Uma ferramenta para compreender

Lançado recentemente pela Editora da Universidade Federal da Bahia, Dança e Pós-modernidade, de Eliana Rodrigues Silva, reflete de maneira profunda e detalhada o sentido do que vem a ser a dança pós-moderna. Para tanto, na obra são enfocados os processos criativos do Grupo Tran Chan, da Escola de Dança da Universidade Federal da Bahia, além de ser apresentada uma forte fundamentação teórica no percurso histórico da arte em geral e, por conseguinte, na trajetória da dança mundial.

Resultado da pesquisa de doutorado da autora, Dança e Pós-modernidade não somente analisa e discute os parâmetros estéticos e conceituais da produção cênica do Grupo Tran Chan, como também localiza as características da pós-modernidade coreográfica nos processos desse grupo, esclarecendo as terminologias dança pós-moderna e contemporânea que, deve-se admitir, nem sempre são adequadamente empregadas no meio artístico.

A pesquisadora explica que

o que vem a ser a dança pós-moderna, ou contemporânea como querem alguns, tem sido uma das mais interessantes e prolíficas questões dos teóricos da área, particularmente nos Estados Unidos. A definição de seus componentes estruturais, sua manipulação temática, sua forma de abstrair, enfim, a análise crítica do seu universo criativo tem gerado interessantes discussões (Silva, 2005, p. 14).

É a partir desse interesse que Eliana Rodrigues Silva desenvolve sua pesquisa, objetivando identificar os elementos pós-modernos na prática do Tran Chan e, conseqüentemente, contribuindo para o debate referente à dança no contexto histórico e cultural da pós-modernidade.

Nesta perspectiva, a autora se refere à trajetória histórica da arte, verificando as principais transformações ocorridas nos paradigmas estéticos das linguagens das artes visuais, do teatro e da dança. Desse modo, o leitor é reportado a conceitos como unicidade e pluralidade, conteúdo e forma, fragmentação, justaposição, dentre outros, no sentido de compreender a diferenciação entre os parâmetros das artes pré-moderna, moderna e pós-moderna.

Eliana Rodrigues Silva salienta, dentre algumas características da dança pós-moderna, a extensa liberdade de criação e combinação de elementos e técnicas, o que possibilita ao criador a utilização de diferentes referências temáticas e estilísticas, bem como admite qualquer estímulo imaginável como indutor para a criação coreográfica, valorizando inclusive as simplicidades do cotidiano como fonte de criação.

Analisando alguns trabalhos do Tran Chan, a autora detecta nos processos e produtos criativos deste grupo, características inerentes à pós-modernidade e, portanto, à dança pós-moderna. Tais características, minuciosamente pesquisadas e descritas em Dança e pós-modernidade, localizam o trabalho do grupo, atuante desde 1980, como redimensionador da dança baiana e, por conseqüência, brasileira, refletindo assim uma certa influência sobre a construção das poéticas de outros fazedores da pós-modernidade coreográfica na Bahia.

Além disto, pode-se dizer que a pesquisa de Eliana Rodrigues Silva corrobora com o esclarecimento do que vem a ser a dança pós-moderna, ou ainda contemporânea, como se denomina mais comumente. Assim, pode-se considerar a publicação de Dança e Pós-modernidade como um presente, não somente para coreógrafos e dançarinos, mas também para fazedores de arte em geral e até mesmo para leigos, tendo em vista a necessidade de compreensão não apenas de uma nomenclatura atribuída a um estilo de dança, mas principalmente de um ideal estético, ou ainda de todo um pensamento.

Ana Flávia Mendes* é coreógrafa e pesquisadora da FIDESA (Fundação Instituto para o Desenvolvimento da Amazônia). Fundadora e diretora artística da Cia Moderno de Dança, de Belém do Pará, atualmente desenvolve sua pesquisa de doutorado em artes cênicas na Universidade Federal da Bahia.