial (Câmara), ou seja, nas audiências públicas que virão, teremos de estar unidos na defesa dos textos.

Quais você acha que seriam os próximos passos para a área da dança em termos de legislação? O que é mais necessário e mais urgente hoje?
SB: Entendo que a questão da aposentadoria e da regulamentação devem ser as nossas principais bandeiras de lutas para os próximos anos, mas também há outras situações que considero sinistras e que atingem diretamente o trabalhador da Dança, tais como, a tentativa quase que histórica de interferência do Confef na nossa área. Poucos sabem que as competências específicas da arte da Dança e do seu ensino, continuam constando da área da Educação Física na Base Nacional Comum Curricular, isso é grave. Há um outro problema que precisa ser resolvido o mais rápido possível, vários profissionais habilitados para o ensino da técnica do Pilates estão sendo impedidos pelo Cref/Confef de trabalharem, com a alegação de que é necessário ter o diploma de professor de educação física, o que é um disparate.

São questões que envolvem diretamente a classe e precisam ser encaradas e resolvidas o quanto antes, pois muitos profissionais altamente gabaritados estão sendo impedidos de trabalhar.

Somos poetas do movimento, mas sobretudo trabalhadores.